Capítulo 63

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Não!
É claro que a gente não podia conversar. Conversar para quê? O que ele queria me falar? Qual seria a desculpa que ele ia dar daquela vez?
Não! Não, não e não! De jeito nenhum...
Não pensei duas vezes em sair do MSN e abandonar a rede mundial de computadores!
- Que cara é essa, garoto? – meu amigo perguntou.
- Ele me chamou, você acredita?
- E está falando com ele?
- Lógico que não!
- Ah, sim. Se ele chamou é porque quer se explicar, né?
- Problema é dele! Agora é tarde e atrasado. Não quero mais saber desse idiota!
- Estou gostando de ver, é assim que se fala! Será que ele ainda está na Espanha?
- Não quero saber e tenho raiva de quem sabe. Por mim ele pode estar no fim do mundo que ainda está perto de mim. Quero é distância!
- Nossa, nunca te vi com tanta raiva assim!
- É assim que eu fico quando fico com raiva de alguém. Portanto, nunca me irrite.
- Bom saber. Posso usar de novo?
- Pode e deve. Não quero ver esse notebook tão cedo!
- Dá ele pra mim então?
- Faça bom proveito.
Eu já considerava aquele notebook meu e do Rodrigo. Ele nunca foi totalmente meu e eu nunca me importei em dividí-lo. Que ele usasse quando quisesse!
- Brincadeira, Caio. Ele é seu e eu só vou pegar emprestado.
- Ele é nosso. Enquanto morarmos debaixo do mesmo teto, ele será nosso.
- Você é um amigão!
- Obrigado, você também é.
Pelo visto a raiva que ele estava sentindo de mim já tinha acabado.
- Não está mais bravo comigo? – perguntei quando fiquei um pouco mais tranquilo.
- Não.
- Que bom. Posso saber por que você ficou tão esquisito naqueles dias?
- Sinceramente? Acho que era carência mesmo. Como coloquei o tesão em dia ontem, já estou de boa de novo. Desculpa se eu fui chato com você.
- Eu também fui chato com você. Está tudo certo!
- É, está sim...
- E o bebê da sua irmã, como está?
- Uma graça! Pesando 5 quilos já!
- Tio coruja...
- Muito!
- Será que um dia eu vou ser tio? – pensei alto.
- Provavelmente, né Caio? Você tem um irmão e um dia ele vai casar, constituir uma família... A não ser que ele vire padre ou não queira casar...
- Impossível aquele traste virar padre. Ele é muito mulherengo.
- Quem sabe você já não é tio? Ou pode ser que seja em breve... Faz mais de um ano que não fala com ele!
- Será?
Será que eu já era tio? Será que a minha família tinha aumentado e eu não estava sabendo?
- Acho que não. Meu irmão é mulherengo, mas não é burro. Ele deve encapar a bagaça...
Rodrigo deu risada. Eu estava sentindo saudades do Cauã!
- Vou fuçar no perfil dele, posso?
- Fica à vontade. E aproveita e me conta as novidades. Eu não tenho coragem de fuçar!
- Porque é bobo. Eu fuçaria se fosse você. Isso demonstra que você está preocupado com ele.
- Não estou preocupado. Sinto falta dele.
- Vocês brigavam muito?
- Pra caramba. Desde pequenininhos. Acho que até na barriga da nossa mãe a gente brigava.
- Da hora.
- Da hora nada! Maior porre ter irmão gêmeo.
- Se você diz – ele deu de ombros.
- E aí, o que tem de novo por aí?
- Ele mudou a foto do perfil, mudou o texto também... Colocou umas fotos... Nada de anormal. Ele sabe andar de skate?
- Sim. Aliás, eu também sei! Por quê?
- Tem uma foto de skate aqui.
- Deve ter ganhado do nosso pai. Tudo que ele pede nosso pai dá.
- Hum. Sua família é rica, é?
- Não! Claro que não! Estamos longe de ser ricos. Eles só vivem confortavelmente.
- O que seu pai faz?
- Meu pai tem dois empregos. Pelo menos ele tinha até eu sair de São Paulo. Ele tem uma agência de publicidade e ao mesmo tempo trabalha como diretor em uma empresa não muito conhecida lá da minha cidade.
- Porra, que chique! E ainda fala que não é rico!
- E não sou mesmo. Olha onde eu moro! – brinquei.
- Verdade. Coitado, família toda cheia da grana e você morando aqui.
- Minha família não é cheia da grana, menino! Eles não têm luxo nenhum. Só temos uma casa própria, um carro e nada mais. Coisas muito simples.
- Hum... Entendi!
- E vamos mudar de assunto? Não quero ficar pensando neles não.
- Beleza! Acho que eu vou dormir. Estou cansado ainda...
- Depois dessa eu perdi o sono.
- Cala a boca, Caio! – ele deu risada. – Você dormiu a tarde toda!
- Olha quem fala!
- Mas eu acordei primeiro que você.
- Não justifica.
- Justifica sim! Cheguei depois e acordei primeiro.
- Mas provavelmente dormiu no motel, né?
- Claro que não, moleque! Quem em sã consciência iria dormir em um motel? Por favor, né?
Caí na gargalhada.
- Por acaso você e os meninos foram no mesmo?
- Sei não. A gente se separou, né? Já disse que não curto esses lances de suruba.
- Deve ser muito da hora...
- Cala a boca, Caio. Cala a boca e me deixa dormir.
- Você nem parece hetero, sabia?
- Ué? Por que não?
- Porque normalmente todo hetero curte essas paradas aí.
- Não curto não. Cama pra mim tem que ser comigo e uma gatinha. Nada mais.
- Nem se fosse com duas?
- Aí a figura muda. Aí pode ser... Pode ser duas, três... – ele mordeu os lábios.
- Ah, tá! Até parece que você daria conta – brinquei.
- Não duvide da minha potência, seu infeliz!
- Duvido sim! Não ia dar conta mesmo.
- Ah, se eu pudesse te provar...
- Como é?
- Não, não! Não quero provar você! Quero provar PRA você que eu dou conta!
- Qual é, Rodrigo? Tá querendo me pegar, é?
- Está louco? Bebeu? Fumou? Deus me livre!!!
Ri muito com o meu amigo. Eu estava sentindo falta desses momentos de descontração.
- Brincadeira – falei. – Não queria que você me pegasse não. Entre nós é só amizade.
- Acho bom!
- Você não faz meu tipo.
- Nem você o meu. Falta algo no meio das suas pernas.
- Você até tem, mas deve ser pequeno e eu gosto é de coisa grande!
- Filho da puta! Cala a porra da sua boca, vai? Não quero saber dessas putarias aí não...
- É pequeno! É pequeno mesmo...
- Pequeno é o caralho!
- É o caralho mesmo – ri de novo.
- Não é pequeno porra nenhuma! – Rodrigo garantiu. – Curioso!
- Não? E quanto mede essa minhoca? – investiguei.
- Não é da sua conta, curioso!
- 10 centímetros?
- 10 centímetros mole... Tá doidinho pra ver, né? – ele colocou a mão direita no meio das pernas.
- Não. Já disse que é só amizade, não insista.
Ele deu risada e jogou um travesseiro em cima de mim.
- Palhaço! Todo brincalhão hoje.
- Estou feliz – suspirei. – Embora tenha me estressado agora há pouco.
- Esquece esse moleque, Caio.
- Já esqueci. Ele que me procurou!
- Acho bom.
- Acho que está na hora da gente fazer uma faxina nessa casa... Daqui tá dando pra ver o pó da sua cama.
- É também acho! Precisamos mesmo fazer uma faxina das boas.
- 6 homens juntos não dá muito certo. A casa fica toda bagunçada. Principalmente os quartos.
- Não exagera, Caio! Nossa casa é limpinha. A gente não deixa ela ficar muito suja não!
- Sei. Esses dias o banheiro tava um nojo.
- Banheiro é banheiro! Por isso que tem que lavar todos os dias.
- Haja conta de água.
- Prefere que o banheiro fique igual ao de uma estação de ônibus?
- Deus me livre!
- Então não reclama. A propósito, você não pode reclamar mesmo porque já tem emprego.
- Isso é, mas tenho dó de ficar gastando meu rico dinheirinho com essas coisas.
- Prefere voltar a morar naquela espelunca que morava antes? Se quiser a porta da rua é serventia da casa!
- Que horror, você está me expulsando? Logo você que me convidou?
- É você que está reclamando!
- Reclamo mesmo, a boca é minha!
- Como você é bobo, Caio – ele deu um bocejo. – Posso dormir agora ou você vai continuar tagarelando que nem um papagaio com cólica menstrual?
Cólica menstrual? Eu não sabia que papagaio menstruava...
- Como você vai dormir com esse computador no colo?
- Já estou desligando, palhaço. Hoje você não perdoou uma, hein?
- Estou ligado na 220!
- 220? Diria 330, 440...
- Exagero!
- Aham. Boa noite.
- Boa noite, parceiro. Dorme bem e sonha comigo, tá bom?
- Vou sonhar sim. Vou sonhar que eu estou te empurrando de um precipício e que você nunca mais vai me encher o saco!
- Também te amo, beijo!
Fiquei calado por um minuto. Apenas um minuto.
- Seu idiota – dei risada comigo mesmo.
- O que é dessa vez? Quem te deu o direito de você me xingar desse jeito?
- Seu besta! Papagaio não pode ter cólica menstrual porque papagaio é papagaio e não maritaca!
- Jura que você pensou que era verdade?
Cocei a cabeça.
- Você confundiu a minha cabeça!
- Cara... – ele me olhou com seriedade. – Você é lesado! Puta que pariu...
- Lesado é o senhor seu avô, seu panaca! Faz favor de me respeitar, hein?
- Não... Depois dessa eu tenho que dormir mesmo. Boa noite, tapadão. Não fale mais nada, senão coloco durex na sua boca.
- Nossa... – fingi ficar ofendido. – Faria isso comigo?
- Se você falar mais um "a" eu colo é com "Super Bonder"!
- Malvado!
- Cale-se. Me deixe dormir que eu estou cansado.
- Mole!
- Shiu.
- Chato!
- Cale-se.
- Não!
- Vou costurar sua boca em 3, 2, 1...
- Duvido você fazer isso.
- Fecha o bico, meu filho... – ele choramingou.
- Não e não – brinquei.
- Acho que vou sonhar que vou te derrubar em um vulcão, é melhor...
- Credo!
- Só assim você iria calar essa... – ele bocejou – boca.

BrunoOnde histórias criam vida. Descubra agora