Eu sempre achei interessante os sistemas de mudança de marcha de um carro.
É audível e perceptível a progressão da força e capacidade de cada uma das marchas, mas é necessário prestar a atenção. O som começa baixo e conforme você acelera, ele se intensifica e dá a sensação de que a qualquer momento, o motor irá explodir. Então você muda para a segunda marcha e o som volta a tranquilidade, demorando um pouco mais para chegar, de novo, ao seu extremo. A última marcha é a quase impossível chegar ao limite. O som tranquilo se demora muito e, apenas se você for um louco, ou piloto de testes, você não chega ao som agoniante e agudo que a capacidade máxima do motor emite.
A palavras de Dimitri fizeram meu motor chegar ao extremo. E eu estava na última marcha.
Não havia como trocar para a próxima marcha, nem voltar a anterior. Meu motor explodiria de qualquer forma. O zumbido que dava indícios da sobrecarga era incontrolável. O motor era meu coração e tudo estava tão acelerado que... que um acidente aconteceria.
Segurei sua mão e pressionei meus lábios tanto que pensei que os machucaria. Eles eram como portas de um cofre, que forma alguma se abriam. Minha testa se franziu. Aquilo realmente estava doendo. Estava doendo muito, muito mesmo. Tudo o que eu pude dizer foi...
"Não. "
"Não cabe somente a você decidir, Brenda. ", ele disse, também com uma expressão de dor. Ele estava ainda mais pálido do que o comum.
Segurei ainda mais forte suas mãos. Eu não as soltaria.
"Nem a você...", balbuciei. "Nem a você. Você não pode fazer isso, você vai morrer! "
"Eu não pertenço a este lugar."
Ele fechou os olhos e respirou fundo. Buscou o ar como um aspirador busca a poeira de um carpete. Suas mãos subiram às maçãs do meu rosto. Tão quentes. As mãos que me conheciam há meses, mas que eu as conhecia há anos. As que jamais me tocariam outra vez.
"Você não..."
Todas as palavras do meu vocabulário fugiram de mim. Eu não era capaz nem de reproduzir sons. Era como naqueles pesadelos, em que sua voz é tirada e não basta gritar. Ninguém me escuta.
"Eu sei. Eu sei que nós estamos felizes, mas eu não posso permitir que aconteçam mais coisas como o que aconteceu desta vez. Você não merece isso. Eu sou o intruso. "
"Você não é intruso! ", eu quase gritei, segurando seu rosto com as minhas duas mãos. "Você nunca foi, Dimitri. Sempre esteve em mim e agora está comigo e isso não pode mudar. Por favor, esqueça essa ideia. Nós podemos lidar com isso... nós podemos mesmo! Não faça isso comigo, não me peça, não me peça para matá-lo, porque se me pedir isso, vai matar a mim também."
Soluços cortavam as minhas palavras, tornando-as tão incoerentes quanto rastros de areia no deserto. Ele me abraçou, depois puxou minhas pernas e me aninhou em seu colo.
"Eu também não quero isso. ", suas lágrimas pingaram no tecido liso da minha camisola. "Mas sabemos que não podemos lidar. É a magia que me mantem aqui que está te destruindo. Eu jamais serei egoísta o suficiente para te permitir enlouquecer. Continuar aqui sabendo que te custará a sanidade. Não vou fazer isso Brenda. Temos que colocar as coisas no lugar. "
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Você Não Existe
FantasyO que você faria se algo que você inventou realmente existisse? Brenda Mitchoff, aluna de literatura em Vancouver, escreveu o seu primeiro livro: "Algumas Cartas", nos últimos anos da universidade. O livro teve toda a sua dedicação, já que ele seria...