Capítulo VX

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Thesig 

 A vida no centro de Thorae era bem diferente daquela nas fazendas, diferente de uma vida exilada. Ainda estava me adaptando à movimentação constante ao meu redor. Thuban estava me ajudando da maneira que podia. Contei a ele minha história um pouco depois de Alioth ter ido para as fazendas. A reação dele foi diferente da de Alioth. Enquanto ela havia sido delicada apesar de estar assombrada, Thuban ficou enfurecido. Berrou o quão absurdo aquilo era, quis ir até o Salão Central para denunciar meus agressores, mas eu o impedi. Bastou olhar para mim para que uma leve compreensão iluminasse seu rosto, ele entendeu porque Alioth resolvera levar os bárbaros para as fazendas. Não era somente para submetê-los a qualquer que fosse a punição preparada, mas também para ficar de olho nos moradores das fazendas. E com isso, a tempestade passou. Thuban saiu para cuidar da ferraria um pouco depois, quando bateram em sua porta, eu abri e vi o mensageiro do lado de fora carregando uma caixa grande, aparentemente bem pesada, dizendo que a entrega era para mim. O tal presente que Alioth disse que chegaria. Me aproximei para pegar a caixa, mas o rapaz insistiu para trazê-la ele mesmo para dentro, pois estava pesada. Agradeci e o deixei entrar. O homem colocou a caixa em cima da mesa na cozinha e tirou uma carta do bolso de seu casaco, entregando para mim antes de sair. Olhei o envelope e suspirei baixo.
 "Que ótimo."
 Coloquei o envelope ao lado da caixa e a abri. Dentro dela, havia uma peça toda feita de cobre, com roseiras e vinhas delicadamente esculpidas nele. Meus olhos se arregalaram. Aquilo devia custar uma fortuna, o que eu faria com aquilo, afinal? Não tinha exatamente um lugar para deixar de enfeite. Sentei-me na cadeira e fiquei olhando para a peça, tentando imaginar porque Alioth me daria algo como aquilo. Ela havia dito que eu poderia fazer qualquer coisa com ela, mas o que poderia ser? Cocei a nuca e me levantei. Primeiro, eu precisava me ocupar, depois pensaria sobre o assunto.
 Quando Thuban voltou para casa naquela noite, franziu a testa ao olhar ao redor.
 "Você limpou tudo?"
 "Sim, espero que não se importe. Eu precisava me distrair um pouco."
 "Claro, tudo bem. Suponho que essa caixa seja o presente de Alioth."
 Me aproximei da mesa e abri a caixa para que ele visse o conteúdo.
 "Eu não faço ideia do que fazer com isso. Por que ela o daria para mim?"
 "Bom, pode usar como enfeite. Mas seria muito melhor vendê-lo. Vale um bom dinheiro, você teria o suficiente para não precisar trabalhar por um bom tempo."
 "Isso nem passa pela minha cabeça."
 "Vendê-lo?"
 "Não. Ficar sem trabalhar. Eu não saberia viver assim."
 Ele assentiu devagar e fitou a peça de cobre mais uma vez.

 "Poderia comprar uma casa com o dinheiro que isso vale."
 Me virei para ele, erguendo as sobrancelhas.
 "Mesmo? Uma casa?"
 "Sim, e uma das boas."
 Sorri comigo mesma. É, seria bom ter uma casa. Então peguei o envelope que havia deixado ao lado da caixa, ainda lacrado. Pigarreei baixo e o virei algumas vezes em minhas mãos.

 "Thuban? Pode me fazer um favor?"
 Virou-se para mim. "Sim, do que precisa?"
 Ergui a mão, mostrando o envelope. "Ela mandou uma carta junto, mas... Bem... eu..."

 "Você... não sabe ler.", não foi uma pergunta, mas eu assenti mesmo assim. "Quer que eu leia para você?"

 "Por favor.", pedi.

 Thuban pegou a carta delicadamente de minhas mãos e a abriu. Desdobrou o papel e leu em voz alta para mim.

 "Finalmente encontrei uma utilidade para essa porcaria. Espero que goste, que de alguma forma te ajude, seja esteticamente ou financeiramente. Saiba que tem meu apoio para qualquer decisão que tomar em relação a esse presente. Se sou capaz de mudar o rumo da vida de várias pessoas, começarei por você. Que o futuro seja melhor que o passado, Thesig. Com carinho, Alioth." Finalizou e ergueu o olhar para mim, mas eu fitava a peça de cobre dentro da caixa.
 Como aquilo tinha acontecido? Duas semanas atrás eu estava sozinha na floresta, comendo somente quando conseguia algo para comer. Dormindo em fardos de feno. Me aquecendo com uma pequena fogueira na minha sala, só quando conseguia lenha o suficiente para uma. Pensava que ficaria naquele lugar para sempre, ou pelo menos até morrer de fome ou frio. Então Alioth apareceu. E tudo mudou. Muitas coisas poderiam mudar.

Beldarrien - A Coroa AmaldiçoadaOnde histórias criam vida. Descubra agora