Só precisa ter olhos

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Uma grossa chuva caia lá fora, impedindo qualquer atividade ao ar livre e Lauren, bem, Lauren agradecia secretamente por isso. A manhã de quarta feira amanhecera como um borrão acinzentado pra ela, que passara a noite em claro.
A porta foi aberta, discretamente
- Lady Norfolk - uma voz grossa sussurrou temerosa
- Entre Wagner - a mulher pediu, estranhando seu próprio timbre que ousava romper o silêncio
Viu o alemão adentrar o quarto sorrateiramente com duas sacolas plásticas
- Trouxe tudo o que pediu, milady - sussurrou como se fosse uma missão ultra secreta
- Pode deixar em cima do aparador, por favor meu caro - pediu - Muito obrigada Wagner - agradeceu sincera antes de levantar e caminhar até o quarto de banho
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- Não ouse abrir a merda dessa cortina, Christopher Jauregui - a voz grossa se fez presente assim que Chris tocou na grossa cortina
O homem riu baixo
- Vejo que está melhor - comentou, indicando o café recém tomado e os pratos limpos sobre a mesa de canto, indicando que sua irmã se alimentara
Lauren limitou-se a terminar de abotoar seu jeans folgado e surrado e prender os longos cabelos em um coque frouxo. Diante dos olhos dele, ascendeu um cigarro e deu um longa tragada
- O que posso fazer por você? - perguntou de forma entediada, sentando-se numa das alcochoadas cadeiras que ficam enfrente a enorme janela coberta
- Pensei que poderíamos cavalgar hoje... - ele tentou
Lauren deu uma risadinha breve, presunçosa
- Já viu o temporal que está caindo, garoto? Volte pro seu quarto e aproveite o clima com a Clem - soltou, agarrando um copo que estava em cima da mesinha de centro e uma garrafa de Whisky esquecida, por breves minutos, embaixo da sua cadeira
- Bourbon? - Chris perguntar confuso, seu pai detestava Whiskys Bourbons e aquele que Lauren bebia era um legítimo Bulleit Bourbon - Não veio da adega do Papa, veio?
- Ah Deus Chris! Você não é o meu pai! - ridicularizou chateada - Ande, saia daqui - o expulsou tal como uma velha rabugenta
Chris ainda bufou alto, exasperado com o comportamento de sua amada irmã, antes de sair a passos duros
- Garotos...- Lauren resmungou, bebendo goles longos de sua forte e amadeirada bebida.
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A igreja First Presbyterian estava quase vazia naquela tarde de quarta, a ressalva somente pelo pastor Derek e mais ou menos umas quinze pessoas. Milika insistiu para sentarem-se na galeria, atípicamente, já quê, como dizia Gordon, a esposa gostava de sentir o suor vigoroso do pastor em cada pregação, por isso, sentava-se sempre nas primeiras fileiras do altar todos os domingos pela manhã.
Na alta galeria, tinham o privilégio de ver toda a igreja e serem pouco vistas, a não ser, pelas duas senhoras que sentavam-se enfrente a elas e um senhor que cochilava, alguns bancos ao lado
Quando o pastor iniciou o sermão daquele dia, a mãe pigarreou baixinho e pediu a Dinah para contar-lhe tudo. Enquanto Derek Wilson falava sobre Levíticos, Dinah contava detalhadamente o passado de Lauren e a conversa das duas no coreto naquela manhã e tarde de domingo.
Ao final da história, Milika perguntou a sua garotinha como ela se sentira, e enquanto um garoto cantava um hino religioso no altar, Dinah explicara cada sentimento que tivera naquele domingo
Quando por fim, tudo acabou, a mais velha meneou a cabeça em entendimento e deu dois tapinhas nas mãos dobradas da loira
- Agora vamos prestar atenção no culto - ordenou concentrada no altar.
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As duas caminhavam de braços dados pela praça enfrente a igreja. A tarde caia lentamente em Sant Ana e tudo parecia mágico em tons de rosa, lilás e laranja. O cheiro de grama levemente molhada e as risadas infantis de crianças que brincavam ali perto, tornava tudo ainda mais especial
- Então? - Dinah quis saber, curiosa
Milika não dissera uma só palavra desde a saída da igreja
- Fico pensando as vezes filha, de que todos sofrem do mesmo mal... Quando estamos dentro de uma confusão, nunca conseguimos ver a solução que está bem a nossa frente sabe? Porque estamos sempre envolvidos demais com tudo... - ela olhou para frente calmamente - Não quero influenciar ou te dizer o que fazer porque seria o que eu acho, e não o que você acha, entende? Mas vou te perguntar algumas coisas e se isso fizer sentido, Dinah Jane, você terá suas respostas e quem sabe até mesmo uma decisão tomada - sentenciou firme
A loira apenas engoliu em seco
- Qual o maior sonho da Lauren? - questionou simples, gesticulando para sentarem-se em um dos bancos de mármore pela praça dispostos
- Ter uma família comigo - a loira falou certeira, sem medo de errar
Milika sorriu de lado
- E qual o maior medo dela?
- Me perder - Dinah sussurrou, com convicção novamente, sabendo o peso daquelas palavras
- Bom... E qual o fetiche mais estranho dela? - permaneceu firme ao questionar
Dinah corou em todos os tons de vermelho existentes
- Mamãe... - sussurrou morta de vergonha
- Vamos Jayz! - Milika quase exigiu
- Hãm... Bolas de pompoarismo - se obrigou a falar, quase querendo enfiar a cabeça no chão
- E qual a coisa que ela faz escondido que você mais ama? - mudou rápida e sabiamente, de assunto
- Comprar chocolates e colocar em cima da geladeira - Dinah falou, sorrindo de lado
- Certo, qual a coisa mais insignificante, que mesmo assim, irrita sua esposa?
Dinah riu baixinho da pergunta e da sua resposta
- Ela odeia errar na escrita, fica furiosa em ter que refazer ou reescrever algo
Milika sorriu junto a filha e encarou a praça por longos minutos, um silêncio cômodo entre elas
- Acha que alguém mais sabe sobre isso? - voltou a perguntar
- Não, só eu - Dinah respondeu com a mesma certeza cujo respondera tudo
- Acha mesmo, depois de tudo que me disse, que não conhece sua esposa?
- Mamãe... No momento eu senti isso - confessou, as lágrimas lhe inundando devagar
Milika sorriu doce e apertou sua menina em um abraço de lado
- Sei que sentiu Dinah, eu sei, foi um momento muito intenso e os sentimentos se misturaram por completo... Mas quero que você entenda que tudo que Lauren foi, tudo pelo que ela passou, formou a mulher com quem você se casou... E olha minha filha, aquela CEO durona e prepotente é apaixonada por você e não precisa de muito para ver isso, apenas precisa ter olhos
Dinah riu baixo, desviando o olhar
Ela sabia que era verdade 
- Eu a amo como nunca amei ninguém e sei que nunca vou amar... Mamãe eu amo Lauren com todo o meu ser! - exclamou tendo a plena certeza do que falava vinha de seu coração - Mas ainda tem a questão de Camila sabe?... Lauren não a quer
Milika deu uma risada alta
- Dinah! Lauren chorou por ter deixado Camila naquele domingo! Chorou tanto quanto a menina! Acha mesmo que ela não a quer?! Deus! Minha filha eu realmente não entendo seu pensamento... - bufou de forma dramática
Permaneceram um tempo em silêncio enquanto Dinah tentava lidar com a chuvarada de emoções
Duas coisas passavam-se em sua mente e ela tinha certeza das mesmas, a primeira era que Lauren a amava, profundamente e incondicionalmente e a segunda era que... Ela também amava Camila, ela amava muito aquela garotinha e ambas sabiam disso
E ela... Ah ela também amava Lauren, necessitava dela tanto ou mais quanto, que necessitava de ar. Camila era seu pequeno raio de sol e Lauren, era a lua inteira, só dela e sempre, só pra ela
- Eu estou com medo... - sussurrou quando a mãe estacionou o carro na garagem de casa aquela noite 
Milika se virou pra ela devagar e fitou a sua menina, segurando com força as lágrimas 
- De quê, meu amor? - sussurrou de volta
- De não ser perfeita mamãe... Lauren merece que eu seja! Merece que eu a dê a filha perfeita! Que eu seja a esposa perfeita e tenhamos a vida perfeita! Ela merece! - gritou, finalmente colocando tudo pra fora - Eu só estou com medo de não dar certo... Com a Mila... E agora com o passado da Lolo... - soluçou, liberando o choro que veio forte
Se viu no minuto seguinte, sendo ninada pelos braços da mãe ainda dentro do carro
- Minha doce Dinah - ouviu Milika dizer com um sorriso - Lauren te acha perfeita em tudo e de todos os jeitos, você só precisa amá-la e ela estará mais do que feliz - garantiu o óbvio
- Ah mamãe, eu a amo tanto, tanto! Quero a minha Lolo... - chorou 
Milika sorriu doce, ficaria tudo bem, ela sabia. 
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Here Comes the SunOnde histórias criam vida. Descubra agora