Capítulo 26

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India narrando:

- Você ouviu alguma coisa do que eu falei? - A Viviana pergunta, chateada, me tirando dos meus devaneios. - Estou aqui abrindo meu coração e você não está nem aí.

- Eu estava... - paro de falar quando escuto alguém batendo na porta do escritório. Olho para Vi, meu coração começando a bater mais rápido.

- Deve ser a Cíntia - supõe.

- Não, é muito cedo para ela já ter chegado. Aliás, o que você estava fazendo aqui a essas horas? Ainda são quatro da tarde.

- Vim treinar um pouco, sabe? Tentar aliviar o stress de...

Outra batida na porta, agora mais insistente se faz ouvir. Estou tentando controlar minha ansiedade porque sei que há probabilidade de ser o marido da minha tia à porta e esta insistência e a falta de um pedido para entrar, tornam a situação ainda mais suspeita.

- Você não fechou a porta de entrada? - A Vi pergunta.

- Acho que não - falo, nervosa. - O último a sair foi o Heitor e depois vim cá para dentro com você. Não me lembro de ter fechado a porta.

Ela se levanta do sofá e sem mais delongas, acaba com as dúvidas e abre a porta de uma vez. Não reconheço o rapaz magro, moreno e de aparência normal, mas pelo menos não é o odioso ogre do marido da minha tia que me olha da porta. 

- Peço perdão, mas a porta de entrada estava aberta - ele se desculpa e seus olhos são intensos ao encarar a Vi. Uma intensidade estranha em feições que reparo agora, me são ligeiramente familiares.

- E quem é você? - A Vi pergunta na cara podre, espelhando meus pensamentos. Ele a examina de cima a baixo e quando pára na cara dela de novo, levanta uma sobrancelha deliberadamente e bem devagar. E aí o meu cérebro faz a conexão, só conheço uma pessoa que levanta a sobrancelha tão devagar, como se fosse uma pausa para efeito.

- Walter? - Dou uns passos para mais perto dele e examino melhor as suas feições. - É você mesmo?

- Sou eu mesmo, prima - ele concorda, com um pequeno sorriso. - Posso bater um papo com você?

Eu sou muito grata ao meu primo pelo que ele fez por mim no passado, impedindo seu pai de abusar de mim, mas por mais gratidão que eu tenha, e não me interpretem mal por falar isso, a verdade é que eu só quero distância deles. Eles me fizeram passar por muita porcaria e, apesar de serem relacionados a mim, não os considero parte da minha família. Pelo que fico um pouco ansiosa de tê-lo por perto, afinal de contas ele é filho do meu maior pesadelo e a vida me ensinou a ser desconfiada.

- Então deixa ver se eu entendi - falo, me postando bem do lado da Vi, cujos os olhos não saem do meu primo, avaliando. - Após o quê? Quase dez anos sem nos vermos, você entra aleatoriamente no meu estúdio para falar comigo assim, sem mais nem menos, como se fosse uma coisa habitual e corriqueira?

- Nossa, India! É assim que você recebe seu primo? Seus pais não lhe ensinaram a ter bons modos, não? - Ele pergunta ainda de sobrancelha levantada com malícia por debaixo de cada palavra mencionada. Trinco meus dentes e fecho os punhos com força para controlar minha raiva. - Sei que você não esteve tanto tempo com eles, mas treze anos é mais que suficiente para...

- Cala a porra da boca já - mando com a voz baixa de fúria, me aproximando. Ele não é muito mais alto do que eu, pelo que não é tão difícil lhe fazer frente. - Se você veio aqui para falar dos meus pais é melhor dar meia volta, antes que enfie essa sobrancelha irritante no seu olho.

Ele ainda a levanta mais, num claro sinal de provocação e dá um passo para mais perto de mim também. Sorri.

- Eu não tenho medo de você, priminha - ele baixa os olhos para o meu peito, oscilando rapidamente por causa da minha respiração acelerada e lambe um lábio. Me afasto dele, enojada. Ele solta uma gargalhada.

Encarar É FeioOnde histórias criam vida. Descubra agora