Cidade do Éden

Jéssica

– João? – Perguntou depois de acordar. Não estava mais no ombro de seu namorado, estava com a cabeça apoiada no braço do sofá. Na TV ainda passava Star Wars, olhou ao redor e só aí notou que não estava sozinha na sala.

– Foi ao banheiro, faz uns cinco minutos. – Respondeu Victória da outra ponta do sofá, o lugar entre elas estava vazio e era lá onde João estava. A irmã estava lambendo a própria mão, algo que pareceu aos olhos de Jéssica como uma imitação menos bonita de algum felino.

– E porque vocês está lambendo sua mão? – Perguntou se endireitando no sofá enquanto se esticava e bocejava. Ainda sentia sono.

– É leite condensado, acabei lambuzando a mão... Sem querer. – respondeu Victória enquanto chupava a ponta de um dos dedos. – Quer?

– Que nojo, claro que não. – Respondeu fazendo uma careta à oferta da irmã.

– Não sabe o que está perdendo... – Victória deu de ombros e continuou olhando para frente.

A chuva lá fora já havia cessado por completa, mesmo assim o ar ainda continuava úmido. As nuvens, ela reparou pela porta da varanda, ainda estavam lá e isso era sinal de que a chuva poderia acontecer de novo, talvez até com maior intensidade.

Pouco tempo depois João surgiu vindo do corredor. Jéssica notou que o rosto do rapaz estava molhado, como se tivesse acabado de lavá-lo.

– Eu... – Começou a dizer quando voltou para a sala, parecia nervoso ou ansioso com algo. – Vou embora. Mais tarde eu volto, ok?

– Mas porque? Fica! – Pediu Jéssica.

– É cunhadinho, fica! Tá tão... bom o dia. – Disse Victória sorrindo dando uma última chupada na ponta dos dedos.

João estremeceu como se uma onda gelada tivesse atravessado seu corpo. Victória sorriu triunfante, Jéssica não deu importância às inquietações momentâneas do rapaz.

– É que... Minha mãe ligou preocupada. – Mentiu. Naquele mesmo instante a mãe de João dormia, sem se preocupar com nada além do que estava sonhando. Estava virando alguém de hábitos noturnos, mas isso fica para depois.

– Ok então... – Disse Jéssica cabisbaixa. João era um bom garoto, muito obediente aos mais velhos, ela admirava isso. – Mas volta mais tarde?

– Volto. – Garantiu sem titubear.

– Eu vou te esperar, ai de você se não aparecer. – Avisou Jéssica, ao levantar do sofá. Deu um último abraço no namorado, antes que ele saísse.

– Eu virei. – João disse, reforçando ainda mais sua confirmação.

– Até mais tarde, cunhadinho. – Disse Victória sorridente, com uma piscadela enquanto passava atrás de Jéssica rumo ao seu quarto.

– Até. – Respondeu João, sucinto. Virou-se e saiu. Jéssica o acompanhou com os olhos até que o garoto sumisse da vista, sem reparar em qualquer estranheza.

Jéssica mal havia se despedido de João e já ansiava pelo seu regresso. Tinha muitos planos para aquela noite. Planos esses que já esperava dar seguimento na parte da tarde, mas não foi possível. Além de sua irmã, o próprio João foi empecilho. Aquilo não voltaria a acontecer naquela noite.

Na TV Star Wars chegava aos seus instantes finais, mas ela não se importava. Não conseguia ver graça em muitas das coisas relacionadas a universo nerd que seu namorado curtia. Silenciou a TV e foi para o seu quarto, de onde só pretendia sair quando João voltasse. Aquele era seu reduto, seu canto da paz. O Éden estava lá dentro com o calor, mas, na maioria das vezes, não estava com o barulho.