Capítulo 4

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India narrando:

Depois do fiasco da sessão fotográfica do mal, me enfio na cama, tiro os grampos da minha cabeça, arranco o soutien sem tirar a regata que estou usando e finalmente, me permito deprimir até chegar a hora de ir para o estúdio. Quero dizer, eu tento deprimir porque assim que começo a pensar em toda a porcaria que é minha vida, você sabe, para conseguir deprimir como deve ser, recebo uma ligação do skype no meu celular e minha fúria é tão grande que pego na porcaria do objeto e o arremesso o mais longe que posso.

- Me deixem em paz, porra! - Grito alto, com minha respiração acelerada enquanto lágrimas furiosas descem pela minha face. Continuo olhando para o celular que simplesmente não pára de vibrar e me passo por completo.
Grito e esperneio e bato os meus punhos na cama e choro, tudo ao mesmo tempo. Pego nas cobertas e as puxo com raiva e grito mais, xingando a porra das pessoas que não estão nem aí para mim e a droga do telemóvel que nem é capaz de se partir para me fazer sentir melhor. Puxo tanto que acabo por escorregar e cair de bunda no chão com um baque surdo. Fico lá no chão frio, tentando regular minha respiração pesada e lançando um olhar mortal ao celular que vibra insistentemente, querendo muito não responder. Por fim, meu sentido de dever leva a melhor e me arrasto até ao aparelho vibrante do mal.

Suspiro fundo, tento controlar minha respiração, passo a mão pela cara molhada e aceito a ligação.

⊙⊙⊙

Extraordinariamente, aquela crise de raiva meio que me pôs no trilho de novo. Chego cedo no estúdio e ainda tenho tempo de responder a uns emails importantes, que estão pendentes faz tempo. Já me sinto de novo como eu e isso me deixa muito aliviada.

Assim que acabo no escritório, vou alongar um pouco antes do treino dos Escolhidos. Coloco uma música para tocar e começo com os alongamentos no chão, perdida em pensamentos, até que aparecem umas sapatilhas brancas no meu campo de visão e roubam meu foco. Levanto a cabeça para me deparar com uma Carla com um ar muito culpado.

- Posso falar com você? - Ela grita, tentando sobrepor sua voz à música alta. Eu me levanto e paro o som, para conseguirmos falar.

Olho para o relógio na parede da sala, verificando que faltam apenas dez minutos para o início do treino. Os Escolhidos já devem estar até se preparando no vestiário.

- Não tenho muito tempo - aviso, me aproximando dela de novo.

- Só preciso de um minuto. - Carla fica em silêncio por instante, antes de prosseguir. - Queria pedir desculpas pelo que te falei. Estava tão chateada que falei sem pensar...

Baixo minha cabeça, me lembrando do que ela falou para mim e parece até que foi ontem e não hoje que tivemos aquela conversa. A verdade é que não sou uma pessoa de guardar ressentimentos, acho que a vida é curta demais para isso e eu meio que mereci, fui bem desagradável mesmo.

- Tudo bem, Carla. - Ela me olha, como se eu fosse louca e isso me faz sorrir. - O que foi?

Carla abana a cabeça, ainda incrédula. - Só não estava esperando essa reação. Nossa, eu fiz um filme na minha cabeça de como você ia reagir quando me visse e cada um era pior que o outro. Me senti muito mal depois que te falei aquelas coisas...

- Eu mereci. Fui uma completa cabra com você e teve razão em se chatear.

- Por favor, não pense que acho que é por isso que está sozinha - dá um sorriso matreiro e continua, - já que acredito que com amor tudo se supera. Então pode continuar a ser cabra à vontade, que se o cara te amar de verdade vai suportar isso sem nem reclamar.

Encarar É FeioOnde histórias criam vida. Descubra agora