🔴Capítulo 5/1 - Thompson

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      — Chefe, por que tenho a impressão de que estou aqui como uma espécie de castigo? — questionei frustrada, fazendo Cortez sorrir sem desgrudar os olhos do prontuário.

      Fazer triagem na Emergência com certeza era uma punição. Passar horas separando e encaminhando pacientes de acordo com seus níveis de gravidade, não era minha ideia de turno perfeito.

      — Vai gostar de ter vindo ao Pronto Socorro, hoje.
Sorri, mesmo duvidando do que ele havia dito, entretanto, quando desviei a atenção e vi um conjunto vermelho-escuro junto de uma barba castanha e sem falhas sair do elevador, tive certeza de que ia odiar ter vindo à Emergência naquela tarde.

     — Como o Marcus está? — Cortez perguntou, ganhando novamente minha atenção.
— Acho que você nem o reconheceria se o visse agora. — Peguei o prontuário que ele havia deixado sobre a bancada, antes de dar a volta no balcão da enfermagem e sentar-se de frente para o computador. — Quais são as chances de eu ter vindo para o mesmo hospital onde os dois homens que salvaram meu pai e o filho do AJ Sullivan, o cara que escreveu o artigo que me levou até vocês em Baltimore, estão trabalhando?

      — Quando seu currículo chegou até mim, pensei que o interesse de continuar sua residência no Metropolitan tinha sido pelo mesmo motivo que trouxe John e eu aqui: o Müller. Nós só o seguimos, mas você pareceu surpresa em encontrá-lo aqui. — O homem se virou para pegar a folha que a impressora havia acabado de expelir. — John acredita que foi obra do destino.

      O destino, nesse caso, era uma cirurgiã cardiotorácica, japonesa e de uns cinquenta e poucos anos. Pois, não era segredo que a minha decisão de deixar Miami teve forte influência de Susan Lee, da consideração que eu ainda tinha pelo que ela me ensinou como mentora, já que a admiração que sentia por ela como profissional havia se perdido há algum tempo.

     Quisera eu que tivesse acontecido antes de me contaminar por seus segredos, antes de fazer parte deles, antes de me tornar um de seus segredos. Em sua cabeça, talvez, acreditasse que encontrar o médico que operou meu pai e colocar-me em seu programa de residência fosse uma forma de reparar o que fez comigo e, de quebra, ainda teria o silêncio da minha da gratidão.
Não tinha certeza se ser subordinada de um machista sarcástico feito o doutor Müller era algo pelo qual seria grata.

      — Müller! — afirmou o chefe, me trazendo de volta do devaneio.

      Sua voz não foi alta o suficiente para que Müller pudesse ouvir de onde estava, então não poderia estar chamando-o, o que me levou a deduzir que aquilo era para me informar de sua presença, que já não era novidade há certo tempo para mim. Cortez provou que estava certa quando acenou com uma das mãos, chamando o médico desta vez. Vi quando Müller revirou os olhos antes de começar a andar em nossa direção.

      — Acho que ele não vai muito com a minha cara — comentei da forma mais coloquial possível, ignorando o fato de Cortez ser meu chefe.

     A resposta dele foi exatamente o que eu esperava: uma risada contida e abafada por uma das mãos. Fiquei satisfeita por também ter a comprovação que os fios platinados que agora estavam em maior número por sua cabeça e algumas rugas mais acentuadas nos cantos dos grandes olhos azuis, era as únicas coisas que tinham mudado em Cortez em seis anos.

      — Conheço ele há quase quinze anos e até hoje não posso te afirmar que ele vai com a minha, mas pode ficar tranquila, porque aquilo foi para mim — ele garantiu com a boca ainda coberta pela mão.

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