1978
-Olá, todos!
Paul McCartney e sua comitiva –esposa e filhos- foram bem esperados na cobertura do edifício Dakota por John Lennon e Yoko Ono para um jantar e uma conversa rápida.
-Boa noite, todo mundo. –Disse John alegre. –Podem entrar. Bom vê-los de novo.
-Como vocês estão, pessoal? –Perguntou Linda.
-Indo bem no ritmo caseiro. –Respondeu Yoko divertida. –E vocês?
-Cuidando de uma creche. –Replicou Paul. -... Aparentemente. Ei Stella, nada de correr!
-E vocês trouxeram o pequeno James! –Disse John aproximando-se de Linda, observando o bebê que dormia sobre seu ombro.
-Pois é. –Disse Linda sorridente. –Ainda estou amamentando esse bebezão. Pra lá e pra cá com ele.
-Entendo perfeitamente. –Disse Yoko. –Até poucos meses atrás estava assim com o Sean. Mas o tempo passa rápido.
-É o que eu diga. –Retrucou Paul. –Olhe como cresceram essas monstrinhas! –Olhava para as filhas que brincavam ao redor de suas pernas. –Agora correm aprontando. Podem parar as duas!
-Vida agitada. –Disse John. –Já estou imaginando a minha assim em alguns anos. Já vejo a prévia hoje. –Cutucou Yoko.
Todos gargalharam.
Depois da breve e divertida recepção todos se dirigiram à sala de estar. Bem acomodados no sofá, conversavam mais enquanto a TV ligada ao fundo exibia o principal telejornal da noite.
-Eles te seguiram dessa vez? –Indagou John a Paul apontando para a tv.
-Acredito que não. Fizemos um malabarismo profissional até aqui. –Sorriu para Linda.
Duvido que tenha sido melhor do que o que fizemos em Paris.
-Ah, muito bem. –Disse John com uma expressão de falsa surpresa.
-Vocês já voltaram a compor alguma coisa? –Perguntou Linda olhando para Yoko e John.
-Sim... Algumas coisinhas. –Respondeu John meneando a cabeça.
-Tudo bem lento por causa do Sean, mas material novo sai. –Completou Yoko.
-Não sei se eu disse na visita anterior... –Começou McCartney. –Mas o último álbum ficou muito bom.
-Gostei muito de gravar aqueles covers. –Comentou John. –Do início ao fim. Em 74 consegui adiantar até algumas lives, mas foram poucas distribuições, coisa bem amadora.
-Me lembro que escutei uma delas. "Just Because", que inclusive foi em Los Angeles.
-Ah, você ouviu? –Perguntou Lennon disfarçando uma inegável surpresa. –Gostou da live?
Claro, idiota. Você cantou pra mim, e tão bêbado que podia ter sido facilmente confundido com um maníaco.
-Bastante. Todo o seu coração na música. Saiu incrível. –Sorriu docemente irônico.
-Com licença. –Interrompeu Yoko. –Que eu vou verificar algumas coisas na outra sala. Um momentinho.
Minutos depois o jantar havia sido anunciado. Todos distribuídos, cada casal de um lado da mesa e devidamente postos. As meninas concentradas na comida ficaram juntas ao lado da mãe. O pequeno James descansava um momento no quarto de Sean, dando um intervalo aos pais. Dessa forma, continuaram as conversas durante a refeição. Tudo bem devagar, principalmente quando as trocas de olhares entre John e Paul se tornaram reciprocamente frequentes. Se a mente de cada um deles não parava de funcionar quando estavam juntos, não havia mudado muita coisa com a impiedosa distância.
"Como ele aguenta tanta criança assim?"
"Como ele aguenta essa vida caseira no topo desse prédio"
"Será que ele ainda vai sair em turnê com a mulher?"
'Será que ele vai gravar alguma coisa depois desse tempo todo?"
"Ele engordou um pouco ou é impressão minha?!"
"Ele emagreceu demais, o que ela tá dando pra ele?"
"Péssimo corte de cabelo."
"Gostei do corte de cabelo."
"Mas ainda continua adoravelmente belo."
"E quando pensei que ele não podia ficar melhor..."
"Será que ele se lembra de mim com tanta coisa acontecendo na vida dele?"
"Será que ele pensa em mim assim como eu penso nele?"
"O que será que ele faz aos sábados?"
"Seria uma boa ideia chamá-lo pra compor alguma coisa no fim de semana?"
"Por que ele tá me olhando tanto?"
"Por que ele tá me encarando?"
"O que acontece quando ele fica sozinho em casa?"
"O que ele faz escondido?"
"Batedor de punheta."
"Praticante do onanismo."
"Não duvido que ele escreva sobre mim em um diário."
"Aposto que ele grava confissões."
"O que aconteceria se eu piscasse pra ele?"
"O que aconteceria se eu cutucasse a perna dele?"
"Como eu to mantendo uma conversa enquanto penso em tanta coisa? "
"Será que alguém mais tá notando?"
"Não faz mal pensar nas possibilidades."
"Minha imaginação é fértil."
"Esses olhos..."
"Esse sorriso..."
"Se ele me chamasse para ir embora..."
"Se ele me pedisse para não ir embora..."
"Queria começar de novo."
"Queria que nada tivesse acabado."
"Eu sinto saudades."
"Eu vivo com saudades."
"Se você pudesse ler minha mente, eu apenas queria dizer..."
"Se você visse a verdade nos meus olhos, eu apenas queria que soubesse que..."
"Eu ainda te amo."
"Eu ainda te amo."
Quando a realidade se fez totalmente presente à mesa, quase todos estavam satisfeitos: barriga completamente cheia, mas no coração ainda faltava um pedaço. O velho dilema que cruzava um novo jantar. Na verdade, quantos jantares seriam suficientes para vencer o dilema? Ou tudo apenas era medo?
Despediram-se devidamente. Sorrisos, apertos de mão e abraços. O toque era importante. O sentir tinha objetivo. Nem sabiam disso, mas já lhes era natural.
Um último olhar até McCartney deixá-lo à porta, indo dar meia volta em direção ao elevador.
Uma última mirada antes de vê-lo partir.
E os últimos desejos velados um para outro:
Esteja comigo sempre.

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PARIS 61 - Mclennon
FanfictionColetânea de one shots McLennon. Histórias diversas entre 1957-1980.