Como quase toda sexta-feira, o pessoal da minha área sugere um chope. Acabo indo, mesmo não estando animada. Não que eles não fossem legais, mas já estou enjoada de ver a cara deles a semana inteira (eu quero o rosto de Marcelo), e pior, o Vítor bebe e rapidamente começa a se engraçar pra cima de mim. Hoje, não é diferente.
- E aí, Amanda. Quando vamos marcar de fazer uma noitadinha juntos?
- Não sei, Vítor, não estou muito de noitada, no momento, não.
- Vai ter uma festa super maneira amanhã, só com gente bonita, num casarão em Santa Tereza, não pilha? Uma amiga que ia de VIP desistiu, porque vai viajar e estou com ingresso sobrando.
Mentira dele! Se eu aceitasse, do jeito que é cismado comigo, capaz que comprasse disfarçadamente no celular no exato momento o tal "ingresso sobrando".
- Amanhã não vai dar, Vítor, tenho um aniversário – minto instantaneamente, para só depois lembrar que eu realmente tinha um compromisso no sábado: o jantar de aniversário de oitenta anos da minha vó. Não posso deixar de ir.
Enquanto as pessoas conversam animadas, cada vez mais, na proporção que desciam os chopes dos barris, permaneço sucinta, interagindo mais com o celular do que com eles.
Sexta-feira à noite e ainda nenhuma mensagem dele: nem do Marcelo do Presente, nem do Futuro. Tudo bem que o do futuro havia me buscado de manhãzinha na quarta, sido super romântico, me encontrado no treino ontem, mas o do presente sequer me mandou um oi depois do jogo, desapareceu. Não consigo esconder para mim mesma, embora me esforce, que tenho muita vontade de vê-lo novamente, aquele homem cheio de desejo e gracinhas. Meu deus do céu, Amanda! Você está parecendo a Bianca, idealizando um relacionamento! Isso, cospe que cai na cara! Esqueça! Normal, saímos pela primeira vez e hoje ou amanhã ele deve ligar para fazermos alguma coisa, tranquilo, sem stress, sem pressão. Passam mais vinte minutos, eu invento uma mentira sobre um compromisso qualquer, deixo em dinheiro a parte que consumi, levanto e pego um uber para casa. Abro a porta e minha mãe me recebe com uma boa noite.
- Boa noite, mãe.
- Vai sair hoje, filha?
- Acho que não...
- Eu vou começar um filme aqui. Não quer ver comigo?
- Qual?
- Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças, com o Jim Carey e a Kate Winslet. Você que me falou que eu devia assistir.
- Amo esse filme. Vejo de novo com certeza. Vou tomar um banho e sento com você ai já.
Tomo uma ducha de quinze minutos, coloco o meu lindo brega largo pijama rosa e sento no sofá para assistir ao filme. Realmente não é um dos melhores programas para sexta-feira à noite, mas, resolvo fazer um agrado para a mamãezinha. Hoje, pelo jeito, seria o primeiro dia da semana que eu não iria encontrar com um dos Marcelos. Confesso que, se o telefone tocar e ele me chamar, levanto sem hesitação e deixo minha mãe sozinha. Mentira! Pare com isso, Amanda. Isso são horas de aceitar convites? Comigo tem que marcar desde cedo! Não sou de última hora. Ficarei aqui quietinha e comportada assistindo ao filme. Ou não...
O filme começa a se desenrolar e Dona Maria Cláudia, sempre muito falante, faz perguntas na tentativa de se esclarecer dos acontecidos. Pacientemente, explico. O filme me faz pensar, da mesma maneira de quando o vi pela primeira vez, sobre a questão de como é empolgante se apaixonar. Quem vence a disputa entre paixão e amor? Paixão aquela coisa intensa, que esmaga, que arranca sorrisos, lágrimas, olhares tagarelas, suspiros agudos, gemidos com unhas, hoje sim e daqui a pouco também, misteriosa, estressante, instigante, irresponsável, enlouquecedora, finita. Amor, por sua vez, sereno, tranquilo, confortante, responsável, carinhoso, intimidade, rotina, cumplicidade, arrotos, sem novidades, mesa de jantar silenciosa, só de vez em quando, hoje não e mais tarde também não vai rolar, completude, um sentido pra vida, quem sabe eterno. Não existe resposta para a pergunta. Bem-aventurados aqueles que conseguem vencer o paradoxo das excludentes e viver um amor apaixonado para sempre. Não acredito que seja o meu caso. Em todos os meus relacionamentos sérios, a coisa começava bem, mas enjoava do dia-a-dia, sentia falta de não saber o que vai acontecer na noite seguinte, da ausência de olhares gulosos, de ser surpreendida... Enfim, enjoava deles, murchava por completo, e racionalmente terminava. Eles arrasados, eu, livre para viver uma nova paixão. Não, não vivo uma paixão por noite, muito embora algumas muitas amigas minha assim façam - e não as reprovo - eu gosto de me envolver, de ser realmente conquistada, de jogar o jogo da sedução. E óbvio, o que o Sr. Marcelo, namorado do futuro está fazendo é exatamente isso, brinca com meu coração ávido por paixão, me afoga no misterioso, planta a semente da possibilidade do impossível, me faz viver o imaginário. Enquanto caminho pela minha mente com tais devaneios, Joel, o personagem de Jim Carey, corre pela tela atrás de um lugar seguro para guardar as memórias de Clementine, Kate Winslet. Nesse instante, meu celular vibra e rapidamente abro a mensagem que havia chegado. Será que ele iria me chamar pra sair a essa hora? Onze e meia da noite! Cara de pau!
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O Homem do Futuro do Presente
Chick-LitUm homem desconhecido surge repentinamente e afirma que voltou no tempo para reencontrar Amanda exatamente no dia em que se conhecem. No futuro, eles foram namorados, mas algo irá separá-los. Ao mesmo tempo em que se envolve com Marcelo do Futuro...