Capítulo XI

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 Na manhã em que chegamos às fazendas, os guardas que nos acompanhariam em nossa estadia montaram um pequeno acampamento ao redor da antiga cabana de Thesig, estavam intrigados sobre como eu havia descoberto aquela velha residência tão diferente e distante do resto daquelas das fazendas, mas eu não lhes disse nada, não seria relevante para eles. Alguns fizeram uma leve careta ao ver o estado deplorável da pequena cabana, mas os dois bárbaros não pareceram nem um pouco surpresos. O que fez eu me perguntar sobre o tipo de residências que eles viviam em Brakbar. Enquanto os guardas se organizavam do lado de fora, Ghurab e Manva se adaptavam ao lado de dentro. Falaram em brakbariano, apontando para as rachaduras das paredes, a mancha de cinzas do chão da sala, o amontoado de palhas. Parecia que planejavam consertar grande parte daquilo e saber como fazê-lo.
 Minha ideia de levá-los até ali tinha sido consideravelmente fácil na teoria, mas na prática levou mais tempo do que eu desejava. Explicar a meu pai os motivos de tal decisão fora, de longe, a parte mais difícil.
 "De jeito nenhum!", ele gritou assim que terminei de contar o que planejava.
 "Eu não pedi por sua permissão. Será feito. Eles trabalharão nas fazendas pelo tempo que for necessário até eu conseguir as informações que buscamos. Acredite em mim, assim que saírem daquele calabouço, vão cooperar. Se com a brutalidade não tivemos sucesso, talvez seja a hora de um novo tipo de abordagem."
 "Alioth, você não colocará aqueles selvagens junto de nosso povo dentro das terras que eles mais cobiçam."
 "Eu terei tudo sob controle, pai. Vou ficar de olho neles o tempo todo, assim como vários outros guardas que levarei comigo. Eles usarão grilhões em seus tornozelos. E eles não ficarão tão perto assim das outras pessoas. Vou escolher os lugares em que eles trabalharão de modo que fiquem afastados do povo das fazendas."

 "Eu disse não!"

 "E eu disse que não pedi sua permissão!", elevei o tom de voz.
 Cepheus massageou as têmporas e fechou os olhos, respirando fundo algumas vezes, tentando de alguma forma acalmar sua mente e a vontade de me acorrentar ao pé da mesa diante de nós.
 "Não vou conseguir fazê-la mudar de ideia..."
 "Nem tente."

 "Já admiti minha derrota quanto a isso. Quero saber onde ficarão instalados."
 "Estabeleceremos acampamento na floresta, numa parte afastada das fazendas, próximos ao grande lago."
 "Espero que saiba o que está fazendo."

 "Dificilmente eu sei o que estou fazendo", soltei uma risadinha nervosa, o que fez com que meu pai ficasse tenso. "Estou brincando. Confie em mim".
 Depois de conseguir convencê-lo, fui até meus homens e selecionei a dedo os mais qualificados para me acompanharem naquela missão. Seis homens era o suficiente para conter dois bárbaros, não? Em seguida fui até a cabana de Thuban, onde ele e Thesig comiam algo que tinha cheiro de torta de pêssego. Ergui uma sobrancelha para meu amigo.
 "Desde quando você sabe fazer tortas?"
 "Eu não sei. Comprei ela no mercado.", respondeu com um sorrisinho sacana.
 Balancei a cabeça negativamente e me aproximei para me servir de um pedaço. Depois de engolir a primeira garfada, falei em tom baixo.
 "Levarei os bárbaros para trabalharem nas fazendas. Preciso fazer com que eles cooperem e também ficarei de olho naquelas pessoas. Os colocarei em sua antiga cabana, se não se importar." olhei para Thesig.
 Ela e Thuban me olhavam como se eu tivesse dito que correria nua pelo Salão Central.
 "O que foi?"

 "Você vai levar os bárbaros para as fazendas?", Thuban soou um pouco repreensivo.
 "Vou, qual é o problema? Por que todo mundo fica com essa cara quando digo isso?"
 "São as terras que eles mais querem de Thorae. Você sabe disso. Vai levá-los até o lugar em que eles querem estar."
 "Vou mostrar a eles alguma benevolência, Thuban. Mas levá-los até as fazendas é só um pretexto para avaliar as pessoas que já estão lá. Perto deles, os bárbaros não passam de crianças rabugentas. Há mais crueldade em thoranianos das fazendas do que nos invasores brakbarianos."
 Ele semicerrou os olhos e então nós dois olhamos para Thesig, que se manteve calada. Seu belo rosto estava levemente pálido. Ela encarava a torta em seu prato, sem realmente vê-la. Me aproximei e coloquei um joelho no chão, pousando as mãos em seu colo. Sua cabeça lentamente se virou na minha direção, os olhos estavam levemente desfocados.
 "Thesig? Você está bem?"
 Passaram-se alguns instantes até que seu olhar focasse novamente. Ela analisou meu rosto, e então colocou as mãos sobre as minhas em seu colo.
 "Estou. Estou bem. E sei o motivo de estar fazendo isso. Mas não direi a você o nome das pessoas do meu passado. Talvez eles tenham mudado."
 Apertei os lábios e fitei-a por mais alguns segundos, então apertei suas mãos carinhosamente.
 "Eu nunca terei a capacidade de ser tão bondosa quanto você. Não pedirei os nomes, mas vou mantê-los sob observação também. Está na hora de algumas mudanças."
 "Obrigada."

Beldarrien - A Coroa AmaldiçoadaOnde histórias criam vida. Descubra agora