Camila
O treinamento começa dois dias depois, mas não da maneira que eu esperava. Não sei o que eu esperava, na verdade, mas com certeza não era isso.
— O que a gente está fazendo aqui? — pergunto quando paramos no estacionamento de uma academia de artes marciais a uma hora de Santa Fé.
— Krav maga — esclarece Shawn, e olho como se ele estivesse falando outra língua. Ele fecha a porta do carro e andamos até a fachada do prédio. — Não vou conseguir dedicar cem por cento do meu tempo ao seu treinamento. Por isso, três dias por semana, vou trazer você aqui. Dá para aprender muita coisa com o krav maga em pouco tempo. E o foco é a defesa pessoal...
— O quê? — Paro na calçada antes de passarmos pela porta. — Não sou uma donzela em perigo que acaba de ser assaltada em um estacionamento escuro, Shawn. Não preciso de aulas de defesa pessoal. Preciso aprender a matar.
— Matar é a parte fácil — rebate, sem rodeios. Ele abre a porta de vidro e faz um gesto para eu entrar. — Chegar a esse ponto sem morrer tentando é a parte difícil.
— Então você quer que eu aprenda a dar um chute no saco de um cara? — pergunto, bufando de desdém. — Acredite, eu já sou perfeitamente capaz disso.
Um sorriso discreto aparece nos cantos de seus lábios deliciosos.
Nesse momento, um sujeito alto, moreno e com músculos bem-definidos se aproxima de nós no grande salão. As janelas no alto da parede deixam o sol entrar. Dois grupos de pessoas estão treinando em pares, formando um semicírculo em um enorme tatame preto estendido por boa parte do chão.
O homem de braços musculosos e camiseta preta estende a mão para Shawn.
— Faz quanto tempo? Três anos? Quatro?
Shawn aperta a mão dele com firmeza.
— Uns quatro, acredito.
O homem me olha por um momento, e então Shawn nos apresenta.
— Spencer, esta é Karla. Karla, Spencer.
— Prazer — diz Spencer, estendendo a mão.
Relutante, aperto a mão dele. Eles se conhecem? Não sei se gosto disso ou não. De repente, sinto que aquilo é alguma armação. Sorrio com desdém para aquele brutamontes alto e simpático.
Shawn se vira para mim e diz:
— Não tem ninguém melhor para treinar você em defesa pessoal do que Spencer. Você está em boas mãos.
Spencer abre um sorriso tão largo que, se fosse um pouco maior, acho que daria para engolir minha cabeça. Ele está com os braços musculosos à sua frente, com as mãos cruzadas. As veias, grossas como cordas, que percorrem suas mãos e seus braços bem bronzeados me lembram das de um fisiculturista, mas ele não tem esse tamanho todo. Só é maior do que eu, o que me intimida mais.
Levanto um dedo para Spencer.
— Você nos dá licença um minutinho?
— Claro — responde ele.
Percebo o leve sorriso que ele dá para Shawn.
Pego Shawn pela mão e o puxo para o lado. Ao fundo, ouço, de maneira constante, corpos sendo jogados naquele tatame preto e a voz de um instrutor entoando comandos repetitivos e mandando os alunos fazerem "de novo".
— Shawn, acho que isto é perda de tempo. Não sei por que você me trouxe aqui. — Cruzo os braços. — Quero aprender essas coisas com você, não com um cara aleatório do tamanho de um ônibus. — Olho por cima do ombro, torcendo para que Spencer não tenha ouvido, embora eu tenha tomado o cuidado de sussurrar.