Reiniciando 13/10/2022

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Sem revisão.

Giovana

__ Iagooo! __ berrei pela milésima vez __ desce dai, pelo amor de Deus!

Meu filho sorriu um sorriso banguela e desceu do sofá correndo pela sala. Tinha nem uma semana que o garoto caiu da escada a ponto de perder um dente e já tava aprontando de novo.

Terminei de lavar a louça e fui pro quarto arrastando o Iago que não queria vim de jeito nenhum.

__ Caraca menino, tá teimoso demais. Vou perder a paciência contigo já já.

Na verdade eu já tinha perdido a paciência desde a hora que ele abriu o olho ao acordar, garoto tem 3 anos de idade mas só sossega quando tá dormindo.

__ Desculpa mamãe. __ falou todo bonitinho e eu beijei seu cabelo loirinho que tinha puxado pro meu.

__ Vamo tomar banho que teu pai ta vindo pra te levar pra creche. Tenho aula até mais tarde hoje. Papai vai te deixar lá na vovó depois, tá bom? __ Ele balançou a cabeça com um "tá bom, mamãe" e fomos pro chuveiro.

Nosso banho só não foi mais demorado porque cortei a bagunça do Iago com um beliscão na orelha dele. Menino não sossegava nem pra tomar banho. Sai enrolada na toalha, Iago estava enrolado na toalhinha dele no meu colo, estava pesado que só, mas se não tivesse o segurando no colo sairia correndo do banheiro e com certeza levaria uma queda no chão escorregadio, como já tinha acontecido outras vezes.

__ Giovana __ Iury,  meu marido e pai do Iago, apareceu quando eu terminava de vesti a roupa do nosso filho.

__ Tô terminando com ele aqui já. __ falei, Iury beijou a cabeça do pequeno sentando na cama. E nem chegou perto de mim. Estranho que só.

__ Calça o tênis dele. Vou vesti minha roupa. __  Iury calado e estranho estava, calado e estranho continuou.

Vesti uma calça jeans preta, a blusa azul marinho com o nome do curso e calcei o tênis branco.

__ Nem te vi chegando ou saindo hoje de casa. __ puxei o assunto com Iury que conversava com Iago. Dormi cedo na noite anterior e nem vi a hora que meu marido chegou, muito menos a hora que saiu hoje de manhã.

__ É, não dormi em casa. __ Falou tirando o chapéu, coçou a cabeça e colocou o chapéu de volta.

__ Não dormiu em casa?! __ estranhei a novidade. Ele nunca precisou dormir fora. Seus plantões eram sempre de dia. Era um combinado que ele tinha com Dentinho, amigo dele de infância que é o de líder/ dono do morro. __ Aconteceu alguma coisa? __ Não queria criar paranóias na minha cabeça mas era impossível.

Geral sabe como é a vida de muitos traficantes por aqui, mesmo estando  sempre rodeados de perigos, vivem rodeados de mulher na cola deles, tudo doida para dar e ganhar status.

__ Aconteceu. Vou mentir não. A gente precisa trocar uma idéia longe do menor. __ gelei.

Nossa relação sempre foi tranquila, se conhecemos na escola, ele ainda não era traficante, estudava e tinha planos como qualquer outro na idade. Mas tudo mudou quando os pais sumiram deixando ele pra trás. Quem assumiu ele foi o tio do Dentinho que era o dono daqui antes de falecer.

Engravidei do Iury com 17 anos e automaticamente fui morar com ele em um barraco, a treta com meus pais na época foi grande. Mesmo sem rumo, Iury e eu criamos vários planos de futuro, as coisas não saíram como planejamos e ele acabou sendo convencido a entrar no tráfico pelo Dentinho. Achei ruim? achei. Mas tínhamos um bebê pra criar e sem grana seríamos três a passar fome.

__ É sério? __ perguntei juntando meus livros pra colocar na mochila.

__ É sobre nós, Giovana. __ Foi o que ele disse antes de sair do quarto com nosso filho.

Respirei fundo e sai em seguida.

Iury era um paizão e um bom marido, me tratava sempre bem, e mesmo quando estava puto tinha postura comigo. Eu era apaixonada pelo meu neguinho, não vou negar. Imaginava minha vida toda ao lado dele.

Mesmo com todas as dificuldades que enfrentamos no início ele sempre fez questão de me apoiar e incentivar pra que eu seguisse meus sonhos. Se não fosse ele, talvez nem teria me matriculado na faculdade, ou nem teria estudado tanto pro Enem. Iury bancava tudo pra mim e nosso filho, enquanto eu focava nos meus estudos e cuidava do nosso bebê.

Eu estava no quarto período de admnistração. Ganhei bolsa integral, mas Iury pagava meu material e uber pra eu ir pra faculdade e voltar pra casa. A faculdade era longe do morro, faculdade de rico pra falar a real. Nos primeiros dias de aula me sentia deslocada lá, mas depois de um tempo acostumei, nenhum dos meus colegas sabe onde eu moro, alguns acham que eu sou rica, patricinha. Mal sabem que venho da favela.

Cheguei em casa quase 10 horas da noite. Falei com Iago por telefone, ele estava na casa da minha mãe e dormiria lá. Iria buscar ele de manhã, já que era sábado no dia seguinte.

Tomei banho e fui procurar uma roupa confortável pra dormir. Ao mesmo tempo que abri o guarda roupa, Iury entrou no quarto. Olhei pra ele e pro guarda roupa vazio, sem reação alguma.

__ Senta aí que a gente precisa conversar, Gio. __ eu já estava tremendo.

__ o que ta acontecendo, Iury? __  minhas pernas estavam moles, sentei na cama de toalha mesmo.

__ Então loirinha, eu tô indo embora..__ falou sem rodeios e eu senti meu fôlego sumir na hora.

[...]

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