Amaldiçoado

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Nicholas acordou ainda no chão do quarto, e por um segundo pensou que havia sido apenas um sonho. Mas ele ainda sentia a queimação no rosto, a dor nas costelas e as lágrimas congeladas em suas bochechas.

Levantou-se com dificuldade, e a figura no espelho não era nada próxima do que ele já tinha visto de si. Não conseguia abrir o olho esquerdo, o lábio estava cortado até perto do nariz e hematomas roxos espalhavam-se por seu peito, como uma terrível pintura que nunca queria encarar.

— Precisei tirá-lo de cima de você. — Lia surgiu atrás dele, vinte e seis anos de lágrimas. Ela parecia apenas uma menina frágil. — Ia mata-lo.

— No meu estado, morrer é lucro — resmungou, a garganta seca. Arrastou-se de volta para a cama, o cheiro cítrico do namorado ainda nos lençóis. — Por que voltaram mais cedo?

Ela mordeu a boca e respirou audivelmente.

— Descobri que estava grávida e não conseguia aguentar os enjoos.

— E assim voltaram para casa e descobriram que eu namoro um cara. Obrigado por isso, Lia.

— Eu sinto muito, Nick — ela gemeu. — Nós chegamos e a casa parecia vazia, então viemos correndo para o seu quarto e...

— Custava bater na porta?

— Custava trancar?

— A ideia era vocês voltarem em uma semana. — Ele virou de costas para ela, cobrindo-se até os ombros. — O que Matt disse?

— Que vai te fazer homem na base da mão.

— Ele tentou fazer isso quando eu era criança e veja só, agora eu gosto de pênis.

— Nicholas, você precisa entender o seu pai.

— Eu não entendo um homem que acha tudo bem mostrar uma revista masculina para o filho de três anos e influenciá-lo a foder aos doze, mas fica de escândalo quando descobre que esse filho está num relacionamento forte.

— Com outro cara.

— E qual é o ponto? É certo eu foder com doze anos, mas errado estar com alguém que eu amo? Sério, Lia? — debochou. — Você é muito melhor que isso.

— Queria poder te ajudar.

— Também queria, mas nada que você possa fazer vai me ajudar.

Lia fechou a porta quando saiu, e o garoto enroscou-se nos lençóis. Se não tinha vontade de morar com a mãe antes, agora implorava a qualquer força superior por isso.

Ele apagou e acordou incontáveis vezes ao longo do dia, encarou a janela por uma hora inteira antes de levantar e gastou a tarde toda na banheira, ouvindo ridículas músicas deprimentes que não ajudaram em nada, mas era o que tinha. Nicholas conseguiu passar um remédio no olho esquerdo e colocar um curativo frágil no corte na boca, nada que realmente fosse ajuda-lo. Seu rosto estava destruído. Logo ele, que nunca se importara tanto com aquela coisa de aparência, queria chorar.

Saiu do quarto com a barriga gemendo de fome, e o pai estava na sala com o cinzeiro cheio. Nunca sentira medo de Matt, mas muita coisa que nunca tinha acontecido estava acontecendo agora.

— Quem mandou você sair do quarto?

— Eu estou com fome. Ou vai me tirar isso também? — O que é um murro para quem já está espancado? — Se vai me manter em cárcere privado, que pelo menos tenha comida.

Entrou na cozinha antes que ouvisse mais alguma coisa, e não havia nada além da lasanha congelada que jantara na noite anterior. Na última noite que ficara com o namorado.

Saturno e o Astronauta Azul [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora