Só não quero ser esquecida

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Eva Bovoir

Depois daquele dia eu finalmente entendi o que eram os riscos da parede cinza.

Eram marcas de uma possível contagem de alguém que aqui já foi encarcerado também.

De alguém que tinha medo de esquecer.

Arranquei com as próprias mãos um pedaço podre que caia da madeira da cadeira do canto e comecei a rabiscar.

Quem o fizera antes tinha o mesmo medo.

Não o de morrer mas o de nunca mais sair.

E eu quase consegui...

Enchi os pulmões com todo ar que pude e sentir as pernas arderem pela velocidade que empenhei, sentia cada passada no mínimo vento cortando dentro de um túnel escuro de vários e vários lados.

Esquerda, direita, esquerda e reto.

Eu tentava ver se fazia sentido mas no final eu acabei apenas dando de cara com um poço.

E eu estava lá abaixo.

Foi quando vi o verde acima que me dei conta.

Esse tempo todo não somente estive presa, mas abaixo da terra a uma altura que não podia alcançar.

Certamente não saiam por aqui.

Tinha que haver outra saída, mas já escutava meu nome ecoando pela caverna rochosa e não pretendia voltar.

Tinha plena consciência que não havia como escalar aquela altura até lá fora mas o vento batendo no meu rosto forte, novamente, me dava ânimo para sair, para ir de volta ao meu.

Começo a tentar uma escalada colocando meus pés entre buracos ao longo daquele poço em formato de tubo.

Nunca olhei para baixo, só acima e seguia.

Minhas unhas fincadas contra aquele barro, as mãos machucadas pelas pedras ou galhos que encontrava no caminho vertical.

O peito subia e descia conforme eu avançava ferozmente sem qualquer habilidade, apenas a força de vontade de sair.

Por mim, por Hugo, minha maior força para isso e talvez o motivo do meu fracasso.

Afinal foi sua menção que fez com que eu me desconcentrasse apenas um segundo e meu pé alcançasse um local em falso de maneira que minhas mãos não puderam se fincar e aguentar o peso do corpo.

Perto da metade eu senti quando a derrotada aterrisou no meu corpo quando eu o fiz contra o chão.

Ou esperei.

Afinal ainda de olhos fechados senti braços rígidos me envolvendo ferozmente.

Um calor irradiando que passava dos seus músculos a minha pele quando me apoiei por instinto e surpresa.

Quando abri os olhos tudo o que vi foi aquele azul de gelo e as lágrimas que me recusei a dar mesmo com vontade apareceram bruscamente.

Estava presa em seu domínio novamente.

- Você não tem permissão para sair. Eu só avisarei uma vez: Não há uma saída para você Eva, é bom se acostumar com isso ou vai terminar se machucando - Disse muito próximo do meu rosto me fazendo perceber que não era tão polido assim.

Rugas muito suaves despontavam do canto dos seus olhos e naquele segundo não parecia tão frio.

Mas só por um segundo.

- Solte-me - Demandei e mesmo sem um porque ele concede.

Ou talvez saiba o porque, por um segundo eu vi uma vulnerabilidade que ele não queria mostrar e eu não tinha intenção de ver.

O pecado de Hugo Onde histórias criam vida. Descubra agora