"Graças a Deus, mais um ano sem exame!", eu disse, escorada no mural em frente a sala que eu tinha aulas de latim avançado toda quinta - feira.
Kat estava olhando as folhas penduradas nele, procurando seu nome. Mandy Stamos, com toda sua arrogância, se vangloriou de suas notas 9 e 10. Lila Storm se lamentava pelo seu exame e Lynn Kount dava pulinhos de alegria quando viu que passara de raspão.
"Passei também! MÉXICO AQUI VOU EU!", Kat comemorou.
Naquele momento reparei que todas as garotas que já tiveram contato com o Imaginare eram estudantes de Literatura, de semestres anteriores ou posteriores ao meu. Seria uma coincidência ou apenas um infortúnio? A única pessoa que não é do meu curso e conhece o Imaginare é Kevin.
Ah, Kevin. O Kevin que eu dispensei e que parti o coração... O que não merecia ficar em segundo plano. Quantas coisas aconteceram nesses últimos seis meses. Antes eu evitava Kevin e podia jurar que ele era o pior garoto que eu já conheci. Agora, quem me evitava era ele.
Ele não ficou bravo depois que terminamos. Prometemos um ao outro que tentaríamos manter a amizade. Mas, é claro que, na pratica, isto nunca acontece. Toda vez que nos esbarrávamos pelos corredores da universidade, ele dava um sorriso murcho e sem graça e andava o mais rápido que podia para se afastar de mim.
Eu não o culpo. Na verdade eu faria o mesmo. Qualquer ser humano faria. Mas eu sentia a falta dele. Falta dele e de Dimitri que, também, estava me dando um gelo mais denso e frio do que as nevascas que vieram com tudo em Vancouver naquele dezembro.
Ele se mudou do nosso dormitório. Foi para casa de Brett e disse que ficaria por lá até conseguir um colega de quarto para ano que vem. Eu me opus, mas de nada adiantou.
Depois de ver nossas notas, eu e Kat fomos caminhando pelos corredores gelados da universidade. Ela usava uma blusa de lã linda e botas, já eu usava um jaquetão branco que me fazia parecer um boneco de neve.
"Bela maneira de terminar um ano..." reclamava, andando de braços abertos por causa do volume da jaqueta. "Comecei completamente focada em meus estudos, em minha obra... Ser uma escritora de renome! Esse era meu sonho! De repente surge Dimitri, Kevin... E agora? Tô tudo, menos focada. Minha vida é mais estranha que as panquecas de ervas finas da sua tia Luna, Kat..."
Kat tirava os respingos de neve derretida da touca.
"A culpa é toda sua, Brendão!"
Suspirei, tentando achar argumentos que replicassem sua afirmação. Inútil.
"Eu sei.", disse, por fim. "O que me deixa ainda pior. Dei mancada com os dois, Kat."
"Olha... Pelo menos você foi sincera com Kevin. Mancada pior seria se você deixasse tudo do jeito que estava."
"Você tem razão. Mas e agora? Vou viajar e você também... Dimi na casa do Brett. Acha que vão chamar Dimi pra passar o natal com eles?"
Tirei as luvas. Minhas mãos estavam vermelhas pelo frio, o que significava que as porcarias das luvas não serviam para nada.
"Vou ver se encontro Dimitri na pizzaria, antes da viagem."
"Vai tentar convencer ele a ir com você?", ela perguntou, arqueando as sobrancelhas. Paramos no final do espaço coberto, já preparando nossas toucas para a neve.
"Vou tentar ser sincera com ele!", confessei.
Mais tarde, naquela noite, eu fazia um macarrão com almondegas enquanto Kat arrumava as malas.
"Phellix acabou de me mandar uma mensagem dizendo que já está pronto! Meu Deus, esse homem vai me matar com essa pontualidade toda!"
"Phellix vai mesmo amiga?", perguntei, mexendo o molho.
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Você Não Existe
FantasyO que você faria se algo que você inventou realmente existisse? Brenda Mitchoff, aluna de literatura em Vancouver, escreveu o seu primeiro livro: "Algumas Cartas", nos últimos anos da universidade. O livro teve toda a sua dedicação, já que ele seria...