Carta 26

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Segunda-Feira, 30 de outubro

Querido Jimin,

Na manhã seguinte, o que eu mais temia, aconteceu. É claro que você descobriria uma hora ou outra, porque não é o tipo de coisa onde se joga um pano qualquer por cima e passa o resto da vida fingindo não estar lá. Mas foi tão doloroso, amor. Ainda é, se quer saber.

Posso ouvir a voz do médico ecoando no fundo de meu subconsciente, como um disco arranhado, sempre repetindo a mesma frase. "Sinto muito. No momento, não podemos dar uma resposta precisa. Não sabemos como o organismo dele reagirá a cirurgia." A maneira como você reagiu disse tudo e mais um pouco, amor. Disse palavras que nem Kyung-soon e Kwan escutariam. Somente eu.

Já havia visto este Jimin antes, não é? Ele emergiu como uma sombra na época da morte de seu irmão, e te corroeu por dentro, a ponto de quase levar sua alma.

E mais uma vez lidei internamente com aquele sentimento de impotência. Inutilidade. Me afoguei em culpa. Calado. Sozinho. Mas e você? Como será que se sentiu ao escutar isso? Qual a potência de ódio dirigida a mim ao escutar isso? Porque a culpa é minha, Jimin. É toda e exclusivamente minha.

Você cerrou os punhos, fazendo a ponta de seus dedos ficarem vermelhas e as veias saltarem. O maxilar rígido como se pudesse a qualquer momento quebrar os próprios dentes com a pressão exercida. E, enquanto o quarto permanecia em um silêncio tortuoso, seu corpo recaiu para trás, afundando na cama.

Havia a expectativa no ar, do choro e do desespero que não vieram. "Ele só está esperando que eles saiam." Pensei, porque era a verdade. Um pouco distante de você, pedi a Kyung-Soon que nos deixasse sozinhos por um tempo. Ela assentiu com a cabeça depois de uma ligeira olhada em sua direção e disse:

− Espero que esteja fazendo isso por ter feito a escolha certo, Jungkook. - Fechei a porta sem lhe dar uma resposta.

Me aproximei de seu corpo imóvel, o nó formado na garganta, uma queimação ácida no interior. Pela primeira vez, desde o dia em que ficamos juntos, Jimin, pensei duas vezes antes de tentar pegar sua mão. Digo tentar, pois quando coloquei a minha sobre a sua, você a retirou. Se afastou como se tivesse medo. Como se tivesse nojo. Eu quase cai de joelhos.

− Por favor, Jimin, não quero acabar com o que temos por causa disso. - Sussurrei.

A resposta veio de imediato.

− Pelo que eu me lembre, você já havia acabado com o que temos muito antes de estarmos aqui.

− Jimin... - Iniciei, sem conseguir tirar os olhos dos seus castanhos profundos misturados ao vermelho. Eles estavam agitados, sem focar em um ponto fixo. Sem conseguir me ver em meio a escuridão, amor. - Foi um momento movido pela emoção. Nós dois sabemos que eu voltaria para você, Jimin. E eu voltei.

Sua respiração se tornou pesada.

− É como se... Como se essa não fosse a primeira vez em que pertencemos um ao outro, entende? Carrego esse sentimento comigo. E eu sei, Jimin, que eu voltaria do mesmo jeito que você voltou para mim ontem, quando morreu bem diante dos meus olhos.

Por leves segundos, sua carranca derreteu. Sua mão, lentamente, se movimentou para a frente, cambaleando entre o lençol te cobrindo. Movi a minha com a mesma timidez, e nossos dedos quase se encontraram. Faltando centímetros, você a retirou do meu alcance. Ainda que cego, Jimin, sei instinto era aguçado demais.

− As coisas não serão as mesmas a partir de agora, Jungkook.

− Eu sei bem disso. - Sussurrei, pegando de vez em sua mão. Você não fugiu. Isso fez meu coração derreter em paz.

POR TRÁS DAS MEMÓRIAS jjk + pjm (Finalizada 09/03/19)Onde histórias criam vida. Descubra agora