A curandeira vivia em uma casa antiga e escura. Era longa como os casarões de alguns senhores de terra e banns menores, com a base feita de pedras encaixadas e tábuas no restante das paredes e teto, curvando em direção ao centro e formando um telhado arqueado como o casco de um navio. O único cômodo era sustentado por pilares de toras, encurvados e inchados pela passagem do tempo e umidade acumulada. A lareira central, um retângulo de pedras recheado com brasas e encimado por um caldeirão, era a única fonte de luz, e seu brilho revelava um ambiente caótico. Junto a todas as paredes havia cobertores e esteiras enrolados, caixas empilhadas, barris rolados uns sobre os outros, poleiros para galinhas, sacos de grãos e uma mistura de ferramentas agrícolas, armas enferrujadas e utensílios domésticos. Tudo ali, até mesmo os animais, pareciam tão antigos quanto a casa.
Uma coleção de tapeçarias e flâmulas bordadas decorava as paredes até os fundos da casa. Algumas eram antigas e tinham brasões apagados, poucos dos quais Cornelia reconheceu. As mais recentes, porém, tinham um estilo de bordado próprio e um tema em comum: dentes.
Bocarras abertas de ursos, lobos, serpentes e dragões estavam gravadas nos tecidos coloridos. Ao lado delas, e também penduradas nas pilastras, mandíbulas de javalis, de cães, gatos e até mesmo dentes humanos balançavam com a corrente de ar. Cornelia ergueu seu cajado para iluminá-las com sua magia, mas não havia nada nelas além de poeira. Mabel, a imensa mabari que os acompanhou até ali, passou ao seu lado saltando por cima de uma pilha de cobertores de pele e deitou-se ao lado da lareira. Atrás deles, Bjarka fechou a porta.
– Lugar... interessante, essa sua casa. – disse Hati. Revirou com o pé alguns fragmentos de cerâmica e osso depositados junto a um pilar e lançou para Cornelia um olhar inquisitivo. O ambiente como um todo lhe causava desconforto, mas os dentes era o que mais a incomodava.
– Do que se trata essa decoração com presas? – perguntou, tocando de leve a queixada de um javali.
– Não se prenda aos detalhes. – Sara dispensou o assunto com um aceno. – Essa é a maior casa da vila, então eu guardo tudo o que me pedem para guardar. Cuidado para não pisarem nos ovos das galinhas. Bjarka, coloque o moribundo aqui perto do fogo, por favor. Ele precisa ser aquecido.
Sara deu-lhes as costas e pegou mais lenha para por sob seu caldeirão preto e avivar as chamas. Havia bolhas de ar nas paredes internas do caldeirão, indicando que o líquido lá dentro, o que quer que fosse, estava logo abaixo de seu ponto de fervura.
– Isso aqui é praticamente um celeiro. – Hati comentou enquanto colocava Sir Maron sobre uma esteira no local indicado. Ele e Adrian caíram sentados, esfregando os braços exaustos. Se Cornelia ainda tivesse magia em si poderia aliviar um pouco do seu cansaço, mas estava tão esgotada quanto eles. No fim das contas, talvez eles próprios não estivessem tão longe do estado de Sir Maron.
– É demais para apenas vocês duas. – Adrian complementou a observação de Hati. Mabel ergueu a cabeça e rosnou, então ele se corrigiu: – Vocês três, quero dizer.
– Eu tenho uma filha. – disse Sara, provando sua mistura fumegante no caldeirão. – Mas, como eu disse, tem o restante da vila. Fica descendo o morro. – Ela apontou na direção da porta larga e robusta oposta à qual entraram. – Podem conhecê-la pela manhã, e visitar nosso poço.
Cornelia passou entre seus dois companheiros e espiou dentro do caldeirão. A água fervente estava turva e com um cheiro doce. Aos seus olhos, não parecia nada além de chá, e o cheiro lhe era familiar.
– Raiz élfica?
Sara ergueu os olhos, sem deixar de mexer a infusão.
– Mel, repolho, pedra vital. Todo tipo de coisa para combater um veneno como esse.
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Ossos Quebrados [Dragon Age] [Completo]
Fantasy*Baseado na série de jogos Dragon Age* O mundo esteve perto do fim quatro vezes, e o quinto Flagelo se aproxima. Hordas de crias-das-trevas abrem caminho pelas profundezas da terra trazendo consigo morte e desolação. Diante dessa ameaça uma maga, um...