Eu já falei que sempre me arrependo do que faço? Pois é. Eu deveria ter colocado tudo para fora no mesmo instante em que me sentei naquele banco com o Leandro, porque depois daquelas palavras doces tudo ficou mais difícil. Leandro passou o tempo todo querendo me agradar. Sem dúvidas, ele já tinha desconfiado de tudo e resolveu me desencorajar. E conseguiu! O Leandro me conhecia demais. Ele sabia que eu ia temer estragar a sua aparente alegria. Meu coração era muito mole.
Já era quase noite quando chegamos em casa. Eu estava me sentindo empanturrada, depois de me entupir de batatinhas e refrigerante. Super saudável. Como eu previa, Leandro demorou muito ainda para ir embora. Como sempre, ele foi até a caixa de Correios, e trouxe algumas correspondências de lá. Eu estava escorada na porta da cozinha quando o vi entrar na sala e estranhei o fato de ele colocar um envelope azul em sua mochila.
- O que você está fazendo?
Ele se assustou ao ver me ali, a apenas alguns passos dele. Acho que ele pensou que estava sozinho no cômodo. Leandro ficou sem cor, mas se recuperou em apenas alguns segundos. Deus um sorriso forçado:
- Bom... estou meio sem jeito de falar.
- Pensei que eu era a única que escondia as coisas. - provoquei lembrando de nossa conversa naquela tarde. Agora ele estava escondendo, literalmente.
- Estou fazendo um curso online e... não quero que minha mãe saiba. Por isso dei o endereço daqui.
A história era sem pé e sem cabeça.
- Curso de quê?
- De desenho! - ele respondeu rápido demais como se estivesse querendo se sair.
- E porque tia Paty não pode saber que você faz um simples curso de desenho? - aquela história não estava merecendo crédito nenhum, embora ele gostasse um pouco de desenhar e fazia isso até razoavelmente bem.
- Ah, Júlia, deixa para lá! Dar preguiça de explicar. - Olhei desconfiada mas resolvi não perguntar mais nada, pois percebi que ele estava muito nervoso com o assunto.
Leandro ainda ficou para o jantar, o que não era mais novidade. Praticamente todos os dias ele jantava conosco como um membro da família. Eu comi um prato só com salada, o que deixou meus pais orgulhosos. Leandro baixou a cabeça e deu um risinho enquanto meus pais me elogiavam, sabendo o verdadeiro motivo por eu está comendo aquilo. Ele, porém, comia como se não houvesse o amanhã.
Quase uma hora depois, Leandro se preparou para ir e me pediu para acompanhá-lo até à porta. Notei que ele havia ficado com um semblante preocupado depois de eu tê-lo flagrado escondendo o envelope. Mas não fiz nenhuma pergunta, aquilo devia ser muito pessoal para tê-lo perturbado tanto.
- Eu gostei muito de hoje. - ele usou a frase clichê.
- Eu também gostei. - outra frase clichê.
Eu odiava aquilo, porque fazia parecer que nós éramos um casal apaixonado, que estava falando aqueles frases quando na verdade estava morrendo de vontade de declarar seus sentimentos. Eu não tinha nenhum sentimento para declarar. Aliás, o que eu queria declarar talvez viesse arrasá-lo.
- Não era para ser assim. - Leandro falou me tirando do meu devaneio.
- O quê?
- Se você tivesse me dito bem antes que gostava de mim, não teria se aproximado do Danilo.
Como ele sabia que eu gostava dele? Eu nunca havia assumido isso para ele.
- Como você sabe disso?
Ele olhou para mim assustado. Porque o Leandro hoje estava se assustando com tanta facilidade? Comecei a suspeitar que havia algo de que eu não sabia.
- Bom... Deu para perceber, né?
- Sério? E você só falou agora?
- Pára de complicar, Júlia! Porque você tem que questionar tudo o que eu digo? - sua voz soou um pouco ríspida e olhei para ele com a cara feia.
- Desculpa, desculpa, é que não estou muito bem.
Ele estava ótimo há algumas horas atrás. Mas vi que seria não prudente falar mais nada. Alguma coisa tinha deixado o Leandro alterado. Achei melhor entrar e deixá-lo antes que a situação piorasse. Ele percebeu a minha intenção.
- Por favor, não vá. Eu preciso de você. Desculpa por ser tão grosso.
Ele se aproximou como se fosse me abraçar, e eu me preparei para abracá-lo. Não fazia ideia do que ele estava passando, mas queria de alguma forma deixá-lo um pouco melhor. Não é assim que amigos fazem? Porém, quando percebi, o Leandro estava tentando... me beijar? No mesmo instante eu corri para dentro de casa e tranquei a porta!
....
No dia seguinte, uma coisa não saía da minha cabeça: o Leando tinha tentado me beijar. Seria o meu primeiro beijo! Passei vários minutos tremendo em meu quarto só de imaginar naquela hipótese. Com que cara eu iria olhar o Danilo e dizer para ele que o Leandro havia me beijado? Agora tudo estava claro como água: eu precisava me afastar do Leandro. Era inútil tentar ser amiga dele quando ele não me via apenas como isso. Eu só precisava de um bom motivo e pedi ajuda a Deus desesperadamente.
Mais tarde, eu estava embrulhando uns livros de uma senhora simpática quando ela indagou:
- Você é prima do Leandro, o que trabalha na loja ao lado?
- Sim. - respondi já incomodada, imaginando que a pergunta seguinte seria se nós éramos namorados. Mas o que veio a seguir foi totalmente diferente:
- Ele é um rapaz muito bom. Pena que não deu certo com a Natasha.
- Oi? - achei que eu não havia escutado direito.
- A minha sobrinha Natasha. É uma menina linda e muito boa. Eles namoraram por um pouco de tempo, mas não deu certo. Não sei porquê.
Por um momento, achei que o chão embaixo de mim tinha desabado. O Leandro havia namorado com a Natasha e eu não sabia? Por qual motivo ele havia escondido isso de mim? Mas agora eu tinha o motivo perfeito para dar um basta em suas investidas baratas.
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(Des)complicado Amor (LIVRO 2)
RomanceContinuação de "Complicado Amor" Júlia Beatriz fez uma promessa: ela esperaria por Danilo. Danilo, por sua vez, prometeu que iria voltar. Nenhum dos dois imaginou quanto tempo iria se passar até aquele reencontro acontecer. Leandro, porém, usa esse...