Capítulo 1 - Ela conhecerá Ele (part. 5)

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Essa é a mensagem que recebo de um número de celular estranho. Fico perplexa. Não havia visto ele em nenhum momento pegar o celular. Como é possível? Que coisa estranha! Entro no jogo e começo a digitar a resposta. Marcelo olha o celular, mas não retorna o aparelho ao bolso, o coloca em cima da mesa. Está me provocando. Não pode ser uma coincidência tão sincronizada. Aperto o botão de enviar: "Sinto muito, namorado do futuro, não vai rolar beijo nenhum." e fico atenta, aficionada na tela do celular dele para ver se toca ou vibra. Nada acontece. Passados dois minutos, ele retorna o celular ao bolso, marcando bem a sua jogada no tabuleiro – só havia deixado o celular na mesa naquele exato instante. Desgraçado!

- Vocês vão comer sobremesa? Estou louca por um doce! – propõe Bianca.

- Nós podemos dividir o petit gateau com sorvete de creme – emenda Murilo.

- Por que não dividimos esse também? – sugere Marcelo. Aceito.

Ordenamos e os doces chegam rapidamente. Ajeitamos a cadeira para ficarmos mais próximos do prato e não nos lambuzarmos com tanto sorvete e calda. Há algo extremamente sensual aqui. Uma enorme tensão. Nós dois comendo este doce saboroso como orgasmo e se encarando, quase roçando os braços, um olho no outro, um olho na colher, as bocas abrindo e fechando sincronizadas. A colher corta o bolo, o sorvete o envolve e a calda é enrolada com um leve movimento giratório para finalmente as línguas sentirem o quente e o frio, misturados.

- Está sujo aqui – ele diz, com a mão já acariciando abaixo dos meus lábios, mas ainda não queixo, pegando a calda e levando até sua boca. Sua intromissão foi abusada, ousada, desmedida, ordinária, mas não sei por que, incrivelmente sexy. Bianca me olha de rabo de olho como se lesse meus pensamentos: "Está ficando interessada, né sua safadinha" – diz sem dizer, sorrindo levemente.

Os rapazes dividem a conta, mesmo depois de muita insistência nossa para que rachássemos. Certos machismos não mudam, mas, como havia sido a primeira vez, deixei passar e recolhi minha carteira. Saímos do restaurante e começamos a nos despedir.

- Beijo amiga – digo lhe dando dois beijinhos no rosto. Em seguida cumprimento o Murilo da mesma forma.

- Foi um prazer, cuida bem da minha amiga, hein? Tô de olho – alerto. Por fim, chega a vez de me despedir do Marcelo. Bate-me a dúvida se mando mais uma piadinha, mas demoro a pensar em algo e sai simplesmente a formalidade:

- Tchau, Marcelo, foi um prazer.

Eu já estava indo cumprimentá-lo com os mesmo dois beijinhos no rosto, quando ele interrompe o movimento e me pergunta para aonde estou indo. Leblon, respondo, e ele me oferece carona.

- Não, que isso, não precisa, pego um táxi – respondo, apenas fazendo um charme, porque, obviamente, ele não deixaria e bem ou mal seria uma enorme falta de educação a recusa.

- Deixa de bobeira, claro que te deixo lá – com a mão nas minhas costas praticamente me direcionando para entrar no veículo que o manobrista havia deixado à nossa frente. Rendo-me e dou a volta para entrar no banco do carona do carro esporte cinza, dando mais um tchau para Bianca e Murilo. Assim que ele fecha a porta, faz-se um silêncio gostoso. Nós apenas. Solto o que permanecera preso na minha garganta o jantar inteiro:

- Agora que estamos nós dois sozinhos aqui, me diga, por que você fez isso?

- Isso o quê? – responde espantado e se ajeitando no banco.

- Não se faça de bobo, Marcelo. Primeiro eu achei ridículo, fiquei bastante assustada, te achei até meio psicopata, mas, vai, agora já estou achando até engraçado. Não precisa mais incorporar o personagem – respondo num tom bem leve, quase sorrindo. Ele liga o carro, acelera e responde:

- Juro, Amanda, não continue com isso. Sinceramente não sei do que você está falando. De fato, você me confundiu com alguém.

Eu fico sem reação e não falo mais nada. Tinha certeza absoluta que aqui, nós dois, ele confessaria a trama toda, iríamos rir e, enfim... Mas não!

Ele vira na rua que indico e depois, com minha sinalização, para o carro em frente à garagem do meu prédio. Marcelo tira o cinto, vira o corpo na minha direção, apoia o cotovelo no volante e fica a me olhar, deixando escapulir um sorriso lindamente safado. Havia sido ele o tempo todo! Eu sei!

- Você fez tudo isso por um beijo? Inventou essa história toda para conseguir um beijo meu? Pois bem, se é isso que você tanto quer... – com a coragem que o álcool havia me presenteado, coloco a mão direita em seu peito, a esquerda no seu rosto e ponho fim aquele pequeno espaço que nos separava do beijo. Ele esperava exatamente que eu fizesse isso. Assim que nossos lábios se tocam, enlaça-me pela cintura, desliza seus dedos por entre meu cabelo até encontrar a nuca e me puxar para si. Nosso beijo é algo desesperado, as línguas empenhadas, permutadas, ávidas, fricção molhada. Por entre as brechas do beijo, nas tantas viradas que as cabeças fazem, ouvem-se suspiros. As bocas aceleradas, os corpos ofegantes, e ele com a mão quente no meu rosto, que cai pro pescoço, que pende para a barriga, que de repente está na minha perna e fingindo ser sem querer, vem onde ainda não pode, para automaticamente levar um tapa carinhoso (na mão) como lição e voltar para um local mais adequado. O beijo é maravilhoso, a química perfeita. Minha vontade é de deixá-lo colocar a mão onde quisesse e fazer com ele sem limites ali mesmo, no carro, na frente do meu prédio. Mas também tenho um pouco de machismo dentro de mim, o mesmo que há pouco eu reclamara: ainda não é a hora. Interrompo o beijo, antes que meu corpo somado ao álcool vencesse as travas e o parabenizo:

- Você conseguiu. Estava certo, hoje foi nosso primeiro beijo, homem do futuro.

- Homem do futuro? Acho que você bebeu demais, Amanda.

Eu tive que rir antes de responder.

- Você não vai mesmo parar com essa brincadeira?

- Que brincadeira?

- Tudo bem, vamos jogar – dou um último beijo nele, de boca fechada e me viro para abrir a porta.

- Você não vai me dar seu telefone? Quero te ver de novo, ser o homem do seu futuro.

Como ele sabe ser sutilmente sarcástico! Não insisto na resposta, sei que ele diria que foi uma brincadeira com o que eu disse anteriormente. Dito meu telefone, mesmo sabendo que ele já o tinha. Damos mais um beijo rápido e abro a porta do carro.

Marcelo bem educado aguarda o porteiro abrir o portão do prédio para só assim acelerar com o carro. Cumprimento-o, entro no elevador e me encarando no espelho, enquanto subo. Que noite louca! E o pior, com essa história toda ele conseguiu dramatizar nosso encontro, mexeu comigo, com o romantismo que estava escondido em mim há tempos, desde que terminei meu último namoro. "Namorado do futuro" relembro as palavras e rio. Quando ele vai parar com isso? Abro a porta de casa, tiro o salto e vou até a cozinha beber um pouco de água, o beijo havia me deixado com sede. Caminho até o banheiro e quando começo a desabotoar as costas do vestido, o interfone toca. Quem poderá ser a essa hora?

O Homem do Futuro do PresenteOnde histórias criam vida. Descubra agora