🩸 Capítulo 1.3

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Por mais que tentasse disfarçar, a expressão de Edgar demonstrava um misto de descoberta e preocupação. Se eu pudesse dar uma espiada em seus pensamentos, tenho certeza de que veria as peças do quebra-cabeças se encaixando, uma a uma. Meu amigo muito provavelmente começava a entender por que aquele era um assunto tão espinhoso para mim.

— Eu imagino que deveria existir um bom motivo para os vampiros-reis utilizarem outras vampiras como barriga de aluguel, estou certo? — ele finalmente disse, indo direto ao ponto que o intrigava.

— Sim, está — concordei. — Uma vampira fêmea é capaz de passar pelo período de gestação de um bebê híbrido sem grandes problemas. Não podemos dizer o mesmo das mulheres humanas... Elas são muito mais... frágeis... e o bebê pode acabar exigindo demais delas... É um procedimento muito arriscado...

— Mas, mesmo sabendo disso, o seu pai foi adiante...

— Não foi bem assim... — interrompi, com um suspiro. — Não foi nada planejado, entende? Meu pai conheceu minha mãe em uma de suas várias viagens pelo continente, para estabelecer as bases vampíricas em diferentes pontos daquele novo reino. A conversa entre os dois fluiu. O desejo foi recíproco. Eles acabaram se apaixonando...

— Ela sabia que seu pai era um vampiro? — Edgar perguntou.

— A princípio não. Mas, eventualmente, meu pai acabou sendo sincero e revelou toda a verdade. E, apesar do estranhamento inicial, ela o aceitou — expliquei. — O plano dele era transformá-la em vampira, para que depois eles pudessem se casar segundo nossos costumes e ela pudesse assumir o posto de rainha ao lado dele.

A sala voltou a ficar em silêncio em seguida. Eu simplesmente não sabia como continuar. Como narrar os acontecimentos posteriores em voz alta? Como encarar um dos muitos fantasmas que me perseguiam e que eu procurava evitar com todas as minhas forças?

— Você sabe que está num espaço seguro, não sabe? — Edgar mencionou, com cuidado. — O que for dito aqui, morre aqui. E eu estarei o tempo todo junto com você.

Respirei fundo e encarei meu amigo diante de mim. Não dava mais para evitar. Afinal, era para isso que eu estava ali, não era?

— Tudo ia bem — eu enfim continuei. — Minha mãe havia aceitado ser transformada. E de tão empolgados que ficaram com o futuro que os aguardava, os dois pombinhos resolveram comemorar. Você sabe como são dois jovens apaixonados, não sabe? Não conseguem desgrudar um do outro e acabam deixando coisas importantes de lado... Em outras palavras, eles acabaram sendo descuidados...

— Pelos deuses... — Edgar exclamou, alarmado. — Você não está querendo dizer que a sua mãe engravidou acidentalmente, está?

— Sim, foi exatamente isso — confirmei. — Um vampiro macho consegue controlar sua capacidade de fecundar ou não a sua parceira. Ele precisa querer engravidar alguém, conscientemente, em primeiro lugar. Mas, de alguma forma, mesmo sem ter a intenção de usar essa habilidade, inexplicavelmente meu pai acabou engravidando minha mãe antes da hora... Quando eles perceberam, já era tarde demais...

— O que aconteceu? — Edgar perguntou, interessado.

— Primeiro ela adoeceu. Os médicos disseram que era uma anemia. Eles não estavam totalmente errados, convenhamos... Quando finalmente perceberam que a doença era, na verdade, uma gravidez, já era tarde demais. Minha mãe estava muito fraca e não resistiria a um aborto provocado. Tampouco poderia ser transformada em vampiro no estado em que se encontrava...

— E o que o seu pai fez?

— Meu pai atendeu ao último pedido dela. Ela queria que eu vivesse. E ele fez o possível para que isso acontecesse... Caso contrário, eu não estaria aqui contigo, contando essa história...

O Clube da Lua: Laços Antigos (Contos / Livro 1.5 ✓)Onde histórias criam vida. Descubra agora