It's a Boy Girl Thing

Capítulo 48

⚠️ • Este capítulo contém cenas que abordam temas sensíveis, incluindo tentativa de abuso sexual, que podem ser perturbadores para alguns leitores. Recomendamos cautela ao prosseguir com a leitura e que priorizem seu bem-estar emocional. Boa leitura! • ⚠️

Por que você está tão indiferente?
Eu sei que é difícil de conversar, com toda nossa história, mas isso não significa que você deveria ir embora.
Estou tão cansado de planejar todas as minhas noites em torno de maneiras de como te evitar.
Nós não temos que nos apaixonar de novo, ou tentar.
Mas você pode me dizer por que nós temos que ser inimigos?
Esqueça todas as cicatrizes, tudo o que elas são, apenas memórias.
Eu sei que dói, porque eu também sinto, eu pensei que dissemos que estávamos bem, eu fui mal interpretado?

                 Enemies – LAUV

         Point of View Christopher

O céu estava cinza, pesado com nuvens que pareciam refletir o peso da cerimônia, o ar estava tão denso quanto, carregado de uma umidade fria que cortava a pele. Pude sentir o cheiro distante da terra molhada, dando a sensação de que choveria a qualquer momento.

O cemitério militar mantinha um silêncio respeitoso, um tipo de quietude diferente de qualquer outro lugar. Havia um peso no ar que tornava cada respiração mais lenta, mais solene, como se o próprio ato de respirar devesse ser comedido. Eu estava ali, parado, com o olhar perdido no horizonte, tentando encontrar algum sentido naquele redemoinho de pensamentos que me consumia. A voz do comandante ecoou, firme, cortando o ar como uma lâmina.

O caixão estava envolto na bandeira, cuidadosamente dobrada, uma honra reservada para aqueles que haviam servido ao país. Os soldados ao redor se alinharam, ombros erguidos, olhares fixos, cada movimento perfeitamente coordenado como uma coreografia silenciosa. Quando ergueram suas armas ao mesmo tempo, o metal brilhou sob a luz cinzenta do dia nublado. E então, o som dos tiros ressoou no ar — três salvas, cada uma perfurando o silêncio com um estalo agudo, quase ensurdecedor.

O primeiro tiro me fez prender a respiração; o segundo, fechar os olhos por um instante, como se isso pudesse, de alguma forma, afastar a sensação avassaladora de desconforto que começava a me envolver. O terceiro tiro soou mais distante, e tudo que restou foi o eco se dissipando na distância, como se o mundo tentasse absorver o peso daquela despedida.

                             Morte.

A morte é tão definitiva, tão brutal em sua simplicidade. Ali, observando de longe, me peguei refletindo sobre como uma vida inteira poderia ser reduzida a um momento, uma cerimônia, uma série de gestos cuidadosamente executados, uma bandeira dobrada com precisão matemática e uma salva de tiros. Uma forma de homenagear alguém que nunca mais abriria os olhos, nunca mais sorriria, nunca mais se arrependeria ou perdoaria.

Lancei um olhar de soslaio para Dulce, que estava de pé a poucos metros de mim, o rosto pálido, os olhos fixos no caixão coberto. Ela  está no meu corpo, mas sua postura, a maneira como segurava as mãos na frente do corpo, como se quisesse controlar o tremor, era inconfundível. Ela estava visivelmente abalada, e eu sabia que Channing havia sido importante para ela, mesmo que de formas que eu não compreendia completamente.

        Eu ainda tentava entender.

Tudo o que eu conseguia pensar era o quanto me sentia enganado por ela. No silêncio dela, na maneira como seu olhar emanava culpa misturada com preocupação sempre que eu a questionava sobre suas idas à casa de Anahí… tudo entregava. E junto com esses pensamentos vinha o peso esmagador de saber que ela havia ignorado meus medos, minhas reservas. Era um fardo para o qual eu não estava preparado.