LEON
Chego em casa e não encontro ninguém. Ana Beatriz deve ter ido para a casa da mãe novamente e pela primeira vez tenho medo do que aquela mulher pode estar falando à meu respeito. Pois pela primeira vez eu tenho culpa de algo. Vou até a cozinha e coloco uma capsula na cafeteira. Subo e coloco minha banheira para encher. Quando volto para a cozinha encontro Joana voltando do mercado.
- Onde está Ana?
- Ela passou o final de semana todo na casa de dona Carolina, senhor.
Agradeço Joana, pego meu café e vou até meu escritório. Eu a amo, mas ultimamente Ana Beatriz não tem sido mais a mesma mulher. Sempre eu quem a procura na cama, tudo vira motivo de discussão, o que transforma um casamento bom e algo massivo. Decido que deixarei que ela fique lá até quando achar pertinente.
Pego meu celular e decido retornar a ligação de Jonathan, se ele ainda estiver em São Paulo podemos sair tomar uma. Por sorte ele ainda está e aceita meu convite. Tomo um banho e me arrumo, mas antes de sair deixo um bilhete para o caso de Ana retornar da casa da mãe.
Com a Land Rover vou até o bar que marcamos. Conversamos sobre os velhos tempos, das enrascadas que nos metíamos. E por fim ele me perguntou como andava meu casamento, eu disse a verdade, omitindo Alicia da história. Ele me deu um conselho que eu não acho que valha muita coisa, pois qualquer chance de me dar bem com Carolina é inexistente.
- E você? Ainda é um conquistador barato? - zombo.
- Não - ele ri. - Na verdade estou querendo sossegar, mas não achei a pessoa certa ainda.
- Impossível, as mulheres sempre se atiraram aos seus pés, deve ter alguma em especial.
- É complicado.
- Sou seu amigo, cara. Vai que te dou o conselho que te faça conquistá-la.
- Tudo bem, eu falo. Tem essa mulher que eu conheci através de uma amiga, ela é linda, acho que a mais linda que eu já vi. Só que pelo que percebi ela tem problemas com o atual ou ex dela, sei lá. Ao mesmo tempo que penso em ligar e marcar algo, penso que talvez me manter afastado me poupe de um agrande dor de cabeça.
- Okay, mas por que pensa isso?
- No dia que fomos devidamente apresentados um cara tentou agarrar ela, e minha amiga disse que era o pai do filho dela - escuto atentamente a história. - Mas depois eu me lembrei que já havia encontrado com ela. Eu a conheci no dia te cheguei em São Paulo, no estacionamento da sua empresa.
- Como assim?
- No mesmo dia que cheguei, eu fui até a sua fábrica e ela estava discutindo com um homem no estacionamento, quando me viu estacionando ele fugiu.
- Qual o nome dela? - pergunto, pensando em quem poderia ser.
- Alicia - me engasgo com o gole de Whisky que estava dando. - Você a conhece?
- Sim, é minha gerente de produções. A gente se viu poucas vezes.
- Que pena, talvez você pudesse me dar uma mãozinha.
- É, talvez.
Depois disso fiz de tudo para manter nossos assuntos longe de Alicia. Imaginar a mulher que esteve na minha cama de hotel ontem, hoje ou qualquer outro dia na cama de um motel qualquer com Jonathan me causou uma estranha sensação de náusea junto com raiva.
No final da noite nos despedimos e marcamos de nos encontrar um dia desses para jogar tênis. Achei uma ótima ideia, pois assim ele não pode falar sobre sua paixonite por Alicia e posso acertar, quase, sem querer umas boladas nele para descontar a raiva.
ALICIA
Na segunda-feira cheguei com sangue nos olhos na fábrica. Estou meia hora atrasada, porque algum idiota não prestou atenção no semáforo e sofreu um acidente. O que parou a Marginal ainda mais. Ao entrar eu ouvi um alvoroço na área de tintura, fui direto para lá, sem nem passar na minha sala antes.
Ao me aproximar vejo que uma das máquinas travou e está espirrando tinta para todos os lados. Os funcionários estão discutindo o que fazer, ao invés de fazer algo de uma vez. Eu me lanço entre meio as tintas, a tinta sai aquecida da máquina com defeito e sinto minha pele arder em cada lugar acertado por ela. Eu consigo desligá-la e ouço alguém gritar que já está ligando para a ambulância.
- Alicia, sente-se aqui - diz uma das funcionárias puxando uma cadeira.
Só então me dou conta de como meus braços e alguns lugares do meu rosto estão ardendo. Começo a chorar involuntariamente. Meu vestido carmim está todo manchado de vermelho, verde e outras cores que não quero distinguir agora. A ambulância não demora chegar e me levam direto para a emergência.
Limpam minha pele com algum tipo de soro, me fizeram colocar aquela roupa de hospital e passaram pomadas na minha pele. Segundo o médico eu tive queimaduras de primeiro grau nos braços e rosto e algumas de segundo grau nos braços e pernas.
- Agora você precisa ficar em repouso, passo mais tarde para ver se está tudo certo - diz a enfermeira antes de sair do quarto.
Eu penso um pouco sobre como tudo aconteceu tão rápido e em como eu só pensei no prejuízo que a empresa teria. Acho que estou levando um pouco a sério demais esse lema de a Manshur ser a minha vida. Estou precisando viver mais. E com esse pensamento eu acabo adormecendo.
Quando acordo, ao lado da minha cama, há um buque enorme de rosas e um único lírio em um vaso dividindo espaço no criado mudo. Num sofá do outro lado noto Evelyn sentada mexendo em seu celular. Notando que acordei, ela larga o aparelho e se aproxima da minha cama.
- Que susto você nos deu.
- Como soube? - pergunto.
- Olivia ligou para mim assim que a ambulância chegou. Ficamos todos muito preocupados.
- Todos? - ela abre um sorriso.
- Estamos em um bom número ali fora, e alguns já foram embora.
- Quem mandou essas flores?
- O lírio foi Jonathan, ele está ali fora. Já as rosas eu não sei, mas acho que tem um cartão.
Lírios sempre foram minhas flores preferidas, talvez Evelyn tenha dito isso para Jonathan. Ela fuça no enorme buque e me entrega o cartão.
"Me sinto demasiadamente culpado. Melhoras"
Entrego de volta para Evelyn colocar no buque. Apesar de não haver assinatura eu reconheço a caligrafia caprichada de Leon. Não sei em que momento ele esteve aqui, mas me senti estranha sabendo que ele me viu horrível como devo estar. Evelyn não me pergunta de quem é, mas sei que ela está curiosa quanto a isso.
- É do meu chefe, parece que ele se sente culpado.
- E deveria. Olivia disse que ele não fez as inspeções necessária esse mês. Se quiser posso processá-lo.
O lado advogada de Evelyn sempre fala mais alto em qualquer situação. Mas digo que não há necessidade e que tudo ficará bem. Conversamos sobre outros assunto pelo resto do horário de visitas e antes de ir embora ela me promete que voltará amanhã. Quem diria que eu teria que parar no hospital para que ela voltasse a falar comigo depois que perdi sua festa de aniversário.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Corações Errados
RomanceAlicia, mulher linda, arrogante e fria. Muito enganada no passado decidiu colocar uma pedra no lugar do coração, o que a fez ficar conhecida na fábrica em que trabalha como "coração de gelo". Aos 28 anos jurou jamais se apaixonar novamente. Mas por...