Capítulo 22

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“Parecia a mesma meninona, só que naquela visita a Lívia mostrava
uma parte dos peitos e das coxas”, disse-me Domingas.
O resto do corpo de Lívia foi esquadrinhado pelos olhos arregalados de
Zana, que lhe perguntou com uma voz maliciosa: “A querida veio se despedir
do meu galã?”.
Lívia se afastou e saiu da sala, atraindo Yaqub para o quintal.
Sussurraram com muitos risinhos e logo sumiram no matagal dos fundos.
Demoraram o tempo da sobremesa, do café espesso e da sesta. Zana, inquieta,
fez um sinal a Domingas, que os encontrou perto da cerca. Estavam
espichados no mato, e Yaqub acariciava o ventre e os seios da mulher, adiando
a despedida. Domingas ficou calada, ofegante; agachou-se, balançou as folhas
e torceu com raiva os galhos da fruta-pão. Observou a cena, boquiaberta, e se
retirou com a boca seca, com sede daquela água.
Lívia não apareceu, deve ter saído pela ruela dos fundos. Depois Yaqub
entrou sozinho na sala, o pescoço com arranhões e marcas de mordidas, a
expressão ainda incendiada.
Viajou assim mesmo: a roupa amarrotada, o rosto úmido, o cabelo
aninhando talos, folhinhas e fios de cabelo amarelados. Viajou calado,
deixando a casa que ele ocupara com parcimônia e discrição. Era pouco mais
que uma sombra habitando um lugar. Deixou na casa a lembrança forte de
duas cenas ousadas: o desfile com farda de gala e o encontro com a mulher
que ele amava.
Omar, mordido de ciúme, não tocou no nome do irmão. E a mãe, pura
ânsia, dizia que filho que parte pela segunda vez não volta mais a casa. O pai
concordava, sem ânsia. Sonhava com um futuro glorioso para Yaqub, e isso
era mais importante que a volta do filho, mais forte que a separação. Os olhos
acinzentados de Halim se acendiam quando dizia isso.
Eu vi esses olhos muitas vezes, não tão acesos, mas tampouco baços.
Apenas cansados do presente, sem acenar para o futuro, qualquer futuro.

Dois irmãos (Parado Por Um Tempo)Onde histórias criam vida. Descubra agora