"Ainda não, execute apenas a limpeza solicitada. Entendido? Você apenas cumpre ordens. Vamos, emita a nota fiscal referente ao lançamento do entulho para pagarmos em dois dias. Livre-se deste número!"
Foi com estas palavras que Hector R.F.C teve que conviver nas horas que se seguiram a limpeza solicitada pelos contratantes de turno que, por sinal, pagavam muito acima da média.
Livrou-se do chip comprometido – como lhe fora ordenado – e pouco depois havia um envelope branco embaixo da sua porta com o novo número. De certo fariam contato para remover mais entulho – pensou.
Ele não deveria pensar, apenas executar a limpeza. Todavia, é bem verdade, perguntou-se que diabos uma garota poderia representar de ameaça. Ele nunca sabia os motivos, apenas recebia a ligação, executava o serviço e emitia a nota fiscal.
"Pérola Negra – Serviço de limpeza, remoção e desentupimento: Eliminamos todo o tipo de praga para que possa dormir tranquilo!" – Leu no documento emitido no corpo de descrição do boleto. Dobrara-o e colocara dentro de um envelope que depositou – como lhe foi ordenado – dentro da própria caixa de correio. Até que o "carteiro certo" a apanhasse no outro dia, apenas aquele envelope laranja, e o dinheiro pingasse em sua conta horas depois.
Quando estava selando o envelope laranja, as dobradiças enferrujadas da porta reclamaram assim que o pequeno Nicolas entrou no quarto, choramingando com sua voz infantil:
— Papá, o Dudu e Mônica num qué dexá vê desenio!
O garotinho, quase cinco anos de idade, grudou no pescoço do pai que o içou metros acima para o seu próprio colo. Os olhos eram curiosos e grandes como os de um lémure, mas a voz era doce e melosa como o som de uma flauta.
— Que foi meu lindo. De novo seus irmãos estão aprontando contigo, é? Papai vai dar um jeito nesses malvados. Está bem?
Hector se levantou e deixou sobre a mesa aquilo que fatalmente atrairia a atenção do seu filho menor:
— Papá, cata pá mamã, é? – Indagou.
— Oh filhote – começou, compassivo – não é pra mamãe não, amor... essa não...
Houve um silencio momentâneo, dois filetes de lagrimas escorriam pelo rosto do garotinho pardo e se encontraram no chão. Hector respeitou. Ele próprio vivia como um luto tudo aquilo. Tudo começou a mudar quando Lorena tinha começado a seguir uma seita pacifista, um culto, ou seja lá o que aquilo pudesse ser. A princípio ele não ligara e acreditara que a razão baixaria no corpo da esposa antes da pomba gira. Mas pelo jeito, a segunda deve ter vindo a jato mesmo, pois um dia ela simplesmente enviou uma carta a ele pedindo para que cuidasse das crianças e que não voltaria a pisar os pés na casa, pois teria encontrado a iluminação e a solução para a paz final.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Watch-Pad: O reality show de papel
Ficción GeneralPara escapar da falência, a emissora (in)Certa decide lançar um reality show exótico que promete agitar o país. Participantes exóticas, uma mansão comprada a preço de banana, um farol que permite acessar a outra dimensão e um grupo de peças de um qu...