24 : Melissa

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  Um silêncio tenso paira dentro da pequena e mal cheirosa sala do necrotério.

É ela.

Infelizmente era ela.

Ela está deitada na mesa metálica e reluzente.

Os mesmos cílios longos, as salientes maçãs do rosto, os lábios carnudos e os cabelos ruivos. Porém, tudo está opaco e sem vida. Essa mulher deitada em minha frente não condiz com a das minhas memorias: sorridente, corada, ativa e... Viva. Toco em seu corpo, na intensão de acorda-la, mas nada acontece, apenas sinto mais dor. Lágrimas turvam os meus olhos, dificultando a minha visão, e eu pisco rapidamente impedindo que caíssem. Seu corpo está duro, inflexível e muito gelado.

Mesmo tendo deixando minha irmã e eu ao Deus dará, eu a amo e sempre irei amar. Ela é a mulher que me pôs no mundo, esperou nove longos e árduos meses de enjoos matinas, que ficou comigo em meu quarto quando eu teimava que havia um monstro embaixo da minha cama... Ela foi e sempre será a minha mãe. Independente das escolhas que tenha feito.

Eu me abaixo até seu ouvido e sussurro:

- Eu te perdoo e te amo. – e beijo rapidamente seus cabelos.

- Sinto muito. – diz Zayn com os olhos cor de mel marejado e arqueando os ombros.

- Eu também. – sussurro e atiro-me em seus braços.

Ele abraça-me forte, aquecendo meu frágil e cansado corpo.

- Vai ficar tudo bem, gatinha. – ele diz, beijando o topo da minha cabeça – Eu prometo.

- Espero que sim.

- Pode chorar, gatinha. – ele sussurra em meu ouvido.

E eu o faço.

Choro copiosamente.

Zayn aciona uma funerária de última hora enquanto assino a papelada pela liberação do corpo.

- Eu preciso agora! – esbravejava ele – Nesse instante.

E, por ser Zayn Malik, a funerária não tarda a chegar.

Estamos no carro que Zayn alugou, mas suspeito que seja sua próxima aquisição. O SUV preto corre pela estrada em alta velocidade. De vez em quando ele encara-me e pergunta se estou bem, apenas anuo com a cabeça e o silêncio volta a reinar dentro do carro ou então diz para eu dormir, mas eu nego, toda vez que fecho os olhos eu a vejo. Não quero que ele se envolva com problemas que não lhes diz respeito, não mais do que já está envolvido. Estou formulando mil pedidos de desculpas e agradecimentos a ele. Tenho que me desculpar por tê-lo tirado de sua rotina e o agradecer por ter cedido seu tempo e paciência com um problema meu.

- Está com fome? – indaga Zayn, pondo uma mão em minha coxa, tirando-me de meus devaneios.

Seu toque queima minha pele, de uma maneira boa, mas eu nem ligo. Estou cansada e abatida demais para ter pensamentos depravados.

- Não. – respondo com os olhos fixos na estrada em minha frente.

- Sei que isso é difícil, gatinha, mas você precisa comer algo.

- Tudo bem. – murmuro olhando para janela.

Ele não diz mais nada, apenas passa em um Fast Food e uma porção de batatas fritas e um hambúrguer surgem em minha frente. Agradeço a ele e como até onde aguento. Não muito. Evito falar durante o trajeto de volta para casa. Sei que se falar mais que duas palavras irei voltar a chorar e, dessa vez, ficarei sem controle.

Finalmente chegamos. Zayn embica o carro em frente minha casa e eu murmuro apenas um agradecimento rápido ao fazer menção de descer do carro, mas ele segura, com ternura, meu pulso, impedindo minha covarde saída. Ele leva sua outra mão até meu queixo e vira minha cabeça até que meus olhos inchados e vermelhos encarem os dele.

- Quer conversar, gatinha? – ele pergunta, a boca a centímetros da minha.

Nego rapidamente e puxo meu pulso de leve, mas ele não solta. Zayn desfivela seu sinto de segurança e vira-se, ficando ainda mais perto de mim. Sinto meu coração bater rápido e o sangue correr em minhas veias.

- Eu só preciso ficar sozinha um pouco. – digo fungando – E chorar.

- Posso passar a noite aqui? – ele pergunta cauteloso.

- E a banda?

- Você ainda não entendeu Melissa? – ele aproxima-se mais de mim, tão perto que posso sentir seu hálito quente com cheiro de mente – Nada e nem ninguém é mais importante para mim do que você.

Encaro seus olhos cor de mel e penso no que ele falou, demoradamente.

- E então?

- O quê?

- Posso passar a noite aqui?

- Poder pode, mas, você tem certeza que vai querer ficar perto de mim assim? Com a cara toda vermelha, inchada e...

- Linda. – ele fala sorrindo.

Permito-me sorrir ao menos uma vez desde que essa maldita bomba explodiu.

- Vamos? – pergunto.

- Só se for agora.

Ele sai correndo do carro e abre a minha porta, piso no chão e dou um gritinho de medo e surpresa quando ele pega-me no colo, feito um bebê que pesasse meio quilo. Entramos em casa, tomamos banho e caímos na cama.

- Eu te amo. – digo.

- E você é muito importante para mim. – ele responde abraçando-me.

Ok, não era essa resposta que eu queria, mas estou cansada demais para discutir sentimentos agora. Dormimos assim, agarradinhos um no outro.

Louco por VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora