Capítulo 14

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Um intruso. Era assim que Pete se sentia quando a família se reuniu para ver o homem que, felizmente, estava bem. Passou tanto tempo longe deles que não se achava no direito de permanecer ali. Por isso, resolveu dar um volta naquela parte do hospital. Não pretendia ir muito longe. Tinha um histórico de se perder em hospitais. Os médicos o encaravam, alguns questionavam se precisava de ajuda. Geralmente respondia que estava tentando esfriar a cabeça e eles pareciam compreender, mesmo que um pouco desconfiados. Observava os diversos quartos cheios de pessoas diferentes. Ao passar por um, teve a impressão de conhecer a idosa deitada na cama branca. Parecia uma daquelas lembranças antigas que não se tem certeza se são reais ou uma peça pregada pela sua mente. Na porta havia um papel com identificação e ao ler sentiu seu coração acelerar. Aquilo era impossível. Seria uma coincidência estranha demais se ela fosse quem estava pensando.
Um pouco hesitante, adentrou no quarto. Não sabia muito bem como agir. Só precisava ter certeza de que não estava louco.
Ela franziu a testa ao vê-lo e disse:
- Oh, você não me parece um médico.
- Não sou - respondeu, tentando não parecer um maníaco - estava visitando meu amigo e fui dar uma volta. Percebi que a senhora estava sozinha, então pensei que poderia querer um pouco de companhia. Posso ficar um pouco?
Ela assentiu, ainda um pouco desconfiada, afinal era um cara totalmente desconhecido.
- Quem veio visitar nesse hospital, rapaz?
- O pai do meu... colega de quarto teve um ataque cardíaco e viemos vê-lo, achei melhor deixar um tempo apenas para a família.
- Oh, então você não os conhece?
- Na verdade até que conheço. Mas não nos vemos há bastante tempo. A senhora não tem alguém para ficar ao seu lado?
Ela deu um sorriso triste e desviou o olhar.
- Não vejo meu filho há quase vinte anos. Meu neto com certeza nem se lembra de mim, era muito jovem para isso. Meu marido morreu faz mais de trinta anos. A única pessoa que se importava comigo era minha nora, que também está morta. Eles eram toda a família que tinha. Eu... morava em outra cidade, mas tive que me mudar por problemas de saúde. Agora estou presa nessa cama.
- Isso é péssimo.
Ele se sentia prestes a chorar. Era mesmo quem estava pensando. Não parecia possível. Depois de tanto tempo, finalmente havia encontrado-a.
- Está tudo bem? - questionou, vendo a expressão no rosto dele.
- Sim, é que... isso me lembrou algumas coisas.
- Qual o seu nome, rapaz?
- Pete. Pete Wentz.
Ela o encarou surpresa, colocando a mão sobre a boca. Era inacreditável demais. Muitos anos se passearam sem que soubessem da existência um do outro. Ele tentou buscá-la, mas sempre desistia quando estava prestes a achar. Tinha medo que a odiasse como seu pai o odiava. Agora estavam se encontrando de uma maneira extremamente incomum.
Não conseguia responder, apenas estendeu o braço e segurou o garoto com força. Tantos anos pensando com como estaria. Finalmente tinha a resposta. Ambos estavam totalmente sem estruturas. Era um reencontro que jamais imaginavam que iria acontecer.
Eles se afastando, ainda mantendo as mãos unidas.
- Você era tão pequeno quando nos vimos! Faz tanto tempo... a última vez foi...
- No velório da minha mãe, sei.
- É verdade sobre o seu amigo?
- Sim. Realmente estava só dando uma volta quando reconheci o nome.
- Você lembrou do meu nome durante todos esses anos?
- Não exatamente. Tive que mexer com uns papéis do meu pai e achei.
- Falando no seu pai, como ele está?
Ele abaixou a cabeça, evitando contato visual. Seria péssimo para ela saber daquilo. Porém, não poderia ocultar a verdade.
- Ele morreu há pouco mais de dez anos.
- Oh... - ela pareceu triste.
Bem, estava recebendo a notícia de que seu filho estava morto e nunca mais poderia vê-lo.
- Ele morreu em um acidente de carro.
Nem sequer sabia de deveria chamar daquilo. Acidente... parecia algo que aconteceu sem sua vontade. Quando sabia muito bem o que estava fazendo. Obviamente não planejva morrer, entretanto, parecia inevitável.
- Como a sua mãe? Não me diga que foi por causa de um motorista bêbado novamente.
Pete deixou escapar um sorriso triste. Ela não conseguia nem imaginar o que havia se passado.
- Sim, foi por causa disso. Mas... nesse caso ele era o motorista.
- Como assim?
- Depois da morte dela, ele se tornou um alcoólatra. Depois de passar dois meses em uma clínica, saiu e bebeu até não aguentar mais. Então foi para casa e me enfiou em um carro, querendo ir até a casa do meu... uh, amigo.
A idosa ficou em silêncio. Era muito para se compreender. Ele não queria ter dito todas aquelas coisas de uma vez. Mas foi necessário, passaram anos demais longe para que deixasse aquelas informações essenciais de fora.
- Pete, me fale sobre você. Suponho que não tenha casado ou tenha filhos - disse após alguns segundos, apertando sua mão levemente.
- Não, não. Tenho um cachorro.
- Um cachorro? - sorriu - Tem fotos?
- Claro.
Mostrou a que era seu papel de fundo do celular. Patrick segurando Bowie enquanto estava jogado no chão com um lindo sorriso na face.
- Ah, esse é seu colega?
- Sim - sentiu seu rosto se esquentando.
- Ah, ele é bonito. E fofo.
- Ele é muito fofo. E inteligente. O Patrick é médico. Pediatra em um hospital. Ah, só que ele toca vários instrumentos e canta bem. Canta tipo muito bem mesmo. Além de escrever músicas ótimas. Ah, ele é incrível.
Ela sorriu, observando a maneira que falava do amigo. Diferente da maioria das pessoas da sua idade, não se importava com o que aquele garoto realmente fosse. Já havia perdido seu neto uma vez, não perderia novamente.
- Ele é mesmo só seu colega?
- O que? - o moreno deu uma risada nervosa, sentando-se na ponta da cama.
- Querido, não tem problema se ele for mais que isso. Não sou a pessoa que julga isso. Pelo jeito que fala nele, parece que sente algo.
- Não, não... ele é realmente só meu amigo agora - respondeu nervoso.
Ela só podia estar enganada. Não era como se sentisse realmente alguma coisa pelo ruivo.
- Agora...?
- Olha, nós já namoramos dez anos atrás. Está tudo terminado.
- Oh, ele conheceu seu pai?
- Na verdade... meu pai descobriu que mantinha o namoro secreto por mais de um ano. Resolveu que queria ir até Patrick provar que as coisas que disse sobre ele era mentiras, dizendo que não o amava e só falava coisas ruins para o meu namorado. Então pegou o carro e me obrigou a dar o endereço. Obviamente dei um qualquer, não poderia colocá-lo em risco. Mesmo assim... o acidente aconteceu. Quando tive que me mudar para Los Angeles, terminei. Não poderia deixá-lo preso a alguém como eu.
Ficaram em silêncio. Ele tentava conter as lágrimas, mordendo sua bochecha internamente. No entanto, não conseguiu mais segurar e falou com uma voz quebradiça:
- Ele estragou tudo! Meu pai estragou tudo. Eu tinha uma vida ótima. Sabia que era o melhor jogador de futebol da escola? Cheguei a fazer cinco gols em uma partida. Ganhei uma bolsa em LA por causa disso. Tinha um namorado que amava muito. Mas meu pai tirou tudo de mim.
- Shhh, está tudo bem, amor - ela o puxou para um abraço, acariciando seus cabelos.
Ele nunca realmente pôde ter a experiência de ter uma avó durante toda sua vida. Não se sentia envergonhado de parecer uma criança. Em seu interior, sentia-se como uma.
- Eu sou um péssimo filho por ficar feliz que ele morreu, não sou?
- Não, Pete. Ele foi um babaca. Acabou com sua vida. Entendo que se sinta assim. Também estou aliviada de que ele se foi. Não se tornou o homem que criei para ser. Ele... te machucou. Machucou meu netinho. Não sou capaz de perdoa-lo por isso. Perdi toda a sua vida por causa dele. Agora não tem mais algo para me impedir de ter você.
Os seus soluços ecoavam no ambiente. Era ótimo finalmente deixar aquilo tudo para fora e ter alguém para apoia-lo. O garoto sempre se perguntou a razão de alguns dos seus colegas dizerem como suas avós eram especiais. Naquele momento conseguiu compreender. Era como se a mulher fosse um poço de carinho e conforto.
- Ei, vamos mudar de assunto. Seu pai não merece que pensemos nele. Por que não traz seu amigo aqui depois? Adoraria conhecê-lo.
- Ele iria adorar te conhecer também.
- Me conte mais sobre... qual o nome mesmo?
- Patrick.
- Isso, isso.
- Ele é... incrível.
- Já falou isso antes.
- Eu sei... - sorriu - Mas não tem outro jeito de descreve-lo. Ele é simplesmente o ser humano mais fantástico que existe. Doce, carinhoso, divertido, talentoso, genial. Muito tímido, as vezes, menos quando está falando sobre algo que gosta. É absolutamente adorável quando está fazendo um discurso sobre alguma coisa que ama. É capaz de ficar horas assim.
- Oh... da mesma forma que está fazendo agora?
Sentiu o rosto ficar totalmente vermelho. Antes que pudesse responder, seu celular tocou.
Rapidamente se levantou, observando a foto do contato que era o ruivo novamente segurando o filhote.
- Pete? Onde você está?
- Você não vai acreditar. Fui dar uma volta no hospital enquanto vocês conversavam com seu pai e... encontrei minha avó.
- O que...?
- É muito estranho. Mas é verdade! Ela quer te conhecer.
- Por que?
- Falei que você era meu amigo e mostrei uma foto sua com o Bowie. Então ela quis te conhecer.
- Eu... estou confuso. Vou até aí. Onde fica?
- No mesmo andar, quarto 211.
- Tudo bem.
Desligou, ainda parecendo um pouco abalado.
- Era o Patrick?
- Sim, ele está vindo.
- Ah, mal posso esperar para conhecê-lo.
Pete começou a andar de um lado para o outro, ansioso. Nem sabia a razão de estar daquela maneira. Não era como se precisasse da aprovação dela para ter um... colega.
Após minutos torturantes, ele chegou, com uma expressão confusa e precocupada.
- Trick - sorriu - viu que falei a verdade?
O mais baixo piscou várias vezes, tentando entender o que estava se passando. Era praticamente impossível.
- Oi, querido, venha aqui me dar um abraço.
Ainda extremamente confuso, se aproximou da mulher de aparência frágil e acolhedora.
- Oi...
- É estranho, sei. Principalmente porque tem ciência de tudo que aconteceu na vida dele. Confie nele, realmente sou avó desse rapazinho precioso.
Não conseguia responder, estava perplexo demais para isso.
- Patrick, está tudo bem? - o moreno questionou, parecendo um pouco preocupado.
- Sim, claro. Só jamais esperava que isso iria acontecer. Tipo, todo o tempo em que estivemos juntos você me dizia que sentia vontade de conhecê-la. E agora simplesmente a encontrou?! Isso é... muito para mim. Por favor, me desculpe, preciso de um tempo para pensar.
O ruivo saiu do quarto, deixando-os preocupados.
- Vá atrás dele, precisa disso agora - a mulher falou para o neto, que assentiu e se dirigiu a saída.
- Patrick, o que está acontecendo?
- Eu...
Encostou-se na parede, fechando os olhos enquanto lagrimas escorriam por suas bochechas.
- Só consigo pensar em como minha vida foi perfeita. Nunca entendi o porquê de tudo ser tão injusto com você, desde quando éramos adolescentes. A sua mãe tinha morrido, seu pai era um desgraçado e eu... tinha tudo. Meus pais estavam vivos e me amavam mais do que qualquer coisa no mundo.
- Trick, estou feliz. Não tem razão em se preocupar.
- Toda vez que você ficava feliz algo acontecia e estragava. Estou me perguntando o que será. Eu não quero te ver triste. Nunca quis, desde o primeiro instante que te conheci. Só... quero que fique bem. Eu te... - deu uma pequena pausa, tentando conter o choro - quero bem. Não poderia aguentar ver você mal novamente.
- Trick, escute - colocou as mãos em no rosto pálido do mais novo para que fitasse seus olhos - eu estou bem. Tenho Andy e Joe, quero muito ter Frank e Gerard de volta, finalmente tenho a minha avó e... tenho você e Bowie. Estou bem. Nada vai estragar isso. Okay?
O outro suspirou, finalmente parando de chorar.
- Não precisa se preocupar comigo.
- Somos amigos, claro que preciso.
Sempre que falava aquilo parece que um nó se formava em sua garganta. Era como se algo não encaixasse. Talvez fosse o fato de não terem o hábito de dizer aquilo. Ou talvez... só não fossem feitos para serem daquele jeito.
- Agora podemos voltar lá e passar muito tempo falando sobre você para minha avó?
- Claro.
Pete passou os braços ao redor dos ombros de Patrick. As coisas finalmente pareciam estar se encaixando. E tudo estava perfeito. Da maneira que deveria ser.

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