- Você quer olhar o cardápio ou está esperando alguém? – pergunta o garçom, cortando meus pensamentos, que sequer lembro mais quais eram.
Na verdade, não sei se ele me chamou de "você" ou "senhora". Minha cabeça possui um filtro que retém qualquer coisa que remeta à minha idade avançada de quase trinta anos, portanto, por "você" foi escutado. Respondo que sim, estou esperando uma pessoa, mas que já queria olhar o cardápio. O garçom entrega o menu aberto na seção das entradas, agradeço e passo o olho, sem ler. Por que a Bianca está sempre atrasada? Nunca conheci pessoa tão enrolada! E o pior, foi ela quem fez questão do jantar, em plena segunda-feira. Segundo o seu convite ao telefone, precisava muito desabafar, pareceria algo grave para quem não a conhecesse. Mas, com certeza, o papo é relacionado aos seus problemas amorosos, algum homem deve ter a sacaneado, e, ela, ainda não sabendo lidar muito bem com a modernidade da sexualidade feminina se decepcionou duramente. Enfim, mais uma vez eu seria o ombro amigo, daria os mesmos conselhos para que não criasse expectativa, para que não se envolvesse tanto, que não idealizasse, mas, acostumada que estou, sei que não seria muito bem compreendida. Como sempre minhas palavras iriam entrar por um ouvido e fugir pelo outro, no túnel direto que existe entre eles, feito especialmente para os meus conselhos. Existem mulheres que têm sina para envolvimentos tortuosos, não sei se somente por sua própria postura frágil e insegura, ou mesmo por uma questão genética, social, sei lá, atração física e imediata por homens cafajestes. Bom, estou morrendo de fome, o que posso beliscar? Peço uma porção variada de brusquetas e uma água.
- Sim, Senhora.
É, ele falou Senhora. Fecho o cardápio e o devolvo para o grosso garçom educado. Meu celular vibra: é Bianca pedindo desculpa por mensagem pelo atraso, mas que está chegando ao restaurante em cinco minutos. Gerúndio e os famosos cinco minutinhos, aqueles que podem exprimir dez, quinze, vinte minutos, mas nunca exatamente os cinco prometidos. Fico impaciente. Bianca vai demorar. Chamo o garçom novamente, cancelo a água e pergunto sobre opções de bebidas alcoólicas e de forma quase aleatória escolho o Kir Royal. Sinto uma sensação estranha logo em seguida.
Quando abaixo o cardápio da minha visão, surge um homem, sentado bem na minha mesa na cadeira à frente, que me cumprimenta pelo nome:
- Olá, Amanda.
Ele é jovem, talvez a minha idade, de cabelos levemente cacheados, veste uma camisa social verde de tecido leve, marcada por pequenas listras brancas verticais, com as mangas compridas, mas que estão dobradas até um pouco abaixo do cotovelo e usa um relógio analógico bonito, mas discreto, cuja pulseira é feita de couro. Ele me encara com os olhos castanhos, confiantes e um sorriso pedante, mas, ao mesmo tempo, charmoso. Obviamente, não posso ser educada, nunca vi esse homem em toda a minha vida. Tenho uma memória visual muito boa, se observo com atenção um rosto não o perco jamais. Posso esquecer-me de um nome, de uma voz, mas nunca de um rosto. Por isso, atesto com segurança, este rapaz é um completo estranho para mim. Contudo, ele olha como se efetivamente me conhecesse e, pior, havia me chamado pelo nome...
- Desculpe-me, eu te conheço?
- Não, não conhece. Em breve você irá, mas não, ainda não me conhece - responde ainda com um sorriso seguro nos lábios.
- Mas você sabe quem sou? Como sabe meu nome?
- Amanda, 28 anos, jornalista, filha de Maria Cláudia e Eduardo, separados desde quando você tinha 13.
- Você é algum tipo de lunático das redes sociais? Está me perseguindo? – respondo assustada e já irritada. Que tipo de homem é esse que sai sentando numa mesa de uma pessoa que não o conhece e sem ser convidado? E como ele sabe todas essas informações sobre mim? Nome, idade e profissão ele pode ter descoberto pelas redes sociais, mas eu nunca coloquei na internet nada sobre a separação dos meus pais, algo doído para mim na época.
- Não sou nenhum tipo de maluco. Mas é muito complexa a história de como eu te conheço. Você não vai acreditar de primeira, sem dúvida.
- Pois estou curiosa, conte-me, de onde nos conhecemos? – indago, sendo agora a minha vez de assumir um tom desafiador.
- Nós somos namorados – responde com uma espantosa calma e seriedade.
Meu corpo quer dar sinais de desconserto, levo os braços que descansavam na mesa ao cabelo e forço um sorriso sarcástico, de desprezo, ridicularizando a absurda resposta que havia recebido.
- Isso é algum tipo de piada? Por que se for eu não estou achando nenhuma graça.
- Eu falei que seria difícil de entender no começo – reforça, inabalável.
- Bom, sinto muito lhe informar que não, não sou sua namorada. Estou esperando uma amiga e ela está chegando em cinco minutos, então, por favor, se puder me dar licença, essa brincadeira não teve graça.
- Nós namoramos por 01 ano – insiste.
- Há 01 ano eu estava de férias com minha mãe pela Europa.
- Bom, o uso do tempo verbal nessa nossa situação é uma questão um pouco difícil. Talvez eu devesse dizer que você será minha namorada muito em breve.
- Você é completamente louco – respondo sem paciência já olhando para o garçom. Se ele não sair logo, o restaurante presenciará uma cena constrangedora.
- Saudade de você desse jeito, tão absurdamente charmosa quando fica brava – admirou-me com um olhar que parecia mesmo de alguém com saudade e apaixonado, o que me dá calafrios. Há um psicopata sentado na minha frente e conversando comigo! A coisa, contudo, piora bastante:
- Eu sou do futuro, Amanda – anuncia serenamente.
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O Homem do Futuro do Presente
Chick-LitUm homem desconhecido surge repentinamente e afirma que voltou no tempo para reencontrar Amanda exatamente no dia em que se conhecem. No futuro, eles foram namorados, mas algo irá separá-los. Ao mesmo tempo em que se envolve com Marcelo do Futuro...