7 - Sentir

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          O painel já avisava há algum tempo que o voo vindo de Boston aterrissou. Carol, a amiga de Duda, esperava pelos três em frente ao portão de desembarque do Aeroporto Internacional de Guarulhos. Ajeitou os óculos e semicerrou os olhos para confirmar se a moça de óculos escuros ao lado do alto rapaz que seguia com uma criança dormindo em seu colo era de fato sua amiga.

          "Por Deus, eu não aguentava mais esse avião!", Duda abraçou Carol e abriu um largo sorriso. A moça até chegou a sorrir, mas logo se lembrou o motivo pelo qual ela estava ali: a mãe de sua amiga havia morrido. Jonathan até comentou que sua irmã não estava aceitando muito bem o fato, mas ela não esperava que ela estaria assim, como se nada tivesse acontecido. Steve abriu um sorriso triste e desviou o olhar, já estava há muitas horas lidando com ela e tinha certeza que aquela bomba estava prestes a explodir.


– Como foi o voo? – Carol perguntou na tentativa de encontrar um assunto que não fosse Laura.

– Exaustivo e estressante demais. O Arthur chorou o tempo todo, eu e o Steve não dormimos nada, só um cochilo ou outro quando ele finalmente dormia, mas bastava um barulho de nada que ele já acordava aos berros. Foi dormir na hora de aterrissar. As pessoas me olhavam de cara feia, mas eu fiz o que eu pude. Ele é um bebê, bebês choram. As pessoas não têm empatia nenhuma com mães.


          Sua amiga assentiu e continuaram conversando assuntos aleatórios. Steve caminhava ao lado das duas sem entender mais da metade da conversa. Ele até falava um pouco – bem pouco mesmo – de português, e se arrependeu de prestar atenção apenas nos palavrões que Duda ensinou. Ela percebeu e passou a incluí-lo nos assuntos, misturando os idiomas. Quando a esteira finalmente trouxe as malas, Carol os levou até o carro para mais vinte e quatro quilômetros até o cemitério.

***

          O carro de Carol estacionou em frente ao velório do Cemitério Quarta Parada e antes mesmo de abrir a porta, Duda avistou seu irmão abatido ao lado de sua cunhada, sentado no banco de concreto com as pernas encolhidas e abraçadas junto ao corpo e se perguntou o porquê dele estar assim. Ao descer, o mesmo frio na espinha que sentira no adeus de seu pai se repetiu.

          Ao ouvir o bater da porta do carro, Jonathan ergueu a cabeça e viu sua irmã caminhando em sua direção. Se levantou num pulo e acelerou o passo até ela. Saudade, tristeza, felicidade, medo – tudo isso estava guardado naquele abraço apertado que tomou os dois.

          Até então ele estava correndo com todos os processos burocráticos e com o plano funerário, ainda não havia tido o tempo necessário para sentir a dor da perda, mas ao ver sua irmã as lágrimas tomaram conta do rosto do rapaz, e os soluços que até então estavam contidos, agora eram livres. Ele sabia que de todos ali, a única pessoa que entendia o tamanho de sua dor era Duda.


– Ei, calma, respira, eu tô aqui – Duda disse ao segurar o rosto vermelho do irmão entre as mãos.

– A mãe, Du! A mãe! – ele respondeu entre soluços, tentando em vão secar as lágrimas.

– Eu já disse que ela tá bem, inventou isso pra ver a gente reunido. Aposto que daqui a pouco ela aparece aqui – o ajuda a secar as lágrimas com a ponta dos dedos.

– Não – suspirou – Ela não vai aparecer.

– Johnny, você sabe que a mãe adora um drama, ela vai...

– Não vai! Ela não vai voltar, Du, a mãe morreu! O corpo dela tá ali dentro, sem vida! A dona Laura não tá mais aqui.

– Por que você tá insistindo nisso...

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