Shawn
No dia seguinte, chegamos a Nova Orleans, cujas ruas estão lotadas de gente. Milhares de pessoas de branco, usando lenços, bandanas, chapéus e cintos de um vermelho brilhante estão lá para participar do festival anual San Fermin en Nueva Orleans, também conhecido como "corrida de touros". Passamos pelo lado oposto da cidade, onde as ruas não foram fechadas para carros, desviando de muitas das típicas varandas enfeitadas com peças de ferro batido de estilo europeu e dos pátios, em busca do galpão onde Fredrik nos espera, bem longe das festividades.
Camila dormiu por três horas, desta vez no banco da frente, com a cabeça encostada na janela do passageiro. Agora ela está sentada, acordada, absorvendo a paisagem e massageando a parte de trás do pescoço com os dedos.
Na noite passada, contei a ela um pouco do motivo de estarmos indo para Nova Orleans. Omiti algumas coisas porque espero encontrar Fredrik antes para saber quais informações ele coletou sobre nosso alvo, André Costa, também conhecido como Tartaruga, o "bode expiatório" meio americano, meio brasileiro do famigerado chefe de uma quadrilha que opera na Venezuela. Procurei Costa por semanas, sobretudo no Rio de Janeiro, onde ele foi visto pela última vez. Mas ele muda de lugar rápido demais, apesar do apelido, e, pela primeira vez em muito tempo, estou tendo dificuldade para acompanhar um alvo.
Entramos no pátio do galpão abandonado e dirijo devagar para a lateral, onde Fredrik está nos esperando. Quando ele vê o carro, um grande portão de metal se ergue e nós entramos, estacionando na penumbra do prédio empoeirado. O lugar deve ter sido alguma espécie de oficina, a julgar pelo fosso para troca de óleo no chão de concreto, o elevador de veículos e outros equipamentos automotivos pesados que ficaram por lá. Há uma parede alta coberta inteiramente de prateleiras, nas quais alguns pneus velhos foram abandonados. Algumas janelas grandes no alto da parede do fundo, cobertas por uma camada espessa de poeira, deixam passar sol suficiente para iluminar o ambiente como a luz de um dia nublado.
Camila e eu fechamos as portas do carro, que ecoam pelo espaço vazio.
— Caramba, para que esse lugar tão sombrio? — pergunta, esticando o pescoço e olhando para o teto.
— É bom ver você também — diz Fredrik, aproximando-se. Ele está usando o terno Armani de sempre e sapatos sociais pretos reluzentes, que combinam pouco com o ambiente.
Camila abre um pequeno sorriso e continua a olhar em volta, cruzando os braços e encolhendo os ombros como se o lugar lhe provocasse calafrios.
Fredrik aciona um interruptor dentro de um quadro de força e, de maneira surpreendente, algumas poucas lâmpadas fluorescentes zumbem e ganham vida perto da parede do fundo, ressuscitadas, tenho certeza, por algum gerador. Fredrik já usou esse galpão. Dois meses atrás, em outro interrogatório. E tenho certeza de que ele também já o aproveitou para assuntos pessoais.
— Que lugar é este? — pergunta Camila.
A luz revela uma velha cadeira de dentista, no canto mais distante, com alguns itens personalizados, como amarras para os braços e as pernas e grossas correias de couro para segurar a cabeça e o tronco da pessoa.
— É a minha sala de interrogatório — explica Fredrik, com um gesto sutil, como se estivesse apresentando um imóvel para compra. — Bem, por enquanto.
Ele se curva atrás da cadeira de dentista e pega uma maleta preta e fina, coloca-a em uma mesinha de metal manchada de tinta e abre os fechos prateados.
— Estou quase com medo de perguntar o que você faz no interrogatório — diz Camila, descruzando os braços e olhando ao redor, até que seus olhos finalmente chegam à maleta.