Demônios - Parte I

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— Fazendo amigos? — perguntou alguém junto ao ouvido de Hati.

Ele virou, sobressaltado, e deu de cara com Bjarka. Com sua aparência de guerreira indomável, o sorriso que trazia nos lábios era preocupante, e não amigável.

Ele abriu os braços, gesticulando para a multidão em volta. O burburinho constante de comentários sobre o templário, o poço e a "Coisa Faminta" dentro dele não fora tão informativo quanto esperava. Eram, no fim das contas, aldeões supersticiosos, e suas crendices permeavam seu discurso. Sir Maron, um guerreiro sagrado, e Sara, com poderes divinos de curar e acalmar a Coisa, eram seus protetores enviados pelo Criador. Os pastores e pastoras, fazendeiros e tecelãs de Poçofrio fariam vigília em torno do poço até que seu herói saísse dele vitorioso.

— Fui recebido como um parente. — Hati ergueu um caneco de hidromel pela metade e expôs um meio-sorriso. O primeiro fora trazido por um dos moradores em um barrilete e, segundo ele, era produzido pelo pai de Bjarka. Já o sorriso, Hati o oferecia porque queria fazer Bjarka falar. — Aceita um pouco?

Ela fez que não, contorcendo a boca com desgosto.

— Então vou deixá-lo aproveitar sua nova família. — Dando um tapa cordial no ombro de Hati, tomou o rumo da casa de Sara.

Ele percebera mais cedo que Bjarka não gostava de ver ele e seus companheiros sendo bem recebidos na vila. A mulher tinha uma desconfiança que parecia impossível de superar, mesmo que Sara, sua melhor amiga e a pessoa mais sensata do vilarejo, aparentasse aceitá-los entre eles.

— Vou com você! — Hati anunciou e rapidamente pôs-se a segui-la. Era uma oportunidade de pressionar Bjarka por mais informações sobre o poço e a Coisa. Além disso, tinha uma desculpa: — Tenho que ver como Cornelia está.

Bjarka assentiu e deixou que caminhasse ao seu lado. Deixaram para trás o poço, os aldeões, suas preces e hidromel, ascendendo a via de terra dura ladeada por pastos cercados. Hati imaginou na época em que um bann vivia ali, como aquela rua deveria ser movimentada, cheia de servos e soldados montando guarda, e o pensamento provocou-lhe certa nostalgia. Em Penhasco Rubro não passava uma semana sem que seu pai recebesse um emissário de Denerim ou Cimassempre e todo dia havia ao menos cavaleiro juramentado prestando contas de suas missões ou o filho de outro nobre fechando um acordo em nome da família. Agora, contudo, aquilo tudo estava tão distante e era tão diferente das vilas pelas quais passava e acampamentos nos quais se escondia que Cael e Penhasco Rubro poderiam ter sido em outra vida.

— Pra onde vocês estão viajando? — Bjarka quebrou o silêncio que Hati, em sua introspecção, nem se dera conta que se instalara.

— Para a Torre do Círculo, acho. Levar Cornelia. — Na verdade, percebeu, sua outra vida não estava muito distante. Fazia poucos dias que foram atacados pelos caçadores de recompensas e forçados ao limite para sobreviverem.

— Acha? — ela questionou. Entraram na sombra lançada pelo casarão e bateram à porta dos fundos.

— Não sou mago nem templário, então não vou ficar por lá. — Mais baixo, complementou: — Talvez eu siga meu caminho antes de chegarmos.

Bjarka assentiu, olhando-o com curiosidade, e então a porta abriu com um ranger delongado. Sara franziu os olhos diante da luz matinal.

— Já estão de volta?

— Por que você gosta tanto de manter a casa fechada? — perguntou Hati, dando um passo à frente para entrar na casa porém sendo barrado pela curandeira

— Porque assim as pessoas vêm me visitar menos e tenho mais paz. Além do mais, Cornelia está se banhando, então você não entra.

— Ah. Ei! — Bjarka empurrou-o de lado e entrou na casa.

— Você ouviu ela, não pode entrar. — Bloqueando seu caminho, ela deu um sorriso divertido e apontou para fora. — Por que você não espera ali e quando Cornelia estiver pronta eu aviso que você está esperando? Enquanto isso, eu tenho que contar pra Sara o que vocês andam aprontando pela vila.

— O que eles o quê? — A curandeira arregalou os olhos, mas Bjarka foi rápida em puxá-la para dentro e fechar a porta.

Hati encostou o ouvido na madeira para ouvi-las mas a guerreira deve ter previsto e se afastado, pois suas vozes ficaram distantes. Ele deu dois passos atrás mas parou ao ouvir o ruído de asas batendo e um murmúrio de aprovação. Hati abriu e fechou os dedos sem se virar. Um passo leve atrás de si e ele girou o corpo ao mesmo tempo em que arrancava com um puxão a machadinha de cria-das-trevas em seu cinto.

O homem com o falcão riu sem parecer prestar atenção em Hati. Seus dedos acariciando o pescoço da ave castanha cujas garras riscavam a pesada luva de couro na sua mão esquerda. Vestia-se como um aristocrata das Planícies Livres, com um colete listrado preto e verde por cima de uma camisa de linho, trazendo na bainha uma longa espada cuja guarda abria-se como uma rosa metálica.

O falcão chacoalhou-se e eriçou as penas, parecendo satisfeito com o carinho recebido. Seu dono encostou-se no cercado atrás de si e, com o queixo, apontou para Hati.

— Esta é a arma de um monstro. — Seu sorriso levantou os cantos do bigode encurvado. — Espero que não sejas um, porque tens algo que pertence a mim, serah.


***

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Ossos Quebrados [Dragon Age] [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora