Arabesque

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Atravessamos a porta depois de trinta minutos, apesar dos faróis vermelhos por todo o percurso após ter saído de casa, o que significava que não seriamos as primeiras a chegarem, um motivo mais que justificável para o mal humor da loira que entrou feito um projetil. Quanto a mim, cada minuto longe da sala dos primeiranistas era uma dádiva dada por Deus e tomei o cuidado de apreciar cada segundo e passos até a recepção.

-Bom dia senhoritas Haruno. – Cumprimentou a mulher de coque ajustado.

-Bom dia, Stella...Shizune já chegou?

-Sim, está esperando em sua sala. – Respondeu contente.

Tsunade pareceu satisfeita com a resposta e sem dar mais uma palavra seguiu em direção à escadaria e fiz o mesmo, lançando um breve cumprimento para as recepcionistas antes de apressar os passos escadaria acima. Ainda eram sete horas, o que me dava vinte minutos para me preparar antes dos alunos chegarem. Qualquer um sabe que isso não é de longe tempo o suficiente para se preparar para uma aula, mas serviria para não passar vergonha errando o repertório que estavam acostumados há um mês e meio.

Avistei a enorme janela da sala de minha tia antes de perceber a franzina ajudante que se levantava animada com um copo do Starbucks, provavelmente contendo café preto com amêndoas, a única coisa que minha tia bebia de manhã e o único motivo de eu não desistir da minha mistura considerada abominável de café com maracujá. Respondi seu aceno sem saber ao certo o que eu deveria fazer.

-Bom dia, Senhora Tsunade...Sakura – Cumprimentou entregando a mistura.

-Bom dia, Shizune.

Minha tia não cessou a marcha nem mesmo para pegar o café ou cumprimentá-la direito, seguindo porta adentro. Shizune sorriu amarelo para mim, ajeitando os fios pretos que escapavam da orelha, me lembrando que nunca a tinha visto com outro corte de cabelo. Deixei isso de lado e retribui o sorriso, perseguindo o furacão para dentro de sua sala bem decorada, apoiando-me no batente da porta por alguns segundos. Busquei pelo pequeno sofá azul que jurava existir logo abaixo da enorme janela, mas as únicas coisas sentáveis eram as poltronas em frente à sua mesa. Embora fosse sobrinha da diretora, evitava vir aqui com frequência, afinal o título de sobrinha já me tornava odiado o suficiente. Atualmente seguia com o marco de três vezes por mês, ainda assim estranhei a falta do sofá.

A sala se mantinha com sutis mudanças desde que me lembrava, sempre mantendo as cores pastéis, troféus e quadros dos bailarinos da Companhia ao lado de sua inestimável coleção de fotografias assinadas por musicistas, dentre eles o próprio Krzysztof Penderecki e a bailarina Natalia Osipova. Além disso, as únicas coisas que chamavam atenção era um gaveteiro amarelado com documentos e a enorme mesa de madeira rústica no meio da sala, com uma plaquinha com o nome de minha tia entalhado, o computador e uma pequena planta artificial de cor quase que fosforescente que fiz para ela aos seis anos, quando ainda ia até a escola.

Sem saber ao certo o que fazer, encostei-me contra o parapeito da enorme janela que tomava a maior parte da parede, dando visão as salas e o pequeno espaço da Shizune. Comecei a caçar o celular que tinha jogado dentro da bolsa durante a viagem, junto aos fones de ouvido, sendo minha única opção para matar o tempo levando em conta de que, primeiro eu estava de castigo e , segundo, minha tia tinha embarcado em uma conversa aparentemente séria com a ajudante sobre documentos referentes ao espetáculo de Junho, o que me fazia lembrar que devia ensaiar mais os saltos da minha variação e essa era a última coisa em que eu queria pensar agora. Se não fosse minha queda durante o ensaio, não teria torcido o tornozelo e provavelmente não estaria no meio dessa situação.

Assim que pluguei os fones vi a tela se acender em duas notificações, incluindo uma de chamada perdida, mas não reconheci o número. Passei o polegar pela tela, me despedindo da fotografia da alvorada que tinha tirado em cima do meu telhado e usava wallpaper desde então, ao mesmo tempo em que varria minha mente a procura do número desconhecido. Por falta de crédito esse número relativamente novo, levando-se em conta de que eu nunca mudava, então eram poucas pessoas que o tinham - Não que muitos tivessem o outro número – tornando a ligação ainda mais estranha. Estava começando a cogitar ligar de volta quando a voz da Tsunade me chamou atenção.

A boneca e o bailarinoOnde histórias criam vida. Descubra agora