phantasia

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Eu já tive muitos sonhos bonitos durante a minha vida até aqui, mas nada foi tão perfeito quanto o que eu havia sonhado acordado.

Mais uma coletiva de imprensa. Não me recordo exatamente em qual cidade estávamos, mas sei que era longe de casa. Nós quatro, um ao lado do outro atrás de uma mesinha frágil e uma coleção de microfones, num maldito olho de um furacão. E eu não falo da beatlemania.

Parecíamos uma atração exótica no meio de um batalhão de repórteres. Quando que aquele festival de lentes iria acabar? Eles já nos conheciam de cabo a rabo; nossos nomes, idades, alturas, peso, árvore genealógica e ex-namoradas. O que mais queriam arrancar da gente? Só queríamos tocar por aí, não virar um show diário esquisito!

Câmeras, flashes, perguntas pra todo lado. Estávamos há um pouco mais de um ano fazendo turnê e aquilo já me saturava em um nível absurdo. Brian vivia com receio de que em qualquer uma dessas entrevistas eu saísse mandando todo mundo se ferrar. Eu não faria isso... Na verdade faria, mas por respeito a ele eu permanecia quieto.

Eu estava na ponta da mesa. Paul estava do meu lado. George e Ringo do lado dele. Eu mexia no punho da minha camisa o tempo todo, estava ansioso pra que aquele circo acabasse porque queria comer alguma coisa logo. Uma rajada de perguntas para o divertidíssimo companheiro ao meu lado ▬incrível como ele conseguia disfarçar o tédio daquilo▬ que mais parecia ser o predileto de nós quatro. A quem eu estou tentando enganar? Ele realmente era o predileto de todo mundo.

Li muito sobre o que as nossas fãs pensavam, e muito mais sobre o que pensavam dele. Eu era ávido pra saber se elas tinham as mesmas vontades que eu, as mesmas curiosidades e tudo mais. E você me pergunta: mas por quê? E a resposta que tenho a dar é: eu também sou fã dele; o primeiro, até onde sei.

E eu carreguei essa vantagem por muito tempo.

Elas queriam conhecê-lo, abraçá-lo, ter um jantar com ele. Queriam andar de mãos dadas, arrancar uns beijinhos e número de telefone. Desejavam passear de carro ao lado dele, tomar milk shake no parque e apresentar pra família. Sonhos tão doces... Lembro-me de algo assim nos meus tempos de fã do Elvis.

Mas quando você cresce, amadurece e vive com o ídolo, o patamar de sonho atinge outro nível.

Eu muito provei dele. Repetidas vezes, infinitas vezes. Todas como se fossem a primeira vez. Ele tinha esse efeito, eu lhe garanto. Ele brincava com o tempo, e com corações também.

Seria subestimar a inteligência dele de pensar que não sabia o que estava escancarado na minha cara. Sim, desde todo o sempre ele sabia que eu era mais um serzinho apaixonado por tudo o que ele era. Não conseguia disfarçar, tudo em mim dizia muito. Meus olhares atentos, minha implicância, minha aproximação, meu querer estar perto. Eu era tão... Óbvio.

Sempre tive raiva de mim por não conseguir ver o mesmo. Era uma coisa que me dava medo e me deixava triste, pois ele me tinha nas mãos, e eu não fazia mais nada a não ser me encontrar sendo mais um fantoche na galeria dele, que me tirava pra brincar na hora que quisesse.

A mim só restava pensar, imaginar, fantasiar, etc., chamem do que preferirem. O escapismo diário me ajudava a lidar com uma realidade da qual eu não tinha controle. Eu podia criar qualquer coisa em qualquer lugar. Por um lado isso é terrível, pois o mundo cobra em dobro quando você não presta atenção; por outro lado, é a coisa mais magnífica que o nosso cérebro pode conceber.

E era aí que eu era feliz.

Eu ouvia clicks, enxergava luzes distantes e vozes abafadas. Eu já não estava naquele salão. Eu estava onde queria estar e com quem estar. Um quarto gigante, completamente branco, com inúmeras e grandes janelas por onde passava os raios de sol de um fim de tarde e uma brisa refrescante que me fazia crer que dias bons eram possíveis; tudo isso numa cama bagunçada, deitado bem ao lado dele.

PARIS 61 - MclennonOnde histórias criam vida. Descubra agora