Capítulo 2 - Ela se envolverá com Ele (part.3)

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O jogo retorna no meio de campo com a saída do América e os vinte minutos seguintes são mornos, um jogo truncado, sem nenhum dos times com muita inspiração para as jogadas. O volante do Vasco comete uma falta violenta, é punido com o cartão amarelo e o carrinho de atendimento médico entra em campo. Enquanto o jogo fica parado, Marcelo vem e me beija, demoradamente, íntimo. Quando interrompemos o beijo e abrimos os olhos, o atacante do América chutava uma bola rente a trave. Eu quase havia perdido o grande momento em que a máscara do Marcelo cairia. Foi por pouco! O Vasco tem dificuldade de penetrar na defesa do América e aquela sensação que o jogo seria uma goleada se mostrou equivocada. Eu já estou preocupada, quarenta minutos e apenas 1x0. Um gol do Vasco no segundo tempo e Marcelo acertaria o placar.

- O América está melhor no jogo, hein. Daqui a pouco empatamos. Você vai ver.

- Que nada, o Vasco tem o jogo sob controle.

- Você está vendo como estou me comportando?

- Impressionante sua calma e discrição, estou orgulhosa.

O juiz apita o final do primeiro tempo. Nós sentamos e Marcelo chama um ambulante para comprar biscoito e um guaraná. Ele me pergunta se eu quero algo e peço uma água. O vendedor entrega os produtos e enquanto abre o guaraná, Marcelo sentencia:

- Ainda vamos empatar e virar esse jogo, estou sentindo.

Ele deixa a bebida apoiada entre as pernas e passa o braço no meu ombro, me acolhendo, enquanto com a outra mão come o biscoito, que se esfarela em sua camisa e bermuda. Estamos nos conhecendo melhor, mas a companhia dele já me deixa tão à vontade, tão confortável que me causa estranheza. Nunca fui de envolver-me facilmente, minhas amigas me apelidam de coração de gelo por eu ser tão racional, mas há alguma coisa nele que me cativa de uma forma diferente, que mexe com meu emocional, o meu imaginário. Talvez seja a fantasia do namorado do futuro, talvez seja apenas mesmo a boa química das peles, a harmonia entre nossas personalidades. De repente, ainda abraçada com ele, distraída, meu celular vibra, me remexo um pouco o que faz com que ele tire o braço do meu ombro. Pego o aparelho no bolso e vejo a mensagem:

"Tudo correndo bem. No segundo tempo, o Vasco ampliará e dará números finais à partida. Beijos, do seu amor do futuro."

Como é possível? Quem mandou essa mensagem, se ele estava comigo o tempo todo?

- O que houve?

- Nada... – respondo efusivamente, que até parece que estou escondendo algo. Estou intrigada e agora torcendo ainda mais para um resultado diferente de 2x0. O jogo recomeça e eu nutro a esperança de que o Vasco comece pressionando, faça mais um, assim como no primeiro, para ter o segundo tempo inteiro para marcar o terceiro. Uma parte de mim, contudo, teme esse gol. Se o Vasco fizer o segundo e resolver administrar o resultado, Marcelo acertará o seu palpite e continuarei sendo a idiota que cogita viagens no tempo. Talvez eu fosse gostar mais de um gol do América, que já resolveria tudo, do que um do Vasco. Infelizmente, nem o Vasco faz o gol rapidamente, nem o América o seu, e o jogo se arrasta até a metade da segunda etapa com poucas chances para cada lado.

- Pelo jeito que está, vai acabar 1x0 mesmo, o América não ataca – ele diz.

- Pois é, está com cara que vai ficar nisso.

- Que nervoso ficar aqui quietinho, queria estar xingando esses desgraçados. Eles estão perdendo o jogo, mas continuam com essa apatia.

- Mantenha-se quietinho para não termos confusão.

- Não se preocupe, vou preservar minha postura de lorde inglês.

O jogo estava dando sono, mas aos trinta minutos, a torcida acorda: o meia vascaíno recebe uma entrada por trás de carrinho, na entrada da área. O juiz apita a infração e a torcida se agita, grita em unanimidade o nome do atacante, exímio cobrador de faltas. Com as palmas e tambores a torcida faz o som típico de suspense. O jogador ajeita a bola com carinho de mãe, dá cinco passos pra trás, se posiciona,aguarda o apito do juiz com as mãos na cintura, corre para bola e com um toque lindo, dando curva na bola, coloca-a na gaveta, lá onde a coruja dorme. A torcida vibra, grita, mas eu, dessa vez, sou bem contida, apenas assinalo: "Gol"! 

O Homem do Futuro do PresenteOnde histórias criam vida. Descubra agora