Capítulo 10 - Não resisto a você

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Meu primeiro dia de trabalho na UTI Coronária e com estreia no plantão do doutor Felipe. Nós vamos nos encontrar quase sempre e de acordo com a escala médica. O hospital teria vários outros cardiologistas, ainda assim Felipe atendia de dois a três dias por semana.

Porém, o médico me fez um pedido, até que ele conseguisse toda a papelada de seu divórcio com Adriane, nós não poderíamos sermos vistos juntos. A ex-mulher é advogada sendo muito boa no que faz e qualquer coisa contra ele iria favorecê-la no processo.

E eu também fiz um pedido, já que nossos encontros seriam as escondidas, para matarmos nosso desejo caso ele surgisse no momento do trabalho, nos encontraríamos somente no estacionamento do hospital e de preferência em meu horário de intervalo, respeitando os pacientes que dependiam da nossa assistência.

Felipe chegou com seu sorriso maravilhoso, um olhar encarado para mim e cumprimentou toda a equipe antes de ir avaliar os pacientes de seu turno.

Eu continuei a ler algumas normas do setor enquanto o técnico de enfermagem, Matheus, ruivo e de sexualidade assumida, o que não o impedia de ser um bom profissional, me explicava o fluxo de trabalho.

- O que aconteceu com o doutor para estar de tão bom humor - Matheus estranhou o comportamento do médico.

Eu dei um sorriso disfarçado e esperei pelas aulas do técnico com quase uns dez anos de enfermagem, um desafio para mim, pois teria que chefiá-los mesmo não tendo nenhuma experiência como recém-formada. No entanto, não poderia deixar transparecer que estava ainda insegura e que precisava aprender na prática do dia a dia.

Felipe me chamou na mesa dele e me mostrou uma prancheta que estava em suas mãos. Ele deu um cheiro em direção ao meu pescoço e disfarçando eu olhei na direção dos técnicos e depois para o médico, com uma expressão no rosto de desaprovação.

Por cima das prescrições médicas dos vinte pacientes que cuidamos naquela noite, o doutor me mostrou um papel com o pedido do divórcio.

- Que bom, doutor! - eu lhe respondi sorrindo.

Depois de um tempo, ficamos sozinhos na sala e eu me afastei de Felipe evitando falácias da enfermagem, ainda mais com o histórico do médico e ele riu da situação.

Mesmo com muitos pacientes o trabalho no plantão da noite era tranquilo. Seria preciso somente monitorar e medicar os pacientes e alguns deles já se encontravam sedados. Eles eram encaminhados estabilizados do Pronto-socorro e a correria seria se acaso algum deles se desestabilizasse ou evoluísse para uma parada cardiorrespiratória.

A necessidade de cuidados e controles frequentes, geralmente presentes no caso de doentes criticamente enfermos, faz da UTI um local onde as atividades são contínuas durante as vinte e quatro horas do dia, acrescidas do som constante dos monitores e dos respiradores. Eu ouvia dizer e concordava, pois, pareciam uma sinfonia os sons daqueles aparelhos.

Na hora do meu intervalo, eu cheguei primeiro ao estacionamento. A madrugada estava um pouco fria.

Eu havia me esquecido dos funcionários fumantes que eu os observava mais além no mesmo local e com certeza veriam o doutor chegar no meu carro.

Eu mandei uma mensagem com apenas uma flor para Felipe, era o sinal de que eu estava a sua espera.

Quase no fim do meu horário de descanso, o doutor chegou pelo caminho contrário fazendo-me assustar pela surpresa.

- Oi meu amor - se não fosse seu abraço quente, teria lhe dado uns tapas.

Nós nos beijamos muito para aproveitar o pouco tempo juntos.

- Saudades de você - eu disse ao observá-lo sorrir.

- Eu estou sempre aqui para você e só me mandar uma florzinha - rimos da estratégia.

- Está certo. Mas, eu não queria mais me esconder - meu sorriso se desfez um pouco.

- Nós temos tempo - ele me beijou de novo.

Eu queria somente aproveitar meus poucos momentos íntimos com meu amor e outras questões sempre eram adiadas, inclusive eu queria perguntar ao médico da sua ex-mulher bruxa. Até mesmo ele estava saturado da resistência dela em não querer se divorciar dele e certa vez, a doutora chegou a jogar os papéis do divórcio no rosto do advogado. Ela com toda certeza não era uma boa pessoa e eu ainda subestimava a capacidade dela de destruir a felicidade dos outros pelos seus caprichos.

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Mais tarde daquela mesma noite, eu fui tomar um café na copa, pois meu sono me consumia e Elaine uma simpática técnica em enfermagem veio me fazer companhia.

- Ele é um gato, não é? - eu a olhei assustada - A doutora que não poderá ficar sabendo - ela dizia com um olhar desafiador.

- Então, do que você está falando? - disfarcei tentando não me mostrar constrangida.

- O estacionamento... - ela me olhou como quem diz: "não precisa dizer mais nada" - não se preocupe além de você ser minha chefe eu também sou novata aqui e eu preciso do meu emprego.

Eu sorri meio sem graça ao acompanhar a pequena mulher loura saindo da copa.

O doutor pelo jeito já era visado no hospital em relação aos seus casos extraconjugais e me bateu uma certa insegurança da nossa relação.

A minha cabeça se encheu de pensamentos me comparando com os outros casos de Felipe. Seria eu só mais uma? Aquele documento de divórcio, ele o levaria mesmo ao seu advogado? Sentia uma fincada profunda no peito.

No final do plantão noturno, eu me sentia exausta depois do atendimento de emergência que tivemos ao amanhecer. Não procurei por Felipe na sala dos médicos e fui embora sem me despedir.

Antes que eu adormecesse em minha cama, o médico me enviou uma mensagem dizendo que nos veríamos na parte da tarde depois que ele saísse da clínica e eu não o respondi permitindo que o sono tomasse o meu corpo.

🍁

Acordei depois do almoço com o som do interfone, Expectra acordou junto comigo já despreguiçando.

Felipe chegou com uma flor vermelha e linda ao lado de um copo gigante de café cremoso. Ele sabia que não era ainda o meu costume perder o sono da noite e deveria estar destruída.

- Você sabe mesmo agradar - eu o puxei para dentro do apartamento.

- Nossa! - ele exclamou ao encarar o meu shortinho de fanqueira.

- Não gostou? - eu lembrei-me das críticas de Eduardo as minhas roupas.

- Não, é que... Ficou muito gostosa - eu acho que corei as faces para ele mesmo depois das muitas intimidades entre nós.

- Não fazia ideia do quanto você é lerdo - eu bebi um pouco do café e já corri para os braços dele, não querendo desgrudar dele nem por um segundo.

Expectra entrou no meio de nós dois e ficou ronronado para chamar nossa atenção. Disse a ela que eu seria totalmente do médico naquela tarde e em resposta a gatinha pulou no colo de Felipe mostrando a sua preferência e que ela é quem seria acariciada. Rimos da ousadia demonstrada pela neguinha.

Felipe ligou para a clínica e desmarcou todos pacientes daquela tarde para ficar comigo. Catarina fez de desentendida, mas já imaginava aonde o médico estaria.

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