🔴Capítulo 1/1 - Thompson

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      Centenas de pessoas matariam para estar onde eu estava naquele exato momento, sentada naquela cadeira, nenhum pouco confortável, porém de frente para o diretor-médico do melhor hospital da Virgínia, mas eu visivelmente era uma exceção, pois não queria estar ali. Ser médica, nunca foi um sonho que cultivei desde a infância, nem em qualquer outra fase da minha vida.

      Medicina era sim um sonho, mas não o meu. Aquele era o sonho de Rute Ferras para mim, e minha querida mãe me convenceu de que também seria o meu um dia, depois que uma cigana leu minha mão durante uma de nossas temporadas no Brasil.

     Isso mesmo, sou a pessoa cujo destino foi traçado por uma mulher que me viu uma única vez na vida.

      Mesmo naquela época, eu já não fazia o tipo espiritualizada que acredita nessas baboseiras. Entretanto, as coisas aconteceram rápido demais e quando me dei por conta já não tinha mais minha mãe, e a medicina parecia a única coisa que me ligava de alguma forma a ela. Bom, talvez também tenha havido uma promessa feita em seu leito de morte por alguém, cuja inocência dos seus nove anos não lhe permitiu ver o enorme fardo que estava se comprometendo a carregar.

       O diretor analisava minha papelada, enquanto eu estudava os dezessete anos que sucederam aquela promessa e me perguntava se minha mãe sentiria orgulho se visse o que me tornei. Pensar que sim foi o que me manteve presa àquela cadeira.

      Na milésima segunda vez que o doutor Marshall desviou o olhar para o relógio, preso a parede do outro lado de sua sala, tive certeza de que ele não queria estar ali tanto quanto eu. Nas primeiras vezes que ele fez, tentei me convencer de que o médico tinha que estar em outro lugar em alguns minutos, mas depois me dei conta de que ele simplesmente desejava estar em outro lugar, porque até mesmo uma hemorroidectomia era mais emocionante do que fazer uma entrevista de admissão às oito horas da gelada manhã do primeiro domingo de janeiro.

     O velho se espreguiçou em sua cadeia de couro, ajeitando os óculos, como se tivesse encontrando dificuldade para enxergar o conteúdo da papelada que tinha na outra mão. Porém, diferente do que ele pensava, o problema não estava em seus olhos, tampouco nos óculos que tinha na frente deles, e sim na caligrafia quase ilegível da doutora Susan Lee, que infelizmente não tinha com a caneta a mesma habilidade que tinha com o bisturi.

      Cartas escritas à mão era algo que nos dias de hoje podia ser tachado como arcaico, e a doutora Lee, como uma velha conservada e antiquada. Velha de fato ela era, mas tais adjetivo não condiziam com sua pessoa, pois apesar dos seus cinquenta e todos, ela adorava as facilidades que o mundo moderno tinha a oferecer e dizia que quanto mais novo, melhor. Seu amante de vinte e nove anos era prova disso. Mas o ditado não se aplicava quando o assunto era redigir cartas de referência, já que a cirurgiã repudiava a ideia de que qualquer um poderia digitar algumas palavras no computador e depois imprimir, tarefa essa que algumas vezes nem era feita por quem assinava o documento.

     Susan fora alguém "importante" durante minha residência no Hospital South Miami, e foi por consideração a ela que eu resolvi me submeter a essa entrevista. Minha mentora insistia que o Hospital Goldenriver, tinha o segundo melhor departamento neurológico do país. E realmente era o que dizia uma porção de sites e artigos das mais famosas revistas do país, que a médica usara para me convencer a vir até aqui. Infelizmente, para mim não importava o quão bom fosse o Metropolitan Goldenriver, ele não era o Hospital John Hopkins, por isso não tinha em sua equipe um dos melhor neurocirurgião do país

      No entanto, estar no melhor e aprender com o melhor, estava fora do meu alcance no momento, e eu não podia me dar ao luxo de esperar por mais um anos por uma nova chance de me candidatar a uma vaga no programa de residência em Baltimore, pois, como Susan mesma me alertou, eu poderia nem ser aceita.

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