Capítulo Onze

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LEON

Acordei na segunda com uma ligação quase histérica de Bruna, dizendo que uma máquina havia estragado e que alguém estava indo para o hospital. Isso nunca aconteceu antes, certamente terei grandes problemas. Vesti-me o mais rápido que pude e voei para a fábrica.

Quando cheguei a equipe de limpeza já estava arrumando toda a bagunça e o mecânico já havia sido chamado. Subo as escadas até meu escritório, pois pedi para Bruna apurar tudo o que conseguisse sobre o ocorrido. Começo analisar a papelada e noto que a licença da manutenção está vencida e não só dessa maquina, mas de outras três também.

Redijo no meu computador um decreto para que tudo seja paralisado, até conseguir resolver tudo e garantir que não ocorram maiores problemas, nem que mais ninguém se machuque. Então eu lembro que ainda não sei quem foi para o hospital. Chamo Bruna e entrego o decreto para que distribua nos editais da fábrica e pergunto quem se machucou.

- Foi a Alicia Cardoso, senhor - sinto o ar se exaurir dos meus pulmões por um segundo.

- Como?

- Pelo que ouvi ela atravessou as tintas quentes saindo da máquina para desligá-la e isso impediu um prejuízo ainda maior.

- Que se dane o prejuízo, como ela está?

- Estável, não foi grave - responde confusa.

Digo para Bruna que saia da minha sala e quando levanto para ir até o hospital meu celular começa a tocar. Olho no visor e a foto de Ana Beatriz aparece na tela. Merda! Por que agora? Respiro fundo e atendo a chamada.

- Oi meu amor - ela diz com voz doce.

- Oi.

- Aconteceu alguma coisa? Sua voz parece tensa.

- Um acidente na fábrica, já estou resolvendo. Qual o motivo da ligação?

- Passei o final de semana na minha mãe e conheci durante o jantar uma ótima cozinheira e ela tem a agenda livre para as nossas bodas. O que acha?

- Podemos falar sobre isso mais tarde?

- Eu entendo, mas preciso respondê-la em uma hora.

- Ok. Estou indo para casa, daí conversamos.

Decidi optar pelo meu casamento, já é um milagre Ana Beatriz não estar contra mim depois de um final de semana inteiro no ninho das cobras. Ligo para floricultura e encomendo o maior buquê para Alicia, escrevo um cartão simples e peço para que eles passem aqui na fabrica antes de levarem ao hospital. Deixo o cartão com Bruna e vou para casa, ajudar Ana a decidir sobre essas bobagens.

ALICIA

Evelyn quem me leva para casa, os médicos disseram que eu só preciso de repouso e cuidar das minhas feridas. Quando chegamos no meu apartamento noto que já parece ter alguém ali e Evelyn me dá um sorrisinho e percebo na hora que ela aprontou alguma coisa. Ao entrar pela porta percebo que tudo está normal, tirando o fato de Jonathan estar todo vestido de branco parado no meio da minha sala de estar.

- Oi - ele diz com um sorriso no rosto.

- Oi - acabo por sorrir também.

- Amiga, Jonathan se ofereceu para ser seu enfermeiro particular - diz Evelyn muito, muito animada. Tão animada que Jonathan abaixa a cabeça, visivelmente sem jeito.

- O quê? Não, nem pensar. Eu consigo me cuidar sozinha.

Eles querem me tratar como criança? Foram só algumas queimaduras, nada demais. Não sou uma inútil que não consegue nem passar uma pomada sozinha. Alem do mais tenho certeza de que Evelyn encheu o saco de Jonathan até ele aceitar, além de que ele deve ter coisas muito mais importantes para se preocupar.

- Não tenho dúvidas, mas eu realmente acho que ter alguém para te ajudar vai evitar possíveis infecções e futuras cicatrizes.

Cicatrizes? Eu não quero ficar com cicatrizes.

- Não sei se consigo pagar por seus serviços Jonathan.

Ele me encara com seus olhos azuis como se estivesse ofendido. Jonathan é um homem muito bonito, disso não tenho dúvidas, mas com ele todo vestido de branco assim dá quase um ar angelical a ele, se Evelyn investisse estaria muito bem.

- Evelyn disse a verdade, eu me ofereci. Passei anos cuidando de meus pais, sou formado em enfermagem. É a minha paixão, nunca fiz por dinheiro.

Me dou por derrotada e aceito. Evelyn almoça conosco, mas logo vai embora, nos deixando sozinhos. Decidimos começar ver uma série juntos, Jonathan opta por Vis a Vis e passamos a tarde toda assistindo. Eu tenho que ficar mudando de posição pois as queimaduras incomodam. E Jonathan parece um reloginho me dando os remédios pontualmente. Eu definitivamente já teria os esquecidos se estivesse sozinha.

- Agora acho melhor você tomar um banho - ele diz desligando a TV depois de um episódio. - E nem pensar em banho quente, tome o mais frio que conseguir.

O encaro como se ele fosse louco.

Ele ri e me diz que não tenho escolha. Ainda tento um olhar meigo, mas não funciona.

Entro no banho e até tento tomá-lo morno, mas não consigo. Todo meu corpo parece arder e pegar fogo, como se estivesse no meio das tintas novamente. Quando saio do banheiro vestindo meu pijama e com uma toalha enrolada na cabeça estou tremendo. Jonathan já estava preparado, pois ligou o ar condicionado, deixando meu quarto quentinho.

- Hora dos curativos - diz assim que nota minha presença.

Ele aponta para que eu me sente na beirada da cama, coloca pomada numa gaze e coloca nas queimaduras que fizeram bolhas, e sinto um alivio da queimação imediato. Em seguida ele enfaixa com uma atadura minhas pernas e braços. Sei que é para não deixar que a pomada passe na roupa de cama.

Ele pede para que eu me deite e vem passar a pomada no meu rosto. Ele está muito perto, que posso sentir sua respiração. Jonathan tem algumas rugas na área dos olhos , como se a vida tivesse sido difícil para ele. Ele está com o cenho franzido, concentrado no que está fazendo. De repente ele para e me olha nos olhos.

- Posso fazer uma pergunta indiscreta? - sua voz soa rouca, quase urgente.

- Claro - respondo com certo receio.

- Quem era o homem no estacionamento? - devo demonstrar que não sei do que ele fala, pois ele me olha e continua - no dia que cheguei em São Paulo, fui até a fábrica Manshur, você estava chorando e discutindo com um homem. Quem era?

- Ah - era ele? Meu Deus!  É claro que era ele. 

- Me desculpe, eu não deveria ter feito essa pergunta.

Ele se levanta sem jeito. Eu achava que tinha conhecido Jonathan na boate, pois aquele dia no estacionamento eu estava tão nervosa, tão cega de raiva de Henrique que nem se quer me lembrava do rosto do homem que havia me salvado. Mas agora lembro que ele me disse seu nome e apertou minha mão. Aquele Jonathan era esse Jonathan.

- Ele é meu ex-namorado. Apenas digamos que as coisas não aconteceram muito bem.

- Ele foi o motivo de você sair daquele jeito da boate? - aceno positivamente com a cabeça.

Ele se aproxima e se senta aos pés da minha cama, não sei porque, mas fico nervosa.

- Homem nenhum deveria tratar uma mulher assim, ainda mais uma mulher como você. Evelyn me contou algumas coisas a seu respeito e isso me fez te admirar Alicia, você é uma mulher guerreira.

- Por que se ofereceu para cuidar de mim? - solto de repente.

- Sinto que devo proteger você - ele me encara e eu engulo em seco. - Bom, melhor te deixar descansar. Se precisar de mim estarei no quarto de visitas.

Ele se levanta e sai. Fico absorta em pensamentos, que merda aconteceu aqui? Ouço o chuveiro ser ligado e repasso mentalmente nossa conversa. Penso pelo que parecem horas, mas nem ao menos aguento acordada até ele terminar o banho.

Corações ErradosOnde histórias criam vida. Descubra agora