Início do fim - Parte II

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– Perdoe-me, Meir, não quis assustá-la!

Um jovem rapaz deteve-se em seu quintal, a meio caminho da mãe e seu bebê, as mãos erguidas e espalmadas, o rosto demonstrando uma súplica sincera. Uma capa cobria seus ombros, mas o capuz estava abaixado, deixando seu rosto à mostra, e a espada embainhada na cintura estava distante de suas mãos.

Meir parou com um pé para dentro de casa, uma das mãos na maçaneta da porta e a outra segurando seu filho. Eryl começou a chorar, e ela rapidamente desviou os olhos do rapaz e voltou sua atenção à criança. Murmurando para o filho e o aproximando do rosto, ela fez um gesto para que o jovem se aproximasse.

– Desculpe-me por tudo isso. – sussurrou, não querendo perturbar Eryl ainda mais. Ele entrou na varanda e pôs a cadeira de Meir de volta em seu lugar. – Espero não tê-la feito perder o sono.

Meir negou com a cabeça, sentindo-se um pouco tola. Sentando-se, ajeitou Eryl no colo e pôs uma mão sobre o peito, sentindo-o pulsar com força, sobressaltado.

– Não fez. Eu já estava sem sono. – Eryl começou a choramingar baixinho e Meir soube que, depois da agitação, seu filho estaria com fome. – Hati, se não se importa...

Ele se sentou de pernas cruzadas no tablado diante dela, desviando o olhar enquanto Meir dava o peito para o bebê. Hati não encarava, ele tinha modos. Ela se acomodou com a criança, e finalmente, soltou todo o ar em um longo suspiro.

– Desc...

– Se for pedir desculpas mais uma vez, eu acordo o Stevan só pra ele bater em você.

Hati se calou, mas um sorriso transformou seu rosto preocupado em uma expressão tranquila. Meir o estudou de cima abaixo. De botas, calças, camisa e capuz, parecia pronto para viajar. A espada na cintura, porém, entregava o que estivera fazendo de madrugada.

– Então você na patrulha? – indagou Meir, de maneira retórica. Fora ele que dera a ideia de uma milícia em Pedralar depois da chegada dos salteadores, então era de se esperar que ele participasse. Tanto para puxar assunto quanto para assegurar-se de que seus temores eram infundados, Meir perguntou: – Viu alguma coisa interessante?

– Pensei que fosse impossível, mas Pedralar consegue ser ainda mais parada durante a noite do que é de dia. – Meir simulou uma expressão de desgosto, mas acabou cedendo e rindo junto com ele. Hati continuou, mais sério: – Eu fiz todo o circuito em torno da vila e próximo ao forte, e estava passando por perto quando vi você acordada. Eu queria... – ele não terminou. Uma ideia, uma suposição pendeu em sua boca por um tempo e então Hati decidiu reprimi-la. – Não, esqueça.

Alguma coisa em seus olhos, uma preocupação que Meir não vira no rapaz nem mesmo ao desafiar o chefe dos salteadores, fez com que ela não deixasse somente por aquilo. Os pelos de seu braço arrepiaram novamente.

– O que foi? Tem algo errado?

Hati hesitou. Decerto não queria assustá-la, mas também não conseguia esconder que algo o perturbava. Por fim, cedeu, e disse:

– Talvez. Acho que é a escuridão dessa lua nova. – Ele olhou para cima, para fora do telhado da varanda, onde o céu mostrava todas suas joias sem o brilho da lua para ofuscá-las. – Nos faz imaginar coisas, ainda mais depois de um ataque. Mas não acho que aqueles homens tenham coragem de voltar, sabendo que Pedralar vai se defender.

– Então o que o incomoda?

Hati parou novamente para pensar, olhando o céu.

– É só um sentimento. Parece que tem alguém rondando em cada sombra, me fazendo olhar por cima dos ombros para ver se não estou sendo seguido. Nunca tem nada.

– Você também? – Meir sentiu uma pontada de medo, como se seu instinto estivesse sendo confirmado. – Acordei com um temor que não sei de onde veio.

– Os outros homens da patrulha também estão assim. – Hati deu um sorriso amarelo, tentando ser tranquilizador, mas a mulher percebeu que não era sincero. – Acho que ainda estamos agitados por causa do ataque.

– Pode ser... - dessa vez, foi Meir que ficou pensativa, olhando as trevas e sentindo o calor de seu bebê contra seu peito, aos poucos se acalmando e rumando a um sono tranquilo. Mas uma luz chamou sua atenção no céu noturno. – Hati, o que é aquilo? – sua voz tremulou com o medo. De alguma forma, Meir soube que as sensações vagas que tivera até agora estavam prestes a se concretizar.

O rapaz olhou na direção em que ela apontava. Acima dos telhados das casas vizinhas, uma colina alta se delineava escura contra o céu brilhante. Havia um forte naquela colina, uma estrutura pequena porém robusta, recém-construída por soldados do Arl. Uma das torres da estrutura se destacava contra o céu noturno, iluminada por baixo pela luz de um fogo recém-aceso.

– Fogo? – ele não sabia o que achar daquilo, e ficou em pé para ver melhor.

Meir lembrou-se das conversas que ouvira entre os homens, combinando a formação da milícia de Pedralar.

– Poderia ser um sinal? Uma fogueira de alerta?

– Eu acho... – Hati começou a falar e então se calou. Uma língua de fogo escalou a torre e, em instantes a estrutura de madeira queimava por inteiro. – É um ataque! Acorde Stevan, são os bandidos!

Mas não eram os mesmos homens e, de alguma forma, Meir sabia. O pavor que a tomou enraizou seus pés no chão, e Eryl começou a chorar.

– Criador, tenha piedade...

E, da escuridão, vieram os uivos dos monstros.

Ossos Quebrados [Dragon Age] [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora