PRÓLOGO

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O vestido estendido sobre a cama de meus pais sinaliza que a grande hora está chegando. Encaro meu reflexo no espelho pela última vez antes de me vestir. Espero meu pai dar três batidas na porta, abrindo em seguida para enfim encher os olhos com lágrimas e abrir um sorriso carinhoso, provavelmente segurando para não cair em prantos na minha frente.

- Está pronta? - ele pergunta enquanto abotoa os dois únicos botões do smoking.

- Sim. - Paul Lessing entrega o buquê em minhas mãos.

- Nervosa?

- Um pouco. - sorrio. - Mas acho que é normal.

- Não nos casamos mais de uma vez por um motivo. - reviro os olhos.

- Pai...

- É sério!

- Não venha com isso. Não é porque seu casamento não deu certo que não pode se casar novamente.

- Seria audacioso demais ter mais uma Anne Lessing na minha vida.

- Vocês só não foram feitos um para o outro. - meu pai se aproxima, segurando em minha mão livre do buquê.

- E você acha que foi feita para o Henry?

- Tenho certeza que sim. - devolvo um sorriso.

- Ainda dá tempo de desistir se quiser...

- Pai! - o homem mais velho me abraça. Posso ouvir um soluço. - Ei, está tudo bem.

Retribuo o abraço do homem que me criou até meus vinte e quatro anos mesmo divorcidado por dez de minha mãe. A barba feita dá outra visão para o semblante preocupado do melhor pai do mundo, que sempre esteve presente e jamais me abandonou mesmo morando em casas diferentes.

- Nós precisamos ir agora, o motorista já está esperando e fumou um total de três cigarros nos quinze minutos que está lá embaixo. - minha irmã entra no quarto, trajando seu vestido rosé de madrinha, com rendas por toda a extensão.

- Julie, olha bem para sua irmã. - meu pai me faz dar uma volta, fazendo a saia do vestido branco com minúsculos detalhes dourados balançar. - Ela não está linda?

- Você está incrível de linda, irmã. - manda um beijo no ar para mim. - Mas se quer mesmo fazer isso precisamos ir, será que...

- Já estamos indo, Julie. - dou uma última olhada antes de descer as escadas para o primeiro andar onde minha mãe estava sentada na sala de estar com um copo de whisky pela metade nas mãos, as pernas cruzadas, exalando elegância.

- Uau! Você está incrível, filha. - deixa o copo na mesa de centro, vindo em minha direção. O cheiro da bebida chegando antes que ela.

- Foi o que eu disse. - Paul responde em meu lugar.

Minha mãe oferece seu sorriso cínico para meu pai antes de todos se dirigirem para o carro estacionado na frente de minha antiga casa. A mulher segura em meu braço direito antes de chegar à porta do automóvel.

- Ele precisa mesmo ir no mesmo carro que nós?

- Sim, ele precisa. Afinal, vai entrar comigo na igreja, preciso dele ao meu lado.

- Mas...

- Por favor, mãe. Apenas hoje não estrague tudo com sua impaciência e implicância com meu pai.

- Você sabe muito bem que ele quem começa.

- Irei me casar hoje, preciso de paz. Estamos indo para uma igreja!

- Os pais de Henry são tão exigentes. Qual o problema de se casar em um clube?

- Vamos logo, estamos atrasadas! - Julie grita da janela.

O caminho até a igreja foi um misto de perfume masculino, rosas e cigarro com meus pais discutindo como música de fundo. A felicidade que habitava em mim apenas fazia com que eu tentasse esquecer toda a confusão que estava se criando enquanto permanecia naquele carro. Felizmente não demorou muito até enxergar a porta com um pequeno aglomerado de pessoas. Todas as minhas madrinhas com seus vestidos formais e seus buquês em mãos.

Desço do conversível com a ajuda de Julie e meu pai, recebendo os olhares curiosos de todos ali presentes.

O alvoroço só piorou quando a porta da igreja se abriu, revelando a plateia de convidados e meu noivo que parecia estar tão distante no altar à um tapete vermelho de distância, com seu smoking perfeitamente alinhado assim como seu sorriso e cabelo.

Minhas madrinhas foram primeiro, entrando com seus pares. Alguns amigos de Henry, alguns nossos amigos. Sobrou para minha irmã aturar o que mais odeio: Jefferson Brown.

O mais ridículo e egocêntrico dos amigos de Henry. O descontentamento de Julie por entrar com esse cara é gritante.

Pobre Julie.

Ignorei a situação já que Julie me esperava no altar junto de Henry que sorria mais a cada centímetro que me aproximava. O braço de meu pai era massacrado por meus dedos.

- Você está perfeita. - recebo o beijo no topo de minha cabeça de Henry enquanto meu pai e meu futuro marido se cumprimentam.

- Ainda dá tempo de desistir. - meu pai sussurra antes de se afastar.

Subi o altar com o pé direito e aqueles saltos me deixavam totalmente desconcertada.

- Estamos aqui reunidos para a celebração do amor entre esses dois jovens. - o padre aponta para nós.

Confesso que não ouvi muita coisa após isso. Apenas prestei atenção em como Henry estava bonito e não aparentava nervosismo algum enquanto de dois em dois segundos podia sentir que iria desmaiar.

- Portanto, perante estas pessoas, Henry repita comigo. - o reverendo chama a atenção de meu noivo e o encara. - Preciso que olhe para ela.

O olhos cor de mel me fitam por completo, parando nos meus olhos.

- Prometo em vida amá-la e respeitá-la... - Henry repetia as palavras do sacerdote. - Na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, até que a morte nos separe. - o singelo anel desliza sobre meu anelar esquerdo, recebendo um beijo em seguida.

- Sua vez. - Henry diz, sorrindo.

- Prometo em vida amá-lo e respeitá-lo, na saúde e na doença, na riqueza e na pobreza, até que a morte nos separe. - a aliança quase cai de minha mão por conta da transpiração, mas consigo colocar no anelar de Henry antes de sentir que irei desmaiar novamente.

- Dito isso, - o padre segura nossas mãos esquerdas, colocando uma sobre a outra. Posso sentir o flash da câmera fotográfica me cegar por um momento. - eu vos declaro marido e mulher. Pode beijar a noiva.

- Até que enfim! - Henry diz antes de me surpreender com um beijo afoito demais para uma cerimônia de casamento. Retribuo da melhor maneira possível.

Me viro para encarar todas as pessoas que aplaudiam e sorriam para nós, meu pai chorando e minha mãe revirando os olhos para sua cena.

Podia sentir meu estômago revirar mais uma vez com a certeza de que talvez não esteja tão certa do que acabei de fazer como pensava que estivesse.

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