Os músculos dos meus ombros protestam quando tento me mover da cama. É uma nova semana e eu preciso trabalhar. Como todos os dias, Henry não está do meu lado e por um momento sinto alívio por não ter que lidar com seu humor azedo durante as primeiras horas do dia. Sei que ele não tem culpa por estar tão ocupado, mas não é como se eu não agradecesse por isso o tempo inteiro.
Algo em meu marido sempre me deixou intrigada. Não que seja grandioso ou espetacular, mas Henry jamais perguntou como me sentia. Me dei conta disso ontem quando claramente pude perceber no quanto meu corpo estava tenso enquanto suas mãos corriam pelo meu corpo. Seu narcisismo era tão grande que talvez ele tenha se esquecido que vive em uma sociedade.
Não muito bem, estou me arrastando para fora da cama com meus ombros doloridos e tensos.
Sigo toda a rotina da manhã seguindo a fio toda a programação. Me recuso a olhar para o lado quando atravesso minha sala de estar em menos de dez passos largos, para sequer cogitar a hipótese de olhar para a casa de Aimée bem ali.
Resisto até que encontro Joe se deleitando de um facho de luz solar que toma conta de um terço da sacada. Me despeço, levantando apenas o meu olhar e sentir meu coração levemente acelerado.
Nada havia mudado desde ontem.
Acaricio as orelhas do meu cachorro que permanece deitado, vivendo sua vida simples e perfeita.
As chaves quase escorregam da minha mão quando sinto a presença de Aimée ali. Poderia ter certeza que ela estaria bem atrás de mim.
- Bom dia. - ela é a primeira a falar.
- Oi, bom dia. - respondo, brincando com minhas chaves.
- Você... Thomas disse que você é arquiteta.
- Thomas está certo.
- Bem, você viu o meu apartamento. Ele não é tão agradável de se viver, digamos assim.
Ela está agindo como se horas atrás eu não estivesse jogada em seu sofá? Sim, ela está. Não conheço essa mulher como as palmas de minhas mãos, mas percebo o quanto ela é meticulosamente calculista.
- Antes de você, viviam dois senhores asiáticos lá. - sorrio.
Ela não sorri de volta.
- Tem algo que você possa fazer para nos ajudar? - brinca um pouco com as mangas de sua jaqueta vermelha, ela não parece se vestir formalmente para nada. Nem mesmo pra trabalhar.
- O que quer dizer?
- Quero dizer que... preciso de uma reforma. - ela reflete. - É, isso.
- Você precisa de uma reforma?
- É o que estou dizendo.
- E quer que eu faça?
- Isso. - ela esconde suas mãos no bolso. - Você consegue fazer isso, certo? - aperta os olhos, franzindo levemente a sobrancelha. Mas não é como se eu não percebesse.
- Sim, eu consigo.
- Bom. - ela encara os dois lados do corredor.
- Você veio até aqui só para isso?
- Sim, você pensou que vim para algo mais?
- Eu?! Não, na verdade estou surpresa que esteja aqui.
- Isso surpreendeu você? - seu sorriso apareceu levemente. Não o bastante para que eu veja seus dentes, mas o suficiente para ser perceptível.
- Um pouco.
- Quanto custará?
- O que?
- A reforma.
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02:09
Romance"Confiro mais uma vez o jantar pronto e servido sobre a mesa. A superfície de vidro embaçado pelo calor emitido por algumas travessas. Encaro o relógio prometendo pela sétima vez que é a última que o encaro. Já se passa das duas e ele ainda não cheg...