LIV

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Ela sabia que não deveria falar aquilo, mas em alguma parte dela, sabia que eu era confiável. Ela apostou o emprego com aquela confissão.   

-Mas...? 

-Mas bolsa integral é para quem não tem renda, então a sua mãe falou com a mãe dele que aceitou pagar no primeiro momento. 

-Por que não tentou falar com ele? 

-Eu tentei, uma vez apenas, mas quando ele negou, eu o entendi. -Sabia que ela tinha a continuação da história igual a que o Samuel me contou. 

-Fico feliz que ele parou com essa ideia maluca. 

-Eu também. Aquele menino tem um potencial incrível! 

-É...

-Quer falar o que aconteceu entre vocês? -Ela já sabia. Eu sentia isso. 

-Sei que já sabe, prof. -Ela sorriu para mim e eu, sem jeito, retribui. 

-Isso que vocês chamam de rádio corredor não é mole mesmo. Eu sei de coisas que eu não queria, e não deveria, saber. 

-Somos duas então. 

-Mas voltando à você e ao Samuel, não vou dar aquele discursinho que tudo vai dar certo. Só que vou dizer uma coisa que você não quer ouvir. 

-O que? 

Sabia o que ela iria dizer, mas esperava estar errada. Eu não queria ter alguém que colocasse em palavras, o que minha cabeça negava aceitar que meu coração sentia. 

-Você está apaixonada. -Não respondi. -Todos os dias que vocês estudavam na biblioteca, eu estava lá. Bem no cantinho, ajudando a bibliotecária a arrumar os livros.Eu os via todo dia. Vi o longo e difícil processo que você passou para enfiar juízo na cabeça daquele garoto. Você não vai perceber, mas as brigas de vocês foram mudando, e só para deixar claro eu não ouvia a conversa de vocês, apenas os via e via como o corpo de vocês reagiam as brigas. No começo, vocês se insultavam. Você fazia de tudo para o tempo passar rápido e olhava para a hora de cinco em cinco minutos. Ele olhava para todas as meninas que entravam e saiam na biblioteca e, às vezes, ele te tacava uma ignorância sem nem ter ideia do que você falava. Depois, você parou de olhar a hora e ele parou de olhar os rabos de saia. Os foras ficavam mais frequentes e a raiva passava a incomodar. Em seguida, as brigas eram acompanhadas de tapinhas no ombro e risos. Então, você olhava para o Samuel a fim de saber se ele entendia o que você falava e ele reparava em seu rosto enquanto explicava a matéria. E, no último dia que estudaram, eu tinha ficado uns três dias sem ir para a biblioteca... Os sinais tinham mudado completamente, Alice. Vocês encostavam levemente um no outro, esperando que achassem ser acidente, o Samuel te olhava diferente, como se esperasse algo mais e suas olhadas para ele eram mais demoradas e você sentia quando tinha que voltar a olhar para o livro. As risadas eram sinceras e as brigas raras. A matéria chegava a ficar de lado quando começavam a conversar e em cada momento oportuno vocês se olhavam nos olhos e não falavam nada.

Quando dizem que quem está envolvido na história não percebe as coisas é completamente verdade. Ou isso, ou a Sílvia está ficando maluca. Nunca havia reparado que fazia as coisas que ela dizia e me negava acreditar agora. Por mais que eu gostasse do Samuel, dizer que eu estava apaixonada por ele era um tanto forte. Ou não... Já perdi vários amigos na vida e nenhuma vez foi tão doloroso quanto perder o Samuel. Quando a Ana deu aquele ataque de loucura dela para cima da Maria, eu fiquei triste, mas não a ponto de sentir meu coração se partir em cacos...

-Sílvia, eu...

-Eu não preciso ouvir você negar, Alice. Dizer que não está apaixonada para mim não vai fazer sua cabeça se acalmar e seu coração perder essa sensação de vazio. Você só vai conseguir se ver livre disso tudo se disser para você mesma e com certeza, que não sente nada pelo Samuel.

-Como sabe que...

-Meu pai é mágico e gosta dessas paradas de adivinhação... Aprendi com ele a ler as pessoas e a entendê-las melhor que si mesmo.

-Eu não gosto do Samuel. -Disse mais para mim do que para ela, mas nada em mim mudou. As sensações eram as mesmas e o vazio parecia aumentar. 

O que restava era aceitar...



O Idiota da minha escolaOnde histórias criam vida. Descubra agora