[868 palavras] capítulo revisado em 10 de setembro, 2020.
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O cheiro do álcool ainda está impregnado em meu vestido, me deixando sonolenta e meio grogue. Maven e eu comemoramos bebendo, o que foi uma grande novidade para mim. Durante alguns segundos, considerei me tornar parte deste mundo vazio e artificial, onde tudo é perfeito.
E eu sou.
Mesmo meio bêbada consigo enxergar que nem todos nós temos a escolha de beber por uma noite e esquecer de tudo, como fui obrigada muitas vezes a enxergar quando estivera na lama. Vejo isso nas minhas criadas de uniforme vermelho que me esperam no quarto. Sempre atentas, ensinadas que são ratos vermelhos e não merecem muito mais do que servir e viver abaixo daqueles com privilégios.
Assim que elas iniciam o trabalho de retirar meu vestido, eu as paro imediatamente segurando seus braços. Elas me olham assustadas mas logo vêem meu olhar terno através da postura meio bêbada.
─ Vocês podem ir dormir agora, devem descansar porque também são humanas. Se alguém as parar, digam que são ordens da rainha.
As duas se reverenciam com um sorriso de agradecimento no rosto e sinto que estou começando a fazer a coisa certa. Me deito sem nem me importar se estou com o vestido retirado pela metade ou não e se a coroa recai sobre o travesseiro, quero apenas fechar os meus olhos e sonhar como não faço há muito tempo.
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Levanto minutos antes de o sol nascer, preparo meu próprio banho e escolho o vestido leve de seda lilás. Não uso maquiagem, não me faz falta alguma.
Olho ao redor do quarto, quase como se dissesse adeus a ele. Acredito que eu e Maven compartilharemos os mesmos aposentos a partir de agora, é opcional. Elara e Tiberias, pais de Maven, não compartilhavam porque não se amavam. Coriane ainda era uma alma viva na mente do pai de Maven, que nem mesmo Elara pôde apagar.
Quando acabo de olhar o quarto luxuoso, meus olhos param no diário com a capa em tons de roxo que Julian me dera alguns dias atrás. Minha escrita nele não têm sido frequente, e penso que se escrevesse tudo o que penso nele, já estaria morta há tempos.
Ouço batidas na porta e logo as criadas entram, quietas e de cabeças baixas. Dou um sorriso por perceber que me lembro da noite anterior, talvez eu não esteja de fato me tornando uma prateada.
─ Percebi que nunca perguntei seus nomes.
Elas param imediatamente à minha frente, como se temessem que algum passo em falso e eu pudesse acabar com a vida das duas ali mesmo.
─ Arya e Annie, Majestade.
A mais baixa de cabelos curtos e negros responde pelas duas, se denominando Arya e respondendo pela amiga Annie. As duas são completamente diferentes, Arya é baixa e parece frágil e Annie é totalmente o oposto com seus cabelos ruivos com pontas cinzas.
─ Peço que não tenham medo de mim, garotas. Não vou lhe acertar um raio cada vez que errar uma reverência.
As duas sorriem mas ainda se mantém cabisbaixas e percebo o quanto é difícil quebrar regras mantidas por anos e com consequências severas.
─ Mas não tentem isso com outros nobres, eles são um pé no saco.─ Dou uma risada secreta e pela primeira vez as ouço rir.─ Vocês já podem ir, posso me virar de agora em diante.
Elas saem e me sinto aliviada com a leve mudança de que a igualdade começa aqui mesmo, só espero que meus atos de "heroína" não prejudique ninguém. Já tenho fantasmas demais atrás de mim.
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Andar pelos corredores tentando equilibrar uma coroa na cabeça ainda é estranho, mas logo me acostumo. Acabo de sair de uma aula com Julian, o qual parece estar recuperando a saúde depois de sair da prisão junto com Sara.
E novamente sinto mais um fardo sair de minhas costas, como se tudo estivesse no seu devido lugar. Sei que Ella e Tyton estão treinando neste fim de tarde, Maven provavelmente está em seu escritório resolvendo assuntos de Norta que, na verdade, era o que eu deveria estar fazendo também.
O ar que entra pelos meus pulmões me aliviam quando chego à uma espécie de sacada no final do corredor, que me dá uma bela visão da praça de César. Não me surpreende que ela já esteja limpa, tudo aqui é perfeito e eficiente mas ainda me incomoda.
Os outros países ainda ocupam boa parte da minha mente, não há mais opções e nem como voltar atrás. Uma vermelha já é rainha e nada disso é normal para ninguém. Me lembro de Julian dizendo que a classe dominada jamais poderia subir ao trono, poder demais nos deixaria cegos e malucos e nunca poderia discordar tanto. Nesses últimos meses, tive mais medo do trono do que qualquer um e a única coisa que confortava era Maven ou meus raios.
Contemplo o horizonte, o sol alaranjado se pondo lentamente em algum lugar que sou incapaz de compreender. Isso me faz lembrar da minha família, de quando vim parar em Archeon com a idéia de que jamais os veria de novo. Jamais pude estar mais errada, e sei o que fazer para trazê-los até aqui.
E Maven é a resposta.
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Kingdom of Storm
FanfictionMare Molly Barrow se via diante de duas opções: Se tornar uma rainha controlada por um rei cruel, cuja mente não se pode confiar e é traiçoeiro como a víbora da mãe. Ou ela poderia escolher o caminho da Guarda, onde certamente não teria voz alguma e...