18 - Welcome Back To Havana. |Dezembro, 2014.

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Dezembro - 2014.

A arte de amar, a virtude de viver, o medo em se arriscar. Em algum momento, já saboreou de fato, algum desses sabores? Ou apenas sente estar existindo, sorrindo quando na verdade tudo desmorona e fingindo assim, estar dando valor a vida que tem. Atuando de forma inconsequente, e seguindo em frente, sem rumo, sem direção.

O cheiro de café era inebriante, as lembranças eram boas. O som do ranger familiar na porta de madeira, os quadros na parede. Sua casa. Os olhos passavam nostálgicos por cada pedacinho daquele espaço. Nada parecia ter mudado.

Apanhou o quadro em cima da pequena mesinha onde um telefone estava pousado, sorriu com ternura para a imagem, aqueles olhos castanhos esverdeados, o sorriso gigante, os fios grisalhos. O tempo parecia ter congelado enquanto observava Carlos na fotografia, estava segurando no colo uma pequena e naquela época frágil recém nascida. Olhava para a criança com tanto amor e carinho.

Cuidou de Lauren com muito amor e carinho.

- Abuelo. - Deixou um castro beijo na fotografia do avô, decidindo assim que o visitaria mais tarde no cemiterio, onde deixaria flores e suas mais sinceras rezas.

Pousou o objeto no local e escutou a porta abrir-se.

- Clara, trouxe o gelado de aba

Olhou para trás e quase deixou que xícara em mãos caísse, os olhos castanhos estavam bem mais vividos, cansados, algumas rugas apareceram em seu rosto.

Sinu.

A mulher loira parou abruptamente, segurava uma tigela em mãos, pálida, como se visse um fantasma.

- Eu estou tão ruim assim? - Lauren arqueou a sobrancelha negra, largando a porcelana ao lado do telefone, em seu rosto uma expressão divertida era esboçada.

A loira sorriu e após largar a tigela transparente no sofá, fora ao encontro da garotinha que viu crescer, tomando-a em um abraço carinhoso.

- Pelos deuses! - Exclamou a mulher. - Você está tão linda. - Observou o rosto da pianista com emoção. - Esses olhinhos. Como o tempo passou. - Sorriu nostálgica.

A Jauregui sentiu suas bochechas corarem perante tamanha admiração por parte da outra. Não era segredo que tinha Sinu como uma segunda mãe e esse sentimento não havia mudado, por mais que algumas desavenças tivessem ocorrido.

- Clara me disse que irá se mudar para Nova Iorque também. - Contou a mulher e apanhou a mão da mais nova. - Vamos, quero saber sobre tudo.

Sentaram-se no sofá. Lauren suspirou,  haviam tantas coisas a serem contadas.

- Eu recebi uma proposta para fazer parte da Warner Music Group.- Anunciou, sentindo os olhinhos verdes brilharem novamente pelo sentimento da increduilidade. - Eu não tenho certeza de que irei realmente fechar contrato. Mas sinto que isso é uma oportunidade única. - Encarou a fotografia de Carlos.

A esposa do falecido Alejandro Cabello sorriu. Ela via nos olhos verdes a realização, e por um segundo sentiu falta dos tempos em que sua filha tinha os olhos brilhantes da mesma maneira. Dos tempos em que sorria por felicidade e não por etiqueta, dos tempos em que a galeria não havia consumido cada átomo de seu corpo.

Ela sentia falta de sua Camila, a garotinha que usava laços, que sorria gigante ao falar sobre Lauren, que era tagarela como ninguém, com um coração imenso.

- Isso é ótimo, podemos nos ver sempre agora. - A mulher acariciou o rosto da pianista. - Também estou morando em NY.  - Tentou manter o tom feliz, mesmo que ao lembrar de Camila, de sua nova Camila a deixasse triste. - Abri uma confeitaria, sinto-me tão realizada Laur.

- É mesmo? Isso é ótimo, porque levarei Clara comigo. Finalmente a laverei comigo. - Olhou em volta, sentindo uma parte de seu peito mal em deixar tudo aquilo para trás.

Mas fora pra isso que ela lutou não? Fora exatamente isso que cobrou de Camila a seis anos atrás.

E elas pareciam ter conseguido cumprir tal objetivo.

Pelos menos esse elas haviam conseguido cumprir, afinal não era segredo para Lauren a latina ter sido responsável pela mudança de Sinuhe para a América do Norte.

- Posso perguntar algo a você querida? - A loira soltou a mão da mais pálida, assumindo uma expressão perdida, curiosa. - Por que quando toco em seu nome, Camila foge do assunto como o diabo foge da cruz? O que houve?

A mulher de cabelos escuros levantou do sofá e chocou seus cortunos no chão de madeira, dando passos lentos na direção do café.

Não era justo com Camila contar algo, afinal, se a latina quisse de fato que sua mãe soubesse, ela mesmo o teria feito, portanto não seria Lauren a desrespeitar tal decisão.

Ela jamais faria isso, mesmo depois de tudo.

- Essa é uma verdade que eu prefiro não contar sozinha, não é justo. - Murmurou de costas. - Eu vou.. - Vacilou, engolindo a saliva de forma desconfortável - Terminar de arrumar minhas coisas no andar de cima, mamãe foi na padaria, ela volta logo menos. - E então a figura pálida sumira escadaria acima, deixando para trás uma Sinu com tristeza nos olhos.

- Ah vocês duas.. - Negou. - O que o tempo fez com as minhas meninas?




Aos poucos a cidade de Zurique tornava-se ainda mais distante e pequena, as pernas cruzadas e com os familiares saltos nos pés, balançavam, a primeira classe era silenciosa e isso era tudo que ela precisava.

Silêncio.

O homem de terno ao seu lado dormia, e sentiu-se culpada por praguejar que o mesmo tivesse conseguido a encontrar no aeroporto Internacional de Zurique, como fora combinado. Iriam para Nova Iorque, passariam um tempo juntos e Camila partiria para Havana junto de sua mãe. Visitaria Carlos, Alejandro e Clara, e então retornaria a Nova Iorque, onde sua vida como Artista Plástica e empresária consumiam cada átomo de seu corpo.

Abriu os olhos castanhos, a expressão  era cansada, os cabelos castanhos estavam presos em um coque bem feito, e o rosto delineado pela maquiagem escondia as olheiras, os rastros de uma noite insuportável, qual chorou diversas vezes.

Lauren.

Alejandro.

Lauren.

Alejandro.

Lauren.

Alejandro.

Isso era tudo que passava por sua mente, dilacerava sua alma. Após seis anos, ver Lauren tocar em um teatro numa tarde de natal fora suficiente para desenterrar todos os rastros e cacos de um sentimento quebrado. Os olhos verdes por quais sempre teve uma admiração transmitiam tanto sentimentalismo, os dedos agilidosos eram tão leves em cima das teclas do piano. Os cabelos negros e longos, ainda cheiravam a baunilha? Sua banda preferida ainda era The 1975?

Lágrimas.

A umidade quente escorreu por sua bochecha timidamente, e temorosa pelo homem ao seu lado notar, levantou da cadeira, indo em direção ao banheiro.

Alejandro e Carlos com certeza não estavam orgulhosos de seu comportamento. Havia perdido seu verdadeiro "eu" em uma viagem onde ele fora miseravelmente roubado de si pela dor e pela angústia. Havia perdido-se de si mesma.

Deveria cuidar de sua Bella não deveria? Ela havia prometido. Deveria ter continuado sendo aquela garota feliz e alegere, qual havia prometido a Alejandro conservar com todas as suas forças.

E havia falhado.

Camila era o perfeito exemplo de uma pessoa que tinha tudo e ao mesmo tempo nada.

Havana •Camren•Onde histórias criam vida. Descubra agora