Apesar dos pesares

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As ruas de Londres eram ainda mais calmas e mais frias do que Lauren se lembrava. A Inglaterra lhe surpreendia com seu clima a cada vez que ela estava aqui. De fato, desde que provara do clima incrivelmente bem divido dos Estados Unidos, a sua terra natal sempre parecia monótona e fria demais
Pisou ainda mais fundo no acelerador do Rolls e o ouviu rugir em resposta imediata
Adorava os carros ingleses, perdendo apenas para os alemães com seus amados Audi's
- Como você está meu amor? - a voz de Clara soou doce ao seu lado
- Ah mama, bem, e a senhora? - murmurou dando atenção a pista a sua frente
- Também Laur... Você está tão bonita, ainda mais - a mais velha elogiou, focando os olhos na sua menina - Como vai a nossa empresa  americana?
As duas entraram em um terreno seguro e confortável pra elas: Negócios. Ambas eram mulheres com dons para o mundo dos grandes negócios petrolíferos.
Muito antes de Michael Jauregui, pai de Lauren, Chris e Taylor falecer, sua esposa já estava incluída nos negócios da Jauregui's Enterprises. Quando ele se fora, oito anos atrás, Clara herdara a maior parte das ações. Atualmente era a filha mais velha quem detinha o maior patrimônio da empresa, já que ela praticamente triplicara de tamanho e poder, graças a si.
Enquanto Clara comandava a empresa original em Londres, Lauren liderava na filial dos EUA, tomando conta da filial de Lyon, na França e da filial de Xangai, na China. Elas eram uma dupla imbatível e muito unidas
- E Chris? - Lauren perguntou, entrando nas ruas mais residênciais de Londres
- Ainda está nas ilhas do Caribe, acho que Antígua ou Bahamas, não sei de certo, ele se muda a cada vez que falo com ele! Ah Deus, Christopher é tão volátil quanto sua irmã - disse de forma desgostosa, arrancando um sorriso da filha
- E tão liberal quanto o papa era - Lauren emendou fazendo Clara dar uma gargalhada
- Sim! Tão libertino quanto seu pai, quem nos dera se levasse jeito pros negócios como nós
- Nem tudo está perdido mama, quem sabe quando ele for mais velho hum? - Lauren tentou remediar em defesa de seu Chris, era certo que era um boba por seus irmãos
- Quem sabe - Clara apenas concordou
- Pode me contar o que houve com a Taylor?
Lauren viu sua mãe suspirar e lhe contar toda a confusão em detalhes mínimos
- Ela é incorrigível Lauren - condenou ao final 
- Ela é só uma menininha mama, só quer atenção
- Não! Ela precisa de disciplina e palmadas! Falei com o capitão Wolsey do English Army College, ele disse que podem aceita-la mesmo no meio do ano se fizermos uma doação para o colégio...
Lauren olhou pra mãe chocada
Colocar Taylor em um colégio militar para ela, era o fim, a menina mal tinha 13 anos!
- Não! - berrou sem se controlar - Isso é loucura mama! Não vai tirar ela do Eton pra submetê-la ao inferno em uma academia militar!
- Lauren ela é incontrolável! - Clara berrou também, extremamente parecida com sua filha mais velha
- Ela é só uma menininha! Está passando por uma fase difícil, isso passa... Se você a deixa morar comigo eu poderia...
- Não! Nem pensar! Ela é minha filha! Tem que ficar comigo!
A gargalhada irônica da mais nova soou alta no carro
- Por Deus Clara! Ficar com você?! Oh sim, ela fica muito com você certo?! Pela noite, quando você chega e se tranca na porcaria do escritório sem nem jantar com ela! Ou seria nos finais de semana quando você some pro Camp Club e a deixa só em casa! Você mal a olha! É lógico que ela vai aprontar coisas do gênero! Já não tem mais pai e nem mesmo a atenção da mãe! - ela finalmente explodiu, soltando as mesmas acusasões que fazia desde o começo de todas as traquinagens pesadas de Taylor, aos 9 anos
Era fato que Clara não nascera para maternidade e pouco fazia questão de se empenhar no papel
Todos os filhos, com a exceção de Lauren, cresceram longe dela tanto física quanto emocionalmente. Todos tiveram suas crises de rebeldia, primeiro com Lauren, que se irritara e deixara a casa dos pais aos 18 e depois com Chris, que fizera o mesmo aos 19, mudando não só de casa, mas como de pais, logo depois, de continente e a pequena Taylor que vira não conseguir a atenção materna de jeitos convencionais e bons, então, escolhera chamar os olhos da mãe pra si da pior forma possível. E mesmo com Clara berrando pra ela, a menina ficava feliz, nem que fosse lhe dizendo insultos, a atenção da mãe era dela.
- Claro! Ela deve ir pros liberais Estados Unidos com você e sua linda esposa não é?! Quem sabe vocês não eduquem minha filha e a façam uma criança feliz já que sua esposa não pode lhe dar filhos! - Clara gritou, perdendo completamente o auto controle
Lauren deu um soco no volante para não dar um em sua mãe
Ninguém falava de Dinah perto de si!
- Limpe sua boca pra falar da minha mulher mãe! Ela será uma mãe muito melhor do que você jamais foi! - berrou com toda a sua força, entrando com o carro no condomínio da mãe, o famoso Bukerhad
- Ela nem pode ser mãe - Clara murmurou a contra gosto, sabia que a filha tinha razão e que a maternidade era um quesito na qual ela perdia feio para qualquer mulher
- Isso não é culpa dela - Lauren soltou entredentes - E não quero lhe ver falando de Dinah outra vez, ouviu?
Clara soltou uma risada baixa
- Ela é minha nora, do que mais eu vou falar? - perguntou já de bom humor
Foi impossível que a raiva de Lauren não se dissipase
- Deveria conter-se - murmurou enquanto passava pelos portões da grande casa branca com vidros espelhados por toda ela
- Não consigo - a mais velha sussurrou e ambas, riram
Era sempre assim com Clara e Lauren, elas se feriam a maneira que podiam, e embora muito dos comentários causassem mágoas, nunca havia raiva entre elas e sob hipótese alguma, ficavam sem se falar
Lauren odiava com todas as suas forças quando a mãe falava de sua Jay, mas também amava muito a mãe
Ela era sua mãe, que apoia-la, ama-la e admira-la por toda a vida
Mais do que seus irmãos, mais do que seu pai
Quando parou o carro na garagem abarrotada de carros e desceu dele, o contornado, sentiu os braços de Clara ao redor de sua cintura quando já a havia dado as costas
Sorriu sem se conter
- Você é o grande amor da minha vida, Michelle, não se esqueça jamais disso - a voz da mãe soou embargada, e foi automático que aquela alta e forte mulher não se vira-se e envolvesse Clara em seus braços, braços esses que eram um refúgio seguro a todos que a amavam
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A mansão em Bukerhad era das casas da família, a única que realmente, não incomodava a Lauren
As demais, repletas de quadros, fotos e detalhes, traziam a irremediável lembrança dos tempos felizes com Michael vivo.
Seu pai descendia de uma família muito antiga da Inglaterra, os Norfolks, que tiveram seu auge no governo do rei Henrique oitavo, quando um tio virou seu Chanceler. Na verdade, a família de Lauren era nobre, Michael era um duque por título e direito, mas como isso nada mais significava nos tempos atuais, a família era conhecida pela empresa
Mas o ducado do pai e a ausência de outros irmãos, fizeram dele o herdeiro do castelo de Arundel, na cidade de mesmo nome, no interior da Inglaterra. Assim como Clara também possuía o direito ao castelo de sua família, o Hever, o qual disputaria com sua irmã, Carol, quando seus pais que habitavam o antigo castelo, viessem a morrer.
Lauren crescera entre esses dois castelos, a casa de campo Costwold em Bibury e a mansão em Bukerhad, alternando entre as quatro durante as épocas do ano quando tinha eventos da família, feriados ou as férias do Eton College
Fora entre esses lugares que aprendera a caçar, montar a cavalo e até mesmo dançar polcas antigas
No verão, sua mãe os mandava para o castelo de seus pais, na parte rural de Londres, onde junto de sua tia Carol, Lauren aprontava todas enquanto Clara fugia para a tranquilidade da casa de campo Costwold, sem a presença dos filhos ou do marido, ela dava festas e mais festas para seus amigos mais íntimos e mais ricos
Enquanto Michael, a traía em alguma parte do mundo, ansiando para o inverno chegar e ter a pequena Michelle no castelo de Arundel, onde eles dois iriam cavalgar, ler e caçar juntos, além de se divertirem em acampamentos malucos regados de muitos marshmallows e histórias de terror
O casamento dos pais sempre fora e sempre seria um enigma para Lauren, eles se amavam e eram uma dupla unida, mas por algum motivo que não entendia, as traições de ambas as partes eram constantes e pareciam indolores, somente abalando com os filhos, tanto que Chris frequentara um psicólogo boa parte da vida infantil para saber lidar com a relação dos pais e os escândalos que surgiam decorrente dela. Michael e Clara sempre estavam felizes e bem quando juntos, o que ocorria poucas vezes ao ano e ainda mais, na presença das crianças
Fitou com calma o brasão da família pendurado ao lado da grande escadaria, duas orcas formando um círculo, correndo atrás da cauda da seguinte. Também jamais entendera o por quê de um brasão tão incomum, mas o pai jamais soubera explicar o símbolo da família, escolhido por seu avô e Lauren simplesmente deixara de pensar nisso com o passar dos anos
Aliás, deixara de pensar em muitas coisas de sua família conforme ficava mais velha
Largou os antigos receios e anseios de lado e voltou a subir a escadaria em direção aos quartos da mansão, especificamente, a terceira porta, cujo nome "Do not enter!" estava gravado com tinta preta e em uma letra quase infantil
Deu somente duas batidas na porta e adentrou o quarto ainda pintado de rosa e com a mobília da época em que Taylor era somente uma doce e gentil menininha, não a peste que fazia outras meninas irem parar no hospital com apenas um golpe de Muay Thai
Encontrou um amontoado coberto por um grosso lençol sobre a cama
- Sei que não está dormindo Taylor - falou grosa, adentrando o quarto e se sentando na cama, ao lado do corpinho parcialmente gorducho - Vamos, enfrente as consequências dos seus atos - ordenou, gentilmente baixando o cobertor do rosto da irmã
Os olhos castanhos esverdeados, idênticos aos de Clara, surgiram e o sorriso da menina foi doce
- Oi Lo - sussurrou - Tô muito encrencada? - perguntou quase adorávelmente, garota esperta
- Oh sim, você está - foi impossível que a mais velha não sorrisse ao ver sua menina - Eu ouvi do diretor Surrey, do senhor Pace e da mama, mais ainda não ouvi sua versão da história, a qual você vai me dizer agora... E Taylor, é melhor me dizer toda a verdade, porque você já vai apanhar muito com ela, dirá se mentir pra mim - o tom de Lauren foi calmo, mais sério e temeroso o suficiente para um arrepio correr a espinha da garota que ainda estava deitada na cama
Como ela iria explicar de modo plausível e convincente que deixara a pobre Ana Pace desmaiada com apenas um simples soco em gancho? Ou que tal brutalidade tivesse sido ocasionada somente por Ana tê-la chamado de gorda?
Taylor amava sua irmã acima de qualquer outra coisa no universo, mas ao mesmo compasso que a amava, também lhe tinha medo
- Lo... - fez seu melhor biquinho choroso - Ela me chamou de gorda...
- Sim? E? - Lauren a incentivou sem entender absolutamente nada
- Eu não sou gorda! - Taylor choramingou
A respiração profunda da mais velha foi ouvida
Ela simplesmente não podia acreditar nisso
- Deixou Ana Pace inconsciente por que ela lhe chamou de gorda?! - berrou, finalmente furiosa
- Mais foi na frente de todo mundo! - Taylor até tentou rebater
- Pro escritório, AGORA! 
E foi aí que a menina deu um salto de sua cama e correu em disparada para o antigo escritório do pai, sentindo antecipadamente a dor nas nádegas
Estava ferrada, muito muito muito ferrada
Sabia perfeitamente que quando Lauren a mandava para o escritório, não seria só castigo, seria punição.
Uma bela e eficácia punição que servia infalivelmente, no melhor estilo da família Jauregui
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