A analogia da bola e da borracha é útil porque nos dá uma imagem visual que
nos permite perceber tangivelmente o que se entendepor curvatura do tecido
espacial do universo. Os físicos usam essa e outrasanalogias similares para
orientar a sua própria intuição com referência à gravitação e à curvatura. Contudo,
apesar da utilidade, ela não é perfeita e, para efeitos de clareza, é bom chamar a
atenção para alguns dos seus pontos fracos.
Em primeiro lugar, quando o Sol provoca uma curvatura no espaço à sua
volta, isso não se deve a que o espaço esteja sendo"puxado para baixo" pela
gravidade, como no caso da bola de boliche, que encurva a superfície de borracha
porque é atraída pela gravidade em direção à Terra.No caso do Sol, não há nenhum
outro objeto que "puxe". Com efeito, Einstein nos ensinou que a curvatura do espaço
é a gravidade. A mera presença de um objeto dotado de massa leva o espaço a
responder, curvando-se. Assim também, a Terra não se mantém em órbita por causa
da atração gravitacional de algum outro objeto externo que a guie pelas depressões
de um ambiente espacial curvo, como ocorre com a pequena esfera de aço na
superfície de borracha. Ao contrário, Einstein mostrou que os objetos se movem
através do espaço (do espaço-tempo, mais precisamente) pelo caminho mais curto
possível — o "caminho mais fácil possível", ou o "caminho de menor resistência". Se
o espaço é curvo, esse caminho também será curvo. Assim, embora o modelo da
bola e da borracha propicie uma boa analogia visualde como um objeto como o Sol
encurva o espaço à sua volta, influenciando com isso o movimento de outros corpos,
o mecanismo físico através do qual essas distorçõesocorrem é totalmente diferente.
O modelo corresponde à nossa intuição sobre a gravidade no esquema newtoniano
tradicional, enquanto o conceito de Einstein expressa uma reformulação da
gravidade em termos de um espaço curvo.
Uma segunda limitação da analogia deriva de que a superfície de borracha é
bidimensional. Na realidade, embora isso seja mais difícil de visualizar, o Sol (assim
como todos os objetos dotados de massa) encurva o espaço que o envolve nas três
dimensões espaciais. A figura 3.6 é uma tentativa tosca de descrever esse fato; todo
o espaço à volta do Sol — "abaixo", "ao lado" e "acima" — sofre o mesmo tipo de
distorção, e a figura 3.6 representa esquematicamente uma amostra parcial. Um
corpo como a Terra viaja através do ambiente espacial tridimensional curvo causado
pela presença do Sol. E possível que a figura lhe traga alguma dificuldade: por que a
Terra não se choca com a "parte vertical" do espaçocurvo da imagem? Tenha em
mente, no entanto, que o espaço, ao contrário da superfície de borracha, não é uma
barreira sólida. Em vez disso, as malhas encurvadasda imagem são apenas duas
membranas finíssimas em um espaço curvo tridimensional no qual nós, a Terra e
tudo mais, estamos totalmente imersos e em meio ao qual nos movemos livremente.
Talvez você ache que isso complica ainda mais o problema: por que não sentimos o
espaço se estamos totalmente envolvidos em sua contextura? Mas acontece que
sim, nós o sentimos. Sentimos a gravidade, e o espaço é o meio pelo qual a força da
gravidade se comunica. Como disse tantas vezes o eminente físico John Wheeler
para descrever a gravidade, "a massa maneja o espaço ensinando-o como curvar-se; o espaço maneja a massa ensinando-a como mover-se".
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Uma terceira limitação da analogia é a supressão dadimensão do tempo.
Assim fizemos em nome da clareza visual, porque, embora a relatividade especial
nos lembre que devemos sempre pensar na dimensão dotempo no mesmo nível e
do mesmo modo em que pensamos nas três dimensões espaciais conhecidas, é
muito mais difícil "ver" o tempo. Mas o exemplo do Tornado nos mostrou que a
aceleração — e portanto a gravidade — encurva tantoo espaço quanto o tempo.
(Com efeito, a matemática da relatividade geral revela que no caso de um corpo que
se move a uma velocidade relativamente baixa, como a Terra, girando à volta de
uma estrela típica, como o Sol, a curvatura do tempo exerce um impacto muito mais
significativo sobre o movimento da Terra do que a curvatura do espaço.) Voltaremos
ao tema da curvatura do tempo depois da próxima seção.
Ainda que essas ressalvas sejam importantes, desde que você tenha
consciência delas é perfeitamente legítimo recorrerà imagem da curvatura do
espaço proporcionada pelo exemplo da borracha e da bola como uma síntese
intuitiva da visão einsteiniana da gravidade.
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O universo elegante
RandomEsse é um livro científico, porém eu recomendo também para leigos, por usar analogias diversas e procurar expor da maneira mais clara possível algumas das idéias dos maiores contribuintes da física e da matemática , além de expor claramente a loucur...