Chapther twenty nine

652 39 6
                                    

                                    Capítulo 29

Um ano e meio depois

Homem. Clínica. Celular. Portão. Buzina. Clarão. Chão.

Abri os olhos, assustada, sendo contemplada por minha mãe instantes depois.

- Por quanto tempo fiquei desacordada? – perguntei, sentindo o carinho de minha mãe em minhas mãos. Eu tinha plena ciência de que tinha sido atropelada.

- 2 anos, quase. – ela respondeu com o sorriso quase não cabendo no rosto.

- Uau, 2 anos. – me espantei e murmurei aquelas palavras para mim mesma. Fechei os olhos e mirei meu pai, que entrava sorridente no quarto com o médico em seu encalço.

- Bom dia, senhorita Leibovitch . Como se sente? Cansada? Tonta? Enjoada? – ele perguntou, fazendo aquela mesma "checagem". Nesse momento ele me cegava com uma lanterna.

- Cansada? Passei 2 anos deitada! – tentei brincar, mas minha voz parecia sonolenta, não espontânea.

Então me lembrei de que uma moto havia me pegado na saída de uma clínica. Clínica onde eu tinha tido uma consulta. Uma gestação dura 9 meses... Não, não!

Minha visão, ainda que um pouco turva, me permitiu constatar que minha barriga estava lisa.

Sem aquela curva imensa que não me deixava nem ver as unhas dos dedões dos pés. Meu espanto fez meus olhos saltarem e meus batimentos cardíacos dispararem.

Eu respirava fundo enquanto meus olhos se inundavam em lágrimas, que caíam por meus ombros sem minha permissão. Um nó imenso se formou em minha garganta e eu queria soluçar. Meu abdômen se contraiu por diversas vezes num choro reprimido. Eu não gostava de chorar na frente de ninguém.

As mãos quentes e macias de minha mãe alisavam meu braço, e eu levei minhas mãos ao rosto, embora não conseguisse os sustentar por muito tempo no ar, devido aos sedativos ainda um pouco presentes no soro.

Um soluço alto escapou de meus pulmões, e eu havia conseguido me virar, me postando em posição fetal. Eu escondia meu rosto entre as mãos.

- Cadê o Z? – perguntei, desesperada. Eu precisava saber como ele estava, precisava dele ali, me consolando, precisava dele.

Continuei com minha lamentação por minutos, não obtendo nada em resposta.

- Cadê o Z? – indaguei novamente, com um pouco mais de desespero em meu tom de voz.

Ouvi a porta do quarto ser aberta, mas não fiz menção de olhar.

- Z? – supliquei, praticamente. O médico, ao fundo, avisou que voltaria instantes depois.

- Sou eu, amiga. – Bella respondeu, se colocando na minha frente e me abraçando fortemente.

- Amiga, eu perdi a Celle. – funguei, tentando parar o choro. Inalei a maior quantidade de ar que eu podia e exalei.

- Eu sei, eu sei. – Bel deu um beijo na minha testa, saindo do abraço.

- Cadê o Z? – perguntei, acompanhando com o olhar Bella virar e olhar para o rosto da minha mãe, que fez um não com a cabeça.

- Mais tarde a gente conversa sobre isso, ok? O médico precisa fazer exames em você. – pensei em protestar, mas não tinha força nem pra levantar, quanto mais pra aumentar a voz. Não esbocei reação alguma, só escutei coisas como "já voltamos" e os passos do médico preencherem o cômodo enquanto ele me cutucava para ver se estava tudo no lugar.

Então Zayn tinha me deixado. Simples assim.

Ele tinha partido para morar na França por dois meses porque eu não tinha previsão para sair do coma. Grande covarde. E eu que achava que ele ia ficar comigo até os meus batimentos cardíacos pararem. Idiota. Estúpido.

Estúpida.

Como eu podia acreditar em "amor até que morte nos separe" e em toda essa baboseira de romantismo? Grande jogador, ele foi. Grande merda, ele foi. Fez-me passar por sofrimentos desnecessários.

Suas promessas eram falsas. Quem diria...
Eu estava irada. Se ele entrasse na minha vista, eu provavelmente o partiria em pedacinhos.
Se ele entrasse em minha frente. Ri dos meus próprios pensamentos. Zayn devia bem estar com uma ruiva francesa louca por filmes antigos e três vezes mais inteligente que eu.

Engraçado como a vida me surpreendia cada vez mais. Quando minha mãe me dizia que eu deveria estar mais que feliz porque estava a salvo, porque as sequelas do acidente tinham sido mínimas, eu estava mais infeliz do que nunca. Perdi quem eu amava e perdi aquilo que esse "amor" gerou.

Enxuguei as lágrimas e rodei a maçaneta do banheiro, soltando um gemido ao bater minha mão nela. Uma mancha roxa a dominava por conta do soro que vinha sendo aplicado ali há algum tempo.

Levantei a cabeça e encarei o cômodo a minha frente, totalmente diferente do que eu imaginaria em um caso de emergência antes do acidente. Quer dizer, não que alguém fosse me perguntar no meio de um jantar de amigos "E aí, se um dia você bater a cabeça e ficar inconsciente por uns dois anos, quem você imagina que ficaria ali do teu lado no hospital?", mas deu pra entender o que eu quis dizer.

O fato é: não se pode confiar em depositar em um companheiro de relacionamento uma confiança maior que aquela que você deposita em si mesmo. E isso eu aprendi dando a cara a tapa, por mais que não esperasse por esse.

Reclinei a cama o suficiente pra poder sentar e fiquei folheando uma revista que Bel trouxe. Percebi que algumas modas estranhas surgiram, assim como novos cantores. Certamente demoraria um tempo pra me acostumar àquilo tudo, mas nosso amigo tempo taí pra isso, né? Pra curar as feridas, pra nos fazer rir de coisas que no presente acreditamos que não possam ser superadas, pra nos fazer ver o quão tolos somos ao pensar que o futuro pode ser controlado, quando, na verdade, num piscar de olhos, tudo pode acontecer.

Acordei com outra visita do médico, cujo nome eu tinha esquecido – efeito do remédio, segundo ele. Mais uma bateria de exames, mais um coquetel de remédios, mais visitas de parentes, mais tudo.

Menos Zayn.

Parece que quando o tédio ataca, sua cabeça se redireciona pro que mais está lhe afligindo no momento. E era justamente esse tipo de reflexão que eu estava tentando evitar. Comecei a perguntar à minha mãe o que tinha acontecido de importante nesse período, e ela começou a tagarelar sobre as fofocas da família, coisas aquelas que não prendem a atenção. Então, atrapalhei sua brilhante história de como minha priminha tinha passado para um colégio extremamente difícil e perguntei sobre o que tinha acontecido com meu emprego, minha faculdade etc. Eu teria que reorganizar minha vida alguma hora, né?

Infelizmente, esse papo de reorganizar a vida foi por água abaixo, já que Bella estava cuidando disso tudo desde ontem, quando acordei. Não demoraria muito até que eu voltasse a cursar a faculdade no período em que parei e muito menos a ter a vida de antes.

Não exatamente a de antes, mas similar. Talvez até melhor.

Essa coisa de que o amor supera tudo e que é melhor estar apaixonado que sozinho é tudo bobagem, cheguei a essa conclusão. Com o amor, você tem que se preocupar por dois, pensar por dois, viver por dois. Não é muito melhor fazer as coisas sozinho?

Ter a liberdade de mudar o rumo quando você quiser?

Não, não é. Pare de tentar se conformar com a sua vida miserável, Louise.

Olhei para o relógio e fiz as contas: mais 37 horas e eu estaria longe daquele inferno.

Insanity | zmOnde histórias criam vida. Descubra agora