Capítulo 22

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    Ouço vozes assim que saio do chuveiro, o que é incomum. A voz estridente da Marissa é fácil e irritantemente reconhecível. No entanto, a voz exaltada que me surpreende é a de Harry. Vou lentamente até a porta, abro uma pequena fresta e coloco meu ouvido para poder ouvir melhor.

    Você é uma safada bisbilhoteira doente e sem-vergonha.

    Sufoco uma risada. Pelo visto, não sou nem um pouco tolerante comigo mesma. Safada é só o começo.

    - Você não pode simplesmente me botar numa fria dessas na última hora! Já fiz planos e, além disso, nem tenho vestido novo! - Percebo que ela ainda está tentando manter a calma, o que é uma prova do quanto gosta do Harry e, justamente por isso, tenta enganá-lo. Entretanto, não sei ao certo até que ponto ela consegue, de fato, enganá-lo. Seria interessante ver quanto tempo Harry ficaria com Marissa se ela começasse a mostrar quem realmente é.

    - Se eu soubesse que estaria de volta, teria dito antes. Eu queria te surpreender. - Harry aumenta o tom de voz apenas o bastante para falar acima do tom queixoso de Marissa.

    - Bem, agora o que quer que eu faça? Não posso cancelar o encontro com meu pai. Ele já...

    - Não tem problema - fala Harry, tentando acalmar a situação. - Posso levar outra pessoa.

    Há um longo momento de silêncio preenchido por uma tensão tão grande que até eu consigo perceber, mesmo estando do outro lado da porta praticamente fechada.

    Cuidado Harry! Ela vai explodir!

    - Quem você tinha em mente?

    Sua voz é gélida. Eu me pergunto se Harry conhece aquele tom e o que ele significa.

    - Eu não tinha pensado em ninguém, porque não fazia ideia de que você não iria. Mas posso encontrar alguém no último minuto. Não precisa se preocupar.

    Quase dou uma gargalhada. Como assim, não precisa se preocupar? Aposto que Marissa está bufando de raiva.

    Quase consigo sentir o cheiro da fumaça saindo do seu cérebro sobrecarregado, enquanto tenta pensar em alguém que não seja páreo para ela, alguém digno de confiança, mas tão patético que não tenha planos e possa aceitar um convite de última hora.

    - Que tal S/N? Posso apostar que ela gostaria de ir, especialmente depois de tudo o que você fez por ela.

    Sei que meu queixo está caído e que tenho uma expressão de grave insulto estampada no rosto. Posso sentir isso.

    Aí, meu Deus! A patética sou eu!

    - Agradeço a sugestão, mas ela trabalha nos fins de semana, não é?

    - Se ela está trabalhando com o Tom, só Deus sabe qual o seu horário.

    - Bem, não vou acordá-la para perguntar isso. Acho que ela trabalhou ontem à noite, não foi?

    - Sim, mas ela não vai se incomodar. Vou perguntar a ela.

    Ouço Harry começar a dizer algo, mas o modo como ele interrompe a frase me faz deduzir que Marissa já foi embora. Fecho a porta devagarzinho e corro para o banheiro, como se eu tivesse acabado de sair do chuveiro, o que tecnicamente é verdade.

    - S/N? - chama Marissa, batendo uma vez, bem forte, e entrando logo em seguida. Ela nem espera que eu permita sua entrada.

    Bruxa!

    - Aqui - grito.

    A porta está aberta e eu a vejo entrar, praticamente como um furacão. Há uma expressão ameaçadora no seu rosto. Ela não perde tempo com delicadezas.

    - Você vai trabalhar hoje à noite? Se não, preciso que vá a uma exposição de arte com Harry. Você deve um favor a ele.

    É bem típico da Marissa sair usando os recursos de sua artilharia pesada, como culpa e extorsão.

    Tenho muito orgulho de ser parente da amante do diabo. Suprimo cuidadosamente o impulso de bufar e respondo:

    - Para falar a verdade, estou de folga hoje à noite. Mas não posso ir. Infelizmente não tenho nada para usar em uma ocasião elegante como essa.

    Ela descarta a minha desculpa com um aceno de mão.

    - Pode usar alguma coisa minha. Tenho certeza de que a gente arranja um jeito.

    Eu havia acabado de ouvir ela se queixando sobre não ter tido tempo para comprar uma roupa nova para o evento, mas mesmo assim ela está satisfeita de me mandar no lugar dela vestida de... deixa pra lá.

    - Contanto que o Harry não se importe com a minha aparência...

    Marissa ri seu típico riso carregado de desdém.

    - S/N, tenho certeza de que o Harry não vai nem reparar em você.

    Preciso ser honesta. Isso me deixou enfurecida. Merda, que raiva! E é nesse exato momento que decido surpreender todos, principalmente Harry. Marissa vai se arrepender do dia...

    Nem que eu precise incorporar a Cheryl daquela série Riverdale e deixar todos babando.

    Tudo isso está rolando no meu íntimo. Por fora, abro um sorriso gentil.

    - Então, nesse caso, tudo bem.

    Ela se vira e se afasta, sem ao menos dizer um obrigada ou vá à merda. Quando a ouço dizer ao Harry que vou à exibição e que ela vai fazer o possível para que eu esteja apresentável, não consigo deixar de me perguntar se seria possível escapar após golpear seu coração frio com um furador de gelo.

    Por isto, eu poderia ganhar o Prêmio Nobel da Paz. Ou, no mínimo, um telefonema do Vaticano, me agradecendo. Dessa vez, não me preocupo em esconder um riso deselegante.

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Louca por você - Tom H.Onde histórias criam vida. Descubra agora