22 - Voltei Pra Ficar

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Chegando ao pé do morro meu coração aliviou, respirei tão leve que quase flutuei.
Estacionamos o Corolla, peguei minhas coisas e avisei que ia dar uma descansada, depois iríamos resolver o caso dos porcos da UPP e da lojinha.
Entrei em casa carregando a mala, minha tia me recebeu super alegre e contanto as novidades.
Após toda aquela conversa, acabei dormindo no sofá enquanto minha tia, provavelmente lavava minhas roupas e preparava uma larica da tarde.
Acordei com um abraço quentinho, pisquei os olhos até ver nitidamente a Natacha.

- Oi. - ela sorriu, aquele dente branco iluminou meu dia. - Que delícia ver que você voltou.

- Saudades sua também. - dei um sorrisin ao vê-la me admirar.

Porra, a Natacha era pra ser a mulher da minha vida e agora eu acabei de me convencer dessa merda. Não sei se era errado ou certo, mas mano... Ela é eu se fosse mulher. A mina era a mais firmeza do bagulho, gostosa, tatuada, cheirosa, gente fina e sabe bolar um beck como ninguém.

- Vamo lá no morro comigo? Vou resolver uns bagulhos. - ela concordou.

Subimos as vielas com calma e trocando umas ideias.
A barriga dela não estava saliente, parecia não ter ninguém lá dentro e eu quase estava quase convencido de que era mentira, mas voltar atrás e ficar com ela (por mais que eu gostasse dela) me parecia errado, já que eu não era o pai da criança.
Rato e CG já estavam na boca.
Passei pelos fogueteiros e cumprimentei todos ali.

- E ai, quem vai ficar de frente do bagulho?! - o LC falou.

- Alguém te perguntou alguma coisa? - Rato olhou bravo pra ele. - Tá aqui cortando os cria... Tô doido, ué.

- Relaxa, mano... - sussurrei segurando seu ombro. - Primeiramente, boa rapaziada.

Estavam todos reunidos na boca, estavam esperando por um ultimato, precisavam de dinheiro e precisavam vender pro morro lucrar. Aliás, arma e droga se compra com dinheiro!

- Todo mundo aí sabe que o Patrick se foi, tá ligado... O mano colaborou com a lojinha faz anos mas chegou a hora dele e o crime é isso. Eles não tão aqui pra arregar e matar se for preciso. Independente de quem for o de frente, não quero saber de arrego, bate de frente nessa porra e mostra de quem é morro. Tem que servir a facção.

Todos me olhavam com cautela, ali era até perigoso encarar por muito tempo.
Rato estava a minha direita e CG na esquerda.
Os moleques estavam ansiosos pra suas novas funções.

- Sem ladainha, Playboy. - CG sussurrou. - Seguinte, rapaziada... Todo mundo tá ligado que o Patrick criou o Playboy durante a caminhada, então pela lei do mais forte a boca é do Playboy.

- E quem tiver alguma coisa contra, bate de frente que nós resolve. - Rato falou alto e em bom tom, jogando a Glock em cima da mesinha.

Natacha estava escorada no poste e quando CG anunciou o novo frente da boca, seu sorriso estendeu.
Aquela bandida desgraçada me mata de tesão por se orgulhar de mim.

- Tendeu, quebrada... - LC concordou. - Mas e as função ai do dia a dia, tá a mesma fita?

- Tô assumindo o cargo do Gentil e o CG tá assumindo o meu. - Rato novamente estava pegando as rédeas.

E ficou assim, eu dono dessa porra.
Rato cuidando do armamento pesado e CG resolvendo as merdas da favela. Fora isso, segue o baile, tudo normal... Brota que o bonde tá na pista!

- Nós tem que ver o bagulho dos porcos vacilão.

Rato jogou os pés em cima da mesinha, do lado da Glock.
A sala estava vazia, aquela antiga casa do Patrick serviu pra alguma coisa. Virou a base dos crias.

- Temos memo... Pra não ter problema, melhor alternativa é o gatilho. - encarei o Rato.

- Tu assumiu o lugar do Gentil, essa bronca é toda sua, firmeza?! - logo tirei o meu da reta, eu não conseguia puxar o gatilho e fim de papo.

Os dias se passaram e a falta da escola me deixava sem ter o que fazer, então minha rotina virou uma só; da boca pra casa e da casa pra boca.
Rato tinha ficado dias fora sabendo dos porcos corruptos da UPP, enquanto CG se fazia presente e meu braço direito na favela. Não houve muitos problemas e a lojinha estava a milhão, os bailes voltaram e nada de PM encostando pra acabar com o lazer.
Minha tia Carla estava sempre a beira de um colapso depois que avisei que eu era o mais novo de frente da boca, isso tornou suas noites mais religiosas mas eu não poderia desfazer desse grande cargo.
Bruna me manda algumas mensagens as vezes e sempre combinávamos de dar um rolê, avisava toda vez pra mandar um beijo na boca do Rato e eu, como um bom cupido, entregava o recado importante.
Dylon desapareceu, aposto que por estar aposentado não havia voltado pra cá, ainda mais agora que Bruna estava de maior poderia se cuidar facinho!
Nada da delegada por aqui, o morro estava calmo, nada de ninguém fardado ou algo suspeito, achei finalmente que estaríamos em paz!

- Oh cuzão, encosta aqui! - falei no nextel chamando o LC.

Rato havia voltado e me contado algumas coisas que fariam toda a diferença.

- A real, Playboy é que ninguém sabe quem apagou o Patrick, mano. Bagulho no asfalto tá embaçado...

- Simples assim? Ninguém tem ideia? - falei puto.

- Não, caralho. - disse confirmando com ódio agora. - Mas ai, te trouxe um presente...

Rato abriu a mochila rapidamente e começou a procurar no meio de tralhas. Sacou a pistola dourada, olhou com atenção pra ver se não estava engatilhada, verificou as balas e deu a mesma na minha mão.

- Do jeito que você gosta, patrão! - ele sorriu de canto. - Pensei que tava na hora, eu sei que puxar o cão não é fácil mas se precisar...

- Falou, irmão... Eu entendi! - agradeci com a cabeça e imediatamente guardei na cintura.

Foi quando pude ver LC entrar correndo na antiga sala do Patrick, tropeçando em suas próprias pernas e quase sem ar.
Segurei em seu ombro e o ajudei a respirar enquanto Rato e CG verificavam a movimentação daquela noite.

- Que porra é essa, LC? Calma!

- Tão subindo, mano! A BOPE tá subindo as vielas, tão de silenciador, mataram os fogueteiros, tão atirando em qualquer merda que tão vendo pela frente, Playboy. - meu coração apertou e lembrei daquele dia.

- Esconde tudo, some com o que der... Droga, arma e some você também, se esconde, moleque.

E em questão de segundos LC saiu igual um doido viela acima, contornando o morro pela mata.
Rato confirmou a história quando deu alguns alertas no radinho e ninguém respondeu.

EU VIM DA RUA - MC Kevin (Kevin Bueno)Onde histórias criam vida. Descubra agora