Capítulo 7

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 O silêncio tomou conta do carro. Ele nem me olhava e eu também não me dei o trabalho de olhá-lo. Éramos orgulhosos, nenhum ia dar o braço a torcer, nenhum iria falar.
 

Quando chegamos na frente da casa dele, ele estacionou e desceu. Respirei fundo várias e várias vezes enquanto ele andava de um lado para o outro me esperando descer.

 Lá vinha sermão.

 Desci.

- Eu já te falei que aquele lugar não é pra você Eny - ele nem me encarava, só olhava para o chão. 

- Por que isso te importa agora? Você não estava me ignorando? - Permaneci de pé.

 Então ele parou e me encarou.

- E se eu não tivesse chegado a tempo? - caminhou em minha direção - você não imaginou o que poderia ter acontecido?

 Não consegui segurar o riso e seus olhos se enfureceram.

- Sei me cuidar muito bem, obrigada.

 Então ele que não segurou o sorriso.

- Eu percebi - ele arqueou as sobrancelhas rapidamente e virou de costas.

- O que quer que eu faça Nien? Me humilhe pra você?

 Ele se virou rapidamente.

 Seu sorriso não existia mais.

- Eu não falei que queria isso! - afirmou me encarando.

 Um breve silêncio se fez.

- Por que ta me ignorando? - fixei meus olhos nos dele.

 Ele desviou o olhar.

- Isso não importa - falou encarando o chão.

- É claro que importa Nien - falei, alto demais.

- Não importa, Eny, só preciso me desfazer do passado - ele gritou e repetiu para si mesmo a mesma coisa em voz baixa.

 Parecia que precisava se convencer também.

 Mais uma vez o silêncio pairava entre nós.

 Meu coração se fez em pedaços naquele momento, eu não estava ouvindo aquilo, não podia ser verdade.

 Lágrimas escorreram pelo meu rosto, não tive tempo, nem força para segurá-las. 

 Ele queria esquecer uma vida, toda a nossa história, tudo o que vivemos e não se deu o trabalho de tentar ao menos inventar um bom motivo.

- Então por que não me deixou lá? - gritei entre soluços - por que foi atráz de mim? Por que você não me deixa de vez? Por que Nien ? - o encarei entre soluços.

 Me senti tão ridícula naquele momento. Eu estava morrendo por dentro e nem sabia o que tinha feito para aquilo acontecer.

- Não consigo não cuidar de você - sussurrou se aproximando.

- Então cuide de mim, Nien - suspirei - eu ainda preciso de você.

 Ele respirou fundo, como se pensasse se deveria mesmo falar o que iria.

- Preciso que se cuide sozinha - ele fixou os olhos nos meus - preciso que aprenda a se cuidar sozinha. Não posso ficar pra sempre ao seu lado. - ele deu um passo pra frente e eu um pra trás - Cresce, Eny. Entenda que a vida não é o conto de fadas em que os melhores amigos vivem felizes para sempre. Aprenda que a vida não é como queremos, as coisas não são como queremos - ele mordeu o lábio para segurar as lágrimas e então continuou - Aprenda a entender quando necessário e aprenda a cuidar de si própria, nem sempre você vai ter alguém pra cuidar de você.

 Aquilo doeu.

- O que você ainda ta fazendo aqui? - o encarei. Fria. - Por que só agora percebeu que eu sou um completo fracasso e não mereço a sua ilustre compania? - fingi uma reverência e sorri irônicamente

- Não seja criança Eny, eu não disse isso.

- Foi o que eu entendi.

- Esse é o problema - ele levantou a voz - você só entende o que quer entender, Eny.

 Olhei no fundo de seus olhos, precisava os desvendar, mas não tinha nada lá, estavam vazios.

 Sequei as lágrimas e pudi senti o gosto amargo em minhas palavras.

- Obrigado por ser só mais alguém que eu perdi, Nien. Tenha uma péssima noite.

 Como de costume, pisei em passos firmes para casa. Segurei as lágrimas até ouvir seu carro sair novamente, e então, desabei na varanda e me deixei transbordar mais uma vez.

"Eu estou bem."Onde histórias criam vida. Descubra agora