A CURVATURA DO TEMPO REVISITADA

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As ilustrações das figuras 3.2, 3.4 e 3.6 transmitem a essência do significado

de "espaço curvo". A curva distorce a forma do espaço. Os físicos inventaram

imagens análogas para tratar de transmitir o significado de "tempo curvo", mas

decifrá-las é tarefa bem mais difícil e por isso não as apresentaremos aqui. Vamos

então retomar o exemplo de Crispim e Joaquim no Tornado e tentar entender a

experiência da curvatura do tempo induzida gravitacionalmente.

Para chegar até eles, vamos primeiro visitar João eMaria, que já não estão

na escuridão profunda do espaço vazio, e sim flutuando nas cercanias do sistema

solar. Eles continuam usando aqueles grandes relógios digitais, sincronizados ao

início da experiência. Em nome da simplicidade, ignoraremos os efeitos dos planetas

e consideraremos apenas o campo gravitacional do Sol. Imaginemos também que

uma nave espacial que navega próximo a João e Mariatenha desenrolado um longo

cabo que se estende até a vizinhança da superfície do Sol. João usa o cabo para

deslocar-se, vagarosamente, na direção do Sol. Ao fazê-lo, ele pára periodicamente

para comparar o ritmo do seu relógio com o de Maria. A curvatura do tempo prevista

pela relatividade geral de Einstein implica que o relógio de João andará cada vez

mais devagar em comparação com o de Maria, à medidaque o campo gravitacional

em que ele se encontra se torna mais forte. Ou seja, quanto mais próximo ao Sol ele

chega, mais devagar o seu relógio andará. E nesse sentido que a gravidade distorce

o tempo assim como o espaço. Deve-se notar que, ao contrário do caso do capítulo

2, em que João e Maria estavam no espaço vazio e semoviam um em relação ao

outro a velocidades constantes, no cenário atual não há simetria entre eles. Ao

contrário de Maria, João sente que a força da gravidade se torna cada vez mais forte

— e tem de agarrar-se ao cabo cada vez com mais força, à medida que se aproxima

do Sol, para não se precipitar nele. Ambos concordam em que o relógio de João

anda mais devagar. Não há aqui as "perspectivas igualmente válidas" que permitem

a troca dos papéis e a reversão das conclusões. Isso, na verdade, foi o que

encontramos no capítulo 2, quando João sofreu uma aceleração ao recorrer ao seu

propulsor a jato para reencontrar-se com Maria. A aceleração sentida por ele

resultou em que o seu relógio efetivamente andasse mais devagar em relação ao de

Maria. Agora que já sabemos que sentir uma aceleração é o mesmo que sentir uma

força gravitacional, vemos que a situação atual de João envolve o mesmo princípio e

novamente vemos que o seu relógio, e tudo mais na sua vida, anda em câmara lenta

em comparação com Maria.

Em um campo gravitacional semelhante ao da superfície de uma estrela

comum como o Sol, o retardamento dos relógios é bempequeno. Se Maria

permanecer a 1,5 bilhão de quilômetros do Sol, quando João estiver a poucos

quilômetros da superfície solar o ritmo do seu relógio será cerca de 99,9998 por

cento do relógio de Maria. Mais devagar, é certo, mas não muito. Se, no entanto,

João estivesse pendurado em um cabo muito próximo àsuperfície de uma estrela de

nêutrons, cuja massa, similar à do Sol, estivesse comprimida em uma densidade

milhões de bilhões de vezes maior do que a do Sol, esse campo gravitacional mais

forte levaria o seu relógio a andar a cerca de 76 por cento do ritmo do relógio de

Maria. Campos gravitacionais ainda mais fortes, como os que existem nas

proximidades de um buraco negro (como discutiremos a seguir), levam o fluxo do

tempo a retardar-se ainda mais; quanto maior for o campo gravitacional, mais

intensa será a curvatura do tempo. 

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